Edição 213 | 26 Março 2007

Eliete Mari Doncato Brasil

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Uma mulher independente. Assim é Eliete Brasil. Natural de Vacaria, Rio Grande do Sul, Eliete lutou desde cedo pelo que queria. Com carinho relembra a infância, e valoriza as amizades que conquistou pelo Brasil. Eliete é formada em Biblioteconomia, tem no seu currículo o tempo que trabalhou como professora de educação infantil. Aos 45 anos, passou por diversas universidades até chegar a Unisinos. Conheça um pouco mais desta funcionária da Universidade na entrevista a seguir.

Origens
Nasci em Vacaria, há 45 anos.

Família
Tenho dois irmãos mais novos, sendo que meu irmão mora comigo. Meus pais, minha irmã e afilhada, meus avós,enfim, toda a minha família mora em Vacaria.

Infância
Minhas lembranças mais vivas são das férias. Brincávamos muito em árvores, tomávamos banho de cachoeira, comíamos fruta no pé. Sempre quando entrava em férias, minha mãe me encaminhava para a casa dos meus avós no interior de São Marcos, na beira do Rio Redondo. Hoje, as crianças não têm mais isso: as brincadeiras foram substituídas pelos games e pela internet. Em casa convivia mais com a minha mãe, pois meu pai era motorista de caminhão e passava vários meses viajando. Dele, ouvíamos muitas histórias de suas viagens. Também passava muito tempo com o resto da minha família, com tios e primos, pois todos moram na mesma cidade. Todos os domingos reuníamos a família para o almoço na casa dos meus avós.

Estudos
Fiz o Ensino Fundamental e Médio em Vacaria. O Ensino Fundamental cursei em um colégio de freiras. Isso foi um problema pra mim na época. Eu era muito questionadora, principalmente nas aulas de religião e não ficava satisfeita com o que me respondiam e acabava sempre de castigo na capela da escola, fazendo muitas orações. No Ensino Médio, mudei-me para uma escola pública e fiz o curso de análises químicas, pois no meu colégio anterior se cursava o Magistério e eu na época não queria ser professora. Nesta escola,fiz muitos amigos, que conservo até hoje. São 30 anos de amizade; sempre que visito a cidade procuro encontrar pelo menos alguém daquela época.

Coincidência
Casei-me com 18 anos. Saí de Vacaria e me mudei para Porto Alegre. Conheci meu marido quando fazia um curso de férias em Porto Alegre. Nessa época, morava em um pensionato, e, como não conhecia a cidade, ia para o curso de táxi. Com o tempo, essa maneira se tornou muito cara. Uma senhora que morava no pensionato me falou sobre um sobrinho que também estudava no mesmo local, e sugeriu que nos encontrássemos e viéssemos juntos. Um dia, cansada de pegar táxi, resolvi voltar de ônibus. No momento em que deveria descer do ônibus, o motorista me disse que estava na rua errada. Entrei em pânico porque era noite, e um rapaz se aproximou e disse que eu estava na rua certa. Chegando à frente do pensionato, ele me disse que tinha uma tia que morava ali. Por coincidência, era a senhora com quem eu tinha conversado. Começamos a ir de ônibus juntos dali em diante.

Casamento
Nesse tempo que passamos juntos, surgiu nosso romance. Eu continuei morando em Vacaria e ele em Porto Alegre. Em oito meses de namoro, engravidei, e casamos. Na verdade, já tínhamos planejado nos casar. Em razão de um conselho da minha sogra, estávamos fazendo uma poupança para o casamento, que deveria acontecer em janeiro. A gravidez somente acelerou o processo e nos casamos em de setembro de 1980. Quando casamos, mudei-me para Porto Alegre e meu filho, Vinícius, nasceu.

Mudanças
Nesses três anos de casamento, morei em muitos lugares. A primeira mudança foi para Blumenau, em razão da empresa que meu marido trabalhava. A segunda foi para o Mato Grosso do Sul, pois meu sogro tem uma fazenda e fomos trabalhar lá. Eu não tinha vontade de ir. Achei que não íamos nos adaptar morando num lugar tão distante e longe da família. Morando lá, não convivia muito com o meu marido, pois a fazenda ficava a 80 km do local onde morávamos. Decidi ir embora depois de um ano e oito meses. Achava que ali não teríamos futuro.

