Edição 343 | 13 Setembro 2010

A crise civilizacional e os desafios das alternativas energéticas

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Patrícia Fachin

 

IHU On-Line – Discute-se no país a questão da energia nuclear. Qual sua opinião sobre esse modelo energético?

Heitor Scalambrini Costa - Que no caso específico da energia nuclear para geração de eletricidade, nosso país, e em particular a região Nordeste, não precisa desta fonte energética. Foi um grande equivoco a tomada de decisão em reativar o programa nuclear brasileiro com a instalação de novas usinas nucleares no país, além de Angra 3, a construção de mais quatro usinas, sendo 2 na região Nordeste.
As energias renováveis abundantes em nosso país são suficientes para atender a oferta de energia de que ele necessita em uma perspectiva de desenvolvimento sustentável. Gostaria de tornar público e denunciar que o governo estuda abrir à iniciativa privada a construção e operação de usinas nucleares, o que é constitucionalmente monopólio do Estado. O governo não possui fôlego para construir sozinho as quatro plantas nucleares previstas no Plano Decenal de Energia, estimada em R$ 50 bilhões, e assim espera obter estes recursos quebrando o monopólio.

IHU On-Line - Em que medida repensar a questão energética no mundo contemporâneo requer pensar um novo paradigma civilizacional?

Heitor Scalambrini Costa - Decorrente das políticas econômicas contemporâneas o mundo só conseguiu produzir menores taxas de crescimento, maior desigualdade social e crises recorrentes, que culminaram com os graves problemas enfrentados na atualidade: a recessão-depressão econômica, a insegurança energética e alimentar e o aquecimento global. E, agora, uma conjuntura de desemprego e ampliação da miséria. A crise atual, portanto, não é apenas financeira; trata-se de uma crise profunda que põe em cheque a forma de produzir, comercializar e consumir. O modo de ser humano. Uma crise de valores.
Se o atual modelo de produção e consumo, que tem sua base nos combustíveis fósseis, não for profundamente alterado, todos serão atingidos, ricos e pobres. Essa transformação passa pela completa revisão do conceito de crescimento econômico adotado pela humanidade como verdade divina. Está provado que a ideia segundo a qual a humanidade pode crescer indefinidamente a partir da “transformação da natureza” vai nos levar ao suicídio global. É preciso interromper o quanto antes essa corrida ao abismo.

Os bens da natureza são para sustentar a vida humana e não para satisfazer os cofres das companhias multinacionais ou nacionais que, aliás, nem sempre lembram que o fim último das atividades é manter a vida sobre a Terra e não destruí-la para o benefício limitado de umas poucas pessoas ou entidades.

Portanto, o desafio que se coloca neste início do século XXI é nada menos do que mudar o curso da civilização. É preciso construir uma nova ordem internacional, que respeite a soberania dos povos e das nações. Deslocar, num curto espaço de tempo, o eixo da lógica “viver é produzir sem fim e consumir o mais que pode” que leva a acumulação, para uma lógica em função do bem estar social, do exercício da liberdade e da cooperação entre os povos.

Para ser alcançado, o desenvolvimento sustentável depende de planejamento e do reconhecimento de que os recursos naturais são finitos. Esse conceito representa uma nova forma de desenvolvimento econômico, que leva em conta o meio ambiente.

Leia mais...

>> Heitor Costa já concedeu outras entrevistas à IHU On-Line. O material está disponível no sítio do IHU (www.ihu.unisinos.br).

• Uma matriz energética sustentável só será possível a partir da mudança dos modos de produção e de consumo da sociedade. Entrevista especial com Heitor Scalambrini Costa, publicada nas Notícias do Dia 17-09-2007;
• Plantar para quê e para quem? Entrevista publicada na revista IHU On-Line 258, de 19-05-2008;
• Mudança na matriz energética requer transformações nos padrões atuais de produção e consumo. Entrevista publicada na revista IHU On-Line 236, de 17-09-2007.

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