Edição 374 | 26 Setembro 2011

Será a humanidade absorvida pelo mundo dos objetos, hoje virtuais? Uma pergunta que não cala

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Márcia Junges



IHU On-Line - Em que medida Lima Vaz procura responder ao avanço prodigioso da razão técnica e sua indigência ética, bem como ao niilismo na cultura que vem se firmando na modernidade pós-cristã? A partir dessa percepção, em que aspectos sua filosofia promove uma reflexão e uma crítica ao paradoxo da racionalidade ao qual estamos submetidos?

Marcelo Fernandes de Aquino - Segundo Vaz, os herdeiros de Duns Scotus aprofundaram o abandono da concepção da metafísica como ciência estruturalmente aberta no seu procedimento mais elevado como ciência do ser absoluto ou theologia pela concepção da metafísica como sistema fechado, de natureza axiomático-dedutiva regido pelos princípios de causalidade e razão suficiente e pela noção unívoca de ser. O conceito unívoco de ser da metafísica escotista recupera a primazia da essência inerente à metafísica grega.
Transformará profundamente a configuração do campo noético-especulativo sobre o qual se edificou a metafísica greco-cristã. Traçará o horizonte último da epistéme moderna. A idéia de Deus e sua nomeação filosófica, nesta primeira figura da modernidade pós-metafísica, migram da noção de ser do paradigma ideonômico clássico para o da onto-antropologia moderna. Inaugura-se o primeiro ciclo moderno do “fim da metafísica”, ao cabo do qual a antropologia passa a ocupar o lugar antes reservado à metafísica. Seu desdobramento resultará no advento da metafísica da subjetividade e, finalmente, na modernidade pós-metafísica. O niilismo contemporâneo será o ponto de chegada desta pretendida desconstrução da metafísica.

A teoria da representação desenhada pelo nominalismo tardo medieval suprimiu, pelo menos virtualmente, a distinção aristotélica entre as três grandes formas de conhecimento, o teórico, o prático e o poiético. Um campo ilimitado de possibilidades de referir-se ao objeto – na sua verdade, bondade ou utilidade – como sendo um ergon, isto é, um produto da atividade poiética do próprio sujeito abre-se para o sujeito nesta concepção que privilegia a representação como sendo o objeto imediato da intenção cognoscitiva. O espaço da representação submete o objeto aos procedimentos operacionais definidos e estabelecidos pelo sujeito, inaugurando novo estilo de trabalho teórico. Este novo estilo de trabalho teórico dá origem à forma de razão estruturalmente operacional, isto é calculadora, e à ciência físico-matemática. Razão calculadora e ciência físico-matemática são raízes da revolução científica, que transformou profundamente as referências do universo mental do ocidente, tornando possível a revolução tecnológica que criou para os humanos um novo mundo de objetos. Seremos absorvidos em nossa humanidade por este prodigioso mundo de objetos, hoje virtuais? Esta era a pergunta que não se calava a Lima Vaz em seus últimos anos de vida.

IHU On-Line - Qual é a importância do legado filosófico e teológico de Lima Vaz para a filosofia brasileira?

Marcelo Fernandes de Aquino - Antes de tudo, como ser humano, Lima Vaz nunca negociou suas convicções mais profundas no altar da fama. Nunca traiu os jovens que nele confiaram por medo da violência física, ou por conveniência aos vários oportunismos que rondam a vida intelectual brasileira. Cometeu acertos e erros sem escamotear sua fé cristã e sem esconder que era um sacerdote jesuíta.

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