Edição 343 | 13 Setembro 2010

A crise civilizacional e os desafios das alternativas energéticas

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Patrícia Fachin

 

IHU On-Line - Qual é o potencial energético dos mares? O país tem capacidade para ter tecnologia própria nesta área?

Heitor Scalambrini Costa - A energia das ondas tem sido considerada uma das mais promissoras fontes de energia renovável. As fontes de energia provenientes dos oceanos e dos mares possuem um enorme potencial energético disponível em uma área de 360,6 milhões de km2 (70,7% da superfície do planeta Terra), coberta por massas de água. Essas gigantescas massas de água que cobrem dois terços do planeta constituem o maior coletor de energia solar imaginável. Sabemos que a energia de origem solar não incide de igual modo sobre a Terra, sendo que a maior parte desta radiação atinge uma faixa, a volta do Equador terrestre, entre 34º N e 34º S. Nesta região, se concentra grande potencial energético que pode ser extraído dos oceanos.
As ondas se formam pela ação do vento sobre a superfície da água, que cria forças de pressão e fricção que perturbam o equilíbrio da superfície dos oceanos. O vento transfere parte da sua energia para a água através da fricção entre o vento e a água. Quanto maior a força do vento, duração e comprimento sobre o qual ele atua na superfície, maior será a altura das ondas. Essas ondas formadas viajam grandes distâncias até atingir a costa. Podemos ter vento forte no meio do oceano, a cerca de 2 mil quilômetros do litoral, que as ondas geradas naquele local pelos ventos fortes vão até a costa. Existe uma grande variedade de tecnologias para o aproveitamento da energia das ondas. A potência extraível das ondas é proporcional ao quadrado da amplitude, podendo variar entre 20 a 70 km/m.
A maioria dos projetos de utilização desta forma de energia usa o mesmo princípio, onde a onda pressiona um corpo oco, comprimindo o ar ou um líquido, ou seja, a energia cinética do movimento ondular move uma turbina ligada a um gerador. A energia mecânica da turbina é transformada em energia elétrica através do gerador. Quando a onda se desfaz e a água recua, o ar desloca-se em sentido contrário passando novamente pela turbina, entrando na câmara por comportas especiais normalmente fechadas.

De acordo com estudos já realizados, a exemplo de alguns disponibilizados pela Agência Internacional de Energia, uma onda de três metros de altura pode conter pelo menos 25 kW de energia por metro de frente. O problema ainda não resolvido tecnologicamente é como transformar toda essa energia em eletricidade de maneira eficiente, sem perdas e garantindo alto rendimento.
Em conjunto, o gradiente térmico, as ondas, as correntes marítimas, o gradiente salino e as marés, poderiam proporcionar muito mais energia do que a humanidade seria capaz de consumir, hoje ou no futuro, mesmo considerando que o consumo global tem dobrado de dez em dez anos.

Os mares e oceanos representam quase 98% da água encontrada na Terra. As grandes energias utilizáveis do oceano podem ser classificadas, pelo seu potencial, do seguinte modo:
a) a exploração do gradiente térmico entre a superfície e o fundo: 40 bilhões de MW;
b) a exploração dos gradientes de salinidade, por exemplo, na foz dos rios: 1,4  bilhões de MW;
c) a exploração das correntes marinhas: 5 milhões de MW;
d) a exploração das marés: 2,7 milhões de MW;
e) a exploração das ondas: 2,5 milhões de MW.

Especificamente, as marés são as alterações do nível das águas do mar causadas pela interferência gravitacional da Lua e do Sol (com menor intensidade, devido à distância) sobre o campo gravitacional da Terra.
A ideia de extrair energia acumulada nos oceanos, utilizando a diferença da maré baixa e da maré alta, não é nova. Já no século XII havia na Europa moinhos submarinos que eram instalados na entrada e saída de baías. O fluxo e o refluxo das águas moviam as pedras de moer. A energia que pode ser captada a partir das marés se faz de modo semelhante ao aproveitamento hidroelétrico, que consiste de: um reservatório junto ao mar, através da construção de uma barragem, e uma casa de força (turbina + gerador). O aproveitamento é feito nos dois sentidos: na maré alta a água enche o reservatório, passando através da turbina, e produzindo energia elétrica, na maré baixa a água esvazia o reservatório, passando novamente através da turbina, agora em sentido contrário ao do enchimento, e produzindo energia elétrica.
Em 1967, os franceses construíram a primeira central maremotriz, ligada à rede nacional de transmissão. Uma barragem de 710 m de comprimento, equipada com 24 turbinas, fechando a foz do rio Rance, na Bretanha, aproveitando uma diferença de marés de 13,5 m, produzindo assim uma potência de 240 MW.

No entanto, a captação desse tipo de energia é restrita a poucas localidades no mundo, pois o desnível das marés deve ser superior a sete metros. No Brasil, os locais favoráveis à construção de estações para o aproveitamento dessa forma de energia são o estuário do rio Bacanga, em São Luís-MA, com marés de até sete metros, e, principalmente, a ilha de Macapá-AP, com marés de 11 metros.
Com 8,5 mil quilômetros de costa e cerca de 70% da população ocupando regiões litorâneas, o Brasil apresenta condições mais do que propícias para obter vantagens com esta fonte de energia abundante, renovável e não poluente.

Nos últimos anos da década de 1990, ficou claro que a conversão da energia das ondas em eletricidade é uma possibilidade real. O Reino Unido instalou seu primeiro dispositivo interligado ao sistema elétrico no ano 2000. Atualmente só no Reino Unido existem sete projetos, dois em operação e cinco em estágio avançado de desenvolvimento.
Atualmente, tem ocorrido um grande avanço na implantação de usinas de energia das ondas em vários países da Europa, principalmente no Reino Unido, Espanha, Austrália e Japão.
Logo, nosso país apresenta um potencial significativo que não está sendo aproveitado, estimado em vários estudos em:
a) 143.000 MW para a energia eólica;
b) 10.000 MW para PCHs;
c) 4.000 MW para o bagaço da cana-de-açúcar;
d) 1.300 MW com ouso da casca de arroz e papel/celulose em termoelétricas;
e) além do aquecimento solar de água que poderia substituir o chuveiro elétrico, e assim economizar em torno de 10% da energia elétrica consumida no país.
Para a instalação de usinas maremotrizes são necessários altos investimentos, sendo sua eficiência baixa (aproximadamente 20%). Com relação aos impactos ambientais, os mais comuns estão relacionados à flora e fauna. Porém, esses impactos são bem inferiores se comparados aos causados por hidroelétricas instaladas em rios. Outro agravante é a possibilidade do rompimento das estruturas por furacões, terremotos ou qualquer razão que leva a uma inundação da região costeira. Os riscos ocupacionais também são elevados durante a construção da estrutura da usina, que requer operações abaixo do nível d’água.

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