Trabalho
Meu primeiro emprego foi em um banco, em Vacaria, durante cinco meses. Lá, trabalhava como caixa. Como eu era muito atrapalhada com dinheiro, tinha um pouco de medo. Lembro que foi uma época muito legal da minha vida. Trabalhava com amigos da adolescência. Em Porto Alegre, também trabalhei no escritório de advocacia da minha sogra.

Magistério
Após a separação voltei para Porto Alegre, fiz o magistério e me especializei com educação infantil. Trabalhei por quatro anos como professora de Jardim de Infância.

Faculdade
Depois do Magistério, resolvi cursar o Ensino Superior. Queria estudar em uma área ligada à educação, mas Letras e Pedagogia não me agradavam. Olhando o catálogo de cursos da UFRGS, interessei-me pelo curso de Biblioteconomia. Prestei o vestibular por insistência da minha mãe e sogra. Acreditava que esse curso poderia me ajudar a ser mais organizada. Para minha surpresa, no primeiro dia de aula, encontrei uma professora toda atrapalhada, que derrubou os seus materiais no chão da sala. A aula era meio atrapalhada, entretanto ela foi uma das melhores professoras que eu já conheci. Aprendi, com ela, muito sobre a vida, sobre o valor do ser humano, sobre humildade e liberdade. Olhando a cena, pensei que nunca ia aprender a me organizar. Nesse início cursei poucas cadeiras porque meu filho era pequeno. Não tive oportunidade de usufruir tudo o que uma universidade proporciona, porque trabalhava, fazia estágio e era monitora de algumas disciplinas. Mesmo assim, fiz muitos amigos.

Histórias
No primeiro semestre do curso, trabalhei como monitora em um Núcleo de Contação de Histórias, em que eu contava histórias para crianças, em hospitais, creches, vilas e asilos. Em uma dessas apresentações, um representante da prefeitura me convidou para trabalhar em um Projeto de Contação de Histórias da Prefeitura de Porto Alegre, onde fiquei por cinco anos. Durante esse tempo, continuei fazendo estágios, pois achava muito importante essa experiência, já que o curso de Biblioteconomia é muito teórico. Nesse trabalho, encontrávamos crianças carentes de atenção, e eu ficava feliz em saber que estava levando um pouquinho de alegria e conhecimento para aquelas crianças. Sinto falta daquele trabalho e tenho vontade de retomar esse projeto.

Experiências
Depois de formada, fui convidada para trabalhar na Viação Ouro e Prata. A empresa tinha feito uma gincana para arrecadar livros e então fiquei responsável de organizar a biblioteca. Esse trabalho foi muito interessante, já que a biblioteca é usada,  principalmente, pelos funcionários com menor oportunidade de acesso à informação, omo os mecânicos, o pessoal da limpeza, pintores, auxiliares de manutenção e motoristas. À tarde, eu trabalhava no Centro Universitário Ritter do Reis, na biblioteca. Nessa época, fiz um curso de especialização na Universidade Federal de Santa Catarina, em Gestão da Informação. Foi complicado:  o curso ocorria uma vez por mês durante um ano eu trabalhei quase todos os dias das 8h às 20h porque tinha que compensar o horário para poder viajar. Mesmo com os obstáculos, foi uma época muito interessante, onde aprimorei meu conhecimento e fiz grandes amigos que mantenho até hoje. Depois desse trabalho, fui trabalhar no SESC, onde trabalhava muito em eventos nos fins de semana, e também na Feira do Livro.

Oportunidade
Surgiu uma vaga na FAPA, e fui chamada para uma entrevista. No mesmo dia da seleção, fui contratada e então pedi demissão do SESC. Quando comecei esse trabalho, pensei que iria ficar lá até a minha aposentadoria. Gostava muito de trabalhar lá, onde eu tinha muito contato com os professores e alunos. Na época, a FAPA era dividida em duas instituições. Depois de três anos trabalhando como bibliotecária na FAPCCA,  aconteceu a união das duas instituições, e a biblioteca foi o primeiro setor a ser unificada. Todos os meus funcionários foram demitidos. Dali em diante, eu deixei de gostar do trabalho, o ambiente que antes era muita familiar e agradável tornara-se insuportável por problemas de relacionamento com um colega de trabalho. Saí da instituição e, dois anos depois, fui convidada por um grupo de professores que estavam montando uma nova faculdade e precisavam de uma bibliotecária para planejar, estruturar e organizar a biblioteca. Nesse meio tempo, surgiu a vaga na Unisinos, à qual concorri, sendo selecionada.

