Edição 337 | 09 Agosto 2010

Diálogo cultural e inter-religioso, fundamentos para construir a justiça e a paz

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Graziela Wolfart

Mauricio García Durán lembra que preocupação dos centros sociais jesuítas, pelo menos na América Latina, sempre esteve orientada para as situações de injustiça e pobreza que as populações de nossos países viviam

Para Mauricio García Durán, o trabalho social desenvolvido pelos jesuítas na América Latina tem importância no sentido de que “caminhamos com nossos povos, particularmente com aqueles excluídos e que sofrem diversas formas de injustiça, para que nesse caminhar conjunto possamos colaborar na construção de alternativas que permitam que a justiça, a democracia e a paz sejam realidade para todos nossos povos”. Na entrevista que concedeu por e-mail à IHU On-Line, Maurício García fala sobre o trabalho desenvolvido no Cinep, na Colômbia: “somos conscientes de que nosso apostolado deve ter uma dimensão social que manifeste o compromisso pela justiça que é fruto de nossa fé, que torne real a opção pelos pobres de Jesus e da Igreja, que potencie o diálogo intercultural e inter-religioso, e que promova tudo isso em uma perspectiva de reconciliação”. E destaca que “não é possível construir justiça e paz em nossa sociedade sem passar por processos profundos de diálogo intercultural e inter-religioso”.


Mauricio García Durán, é diretor geral do CINEP (Centro de Investigación e Educación Popular) - Programa pela Paz, com sede em Bogotá, Colômbia. É sacerdote jesuíta, com formação em Ciência Política, Filosofia, Teologia e doutorado em Estudos de Paz.

Confira a entrevista.

IHU On-Line - Qual a importância do trabalho social desenvolvido pelos jesuítas para a realidade latino-americana?

Mauricio García Durán - É um trabalho que pode ter alguma importância no sentido de que caminhamos com nossos povos, particularmente com aqueles excluídos e que sofrem diversas formas de injustiça, para que nesse caminhar conjunto possamos colaborar na construção de alternativas que permitam que a justiça, a democracia e a paz sejam realidade para todos nossos povos. O esforço realizado por jesuítas e companheiros/as leigos nesta direção, enquanto faz sinergia e consolida dinâmicas de coordenação e articulação, contribui para tornar real uma América Latina distinta, manifestação da realização do Reinado de Deus em nosso meio.

IHU On-Line - Que transformações a proposta inicial dos CIAS jesuítas têm sofrido ao longo dos anos em sua trajetória histórica? Qual a atualidade dos CIAS hoje?

Mauricio García Durán - Não é fácil responder a esta pergunta, considerando que desconheço qual foi o conteúdo concreto da proposta que impulsionou os CIAS na Companhia Universal. Sei que respondeu a uma iniciativa do Pe. Janssens, que reconheceu a necessidade de promover o apostolado social em toda a Companhia e, para isso, promoveu a criação dos CIAS. Na América Latina o Pe. Foyaca  foi encarregado de fundar tais centros ao longo de todas as províncias. Até onde tenho conhecimento, o eixo de orientação de tais centros era a Doutrina Social da Igreja. Pelo que conheço de nosso próprio centro (CINEP), as mudanças que se dão na forma de estudar e analisar a realidade social e de intervir nela se dão promovidas pelo Concilio Vaticano II, pela II Conferência do Episcopado em Medellín e pela Congregação Geral número 32. A preocupação dos centros sociais, pelo menos na América Latina, esteve orientada para as situações de injustiça e pobreza que as populações de nossos países viviam. Emerge uma clara opção pelos pobres e um compromisso com a promoção da justiça. Portanto, se geram múltiplas experiências de pesquisa, mas também de educação popular e organização social orientadas para promover alternativas sociais que foram respostas às injustiças e exclusões que nossos povos viviam. Esta busca de alternativas não será jamais alheia à dinâmica de mudanças políticas e revoluções que se viverão nesses anos no continente; em primeiro lugar a Revolução Cubana  e, anos depois, a Revolução Nicaraguense . Daí o diálogo que o trabalho de pesquisa e educação popular teve com as tendências de esquerda existentes no país nesses anos. No caso colombiano, o longo conflito armado que o país viveu levou nosso centro a pôr dentro de suas prioridades o trabalho pela paz e a busca de uma solução negociada do conflito armado. Esta situação manteve em primeiro plano o trabalho de defesa dos direitos humanos. Mas também o trabalho pela busca de uma sociedade mais justa e democrática. A crise do socialismo apresenta uma crise de paradigmas que nos leva a repensar estratégias e buscar alternativas a partir do trabalho realizado com grupos sociais concretos.

IHU On-Line - Como o senhor define o trabalho do Cinep hoje e como ele se enquadra na proposta dos CIAS?

Mauricio García Durán - Em primeiro lugar, hoje definimos nossa missão assim: “Apostamos pela vida. Trabalhamos por uma sociedade justa, sustentável e em paz”. Para isso desenvolvemos três estratégias: (1) pesquisa e produção de informação da realidade colombiana; (2) educação e acompanhamento de organizações sociais; (3) comunicação e incidência no âmbito público. E para isso intervimos em três grandes eixos temáticos:
* Movimentos sociais, grupos étnicos e vigência dos direitos humanos.
* Estado, território e desenvolvimento.
* Construção da paz.

Em segundo lugar, para ser honesto, não nos apresentamos no sentido de que o que fazemos tem relação com a “proposta dos CIAS”. Isso para nós foi um momento do passado. Preocupa-nos como nosso trabalho sintoniza ou não com o que foi projetado nas últimas Congregações Gerais, em particular a 32, 33, 34 e 35. Somos conscientes de que nosso apostolado deve ter uma dimensão social que manifeste o compromisso pela justiça que é fruto de nossa fé (CG32), que torne real a opção pelos pobres de Jesus e da Igreja (CG33), que potencie o diálogo intercultural e inter-religioso (CG34), e que promova tudo isso em uma perspectiva de reconciliação (CG35).

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