Livro
Tem um livro que não esqueço, e acho que toda a adolescente devia ler: Polyana e Polyana moça (se bem que hoje os interesses são outros e talvez as adolescentes não sintam interesse por esse tipo de leitura). Gosto muito da Lya Luf. Estou lendo, no   momento, Perdas e ganhos. Também aprecio a obra do Mário Quintana. É complicado como bibliotecária escolher uma obra, pois lemos muitos resumos, sumários, resenhas para poder catalogar os livros que recebemos. É obvio que não temos como ler os conteúdos na íntegra, se não levaríamos décadas para catalogar as obras da Biblioteca.

Filme
Um filme que assisti muitas vezes foi Ghost e gostei muito do filme As pontes de Madison. Como moro com meu irmão e com meu filho, acabo assistindo a filmes de ação, a exemplo da série Velozes e furiosos. Não gosto muito desse gênero, acho artificial, e acabo discutindo em casa sobre os filmes. Gosto de assistir, também, à série de televisão The O.C.

Horas Livres
Costumo passear no Parque da Redenção, sempre com o chimarrão a tiracolo. Gosto também de viajar. A última foi um rafting que fiz com meu filho e seus amigos, em Três Coroas. Nessa ocasião, conheci o templo budista localizado no município. Vou muito também a Santa Catarina, por conta dos amigos que tenho lá e de minhas afilhadas,  que moram em Florianópolis.

Esporte
Não pratico nenhum esporte no momento, mas costumava andar de bicicleta. Em razão da violência das ruas, não pratico mais essa atividade.

Brasil
Estamos vivendo em uma sociedade doente. Acredito que as pessoas estão perdendo os valores que são importantes para a sobrevivência em comunidade. É triste, às vezes não vejo a luz no fim do túnel. Penso que os valores, principalmente da família, devem ser resgatados. Mesmo separada, mantenho contato com a família de meu ex-marido, tenho uma sogra maravilhosa que me trata com muito carinho. Nas fotos da formatura do meu filho estamos todos juntos. É importante ter essa base. O Brasil está
atravessando uma fase em que se perdeu o conceito da família e da importância da vida, da dignidade do ser humano. As pessoas são assaltadas e mortas por razões desprezíveis, não existe mais o cuidado com o ser humano, e o número de moradores de rua cresce significativamente a cada dia. Em relação a isso, os governantes deviam tomar providências mais eficazes. Estamos vivendo em uma sociedade carente de valores morais, afetivos e éticos.

Unisinos
Adoro trabalhar na Unisinos e gosto muito da minha profissão. Quando comecei a trabalhar aqui, fiquei muito assustada, pensando que não iria conseguir. Acostumada a trabalhar em instituições pequenas, não dominava as Bases de Dados usadas na biblioteca da Universidade. As bases de dados são, em sua grande maioria, em inglês, e esse não é meu ponto forte. Na primeira semana, fiz um curso ministrado pela Capes, e eu não entendia nada. Quando chegava em casa chorava muito. Com o apoio da minha mãe e de duas colegas de trabalhos, estudei muito e consegui. Hoje, trabalho no Setor de Processamento Técnico de Livro e Materiais Especiais, faço a Capacitação de calouros, elaboro as fichas catalográficas das teses e dissertações e ministro um Curso sobre as Normas da ABNT para elaboração de trabalhos acadêmicos. A Unisinos passa por um momento delicado, mas acredito que se todos vestirmos a camisa e trabalhamos em equipe essa fase fará parte do passado. Acredito que aqui é o um ótimo lugar para se trabalhar. A todo momento, temos oportunidade de aprender e colaborar de alguma forma com o crescimento da Instituição. Temos um ótimo espaço de trabalho. É um lugar com muita flexibilidade e apesar do tamanho da instituição sinto que temos um tratamento quase familiar.

Instituto Humanitas Unisinos
 
Penso que os serviços e programas oferecidos contribuem significativamente para o desenvolvimento da Instituição, dentro da visão humanista social que permeia nossas atividades.

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