Edição 538 | 05 Agosto 2019

Multiplicidade de Rosa

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Ricardo Machado

Terezinha Maria Scher Pereira versa sobre as abordagens que compõem a literatura do autor de Grande sertão: veredas

A riqueza da obra rosiana está em sua multiplicidade de abordagem das questões humanas. “No Grande sertão: veredas, o processo é uma reflexão filosófica, existencial, para pôr em questão o panorama cultural da razão moderna, no momento do processo desenvolvimentista do Brasil do século XX. Já Meu tio o Iauaretê mostra uma espécie de ‘superação’ do regionalismo, contribuindo para se pensar a própria formação da América Latina através da diferenciação”, propõe a professora e pesquisadora Terezinha Maria Scher Pereira, em entrevista por e-mail à IHU On-Line.

A obra de Rosa “produz tensionamento, na medida em que põe em suspenso o mito da ‘razão como panaceia de todos os males’, para usar uma expressão de Merquior”, avalia a professora. “Pela invenção da linguagem que acompanha todo um movimento de renovação do gênero, que se dá nesse momento no Ocidente”, complementa.

Terezinha Maria Scher Pereira possui graduação em Letras pela Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF, mestrado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio e doutorado em Letras (Literatura Brasileira) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Atualmente é professora adjunta da UFJF.

Confira a entrevista.

IHU On-Line - Como o ser, do ponto de vista da literatura, se revela nos diálogos de Guimarães Rosa?

Terezinha Maria Scher Pereira – Em Grande sertão: veredas, trata-se de um ser que duvida e que pergunta. É angustiado por causa da divisão de seus afetos. Em Meu tio o Iauaretê já temos um ser em metamorfose, cuja linguagem vai, aos poucos, se transformando de humana em animal.

IHU On-Line - Os narradores em Grande Sertão: veredas e Meu tio o Iauaretê, diferem-se à medida que o primeiro se orienta por meio da dúvida existencial e o segundo por meio da metamorfose. Como caracterizar cada um dos processos?

Terezinha Maria Scher Pereira – No Grande sertão: veredas, o processo é uma reflexão filosófica, existencial, para pôr em questão o panorama cultural da razão moderna, no momento do processo desenvolvimentista do Brasil do século XX. Já Meu tio o Iauaretê mostra uma espécie de “superação” do regionalismo, contribuindo para se pensar a própria formação da América Latina através da diferenciação. Metamorfoseando o local em “outra coisa”, temos o que Antonio Candido chama de super-regionalismo.

IHU On-Line - Pode-se dizer que a literatura de Guimarães Rosa é iconoclasta? Em que sentido? Por quê?

Terezinha Maria Scher Pereira – Sim. Principalmente na renovação da linguagem e no modo provocativo de pensar o Brasil nas suas instituições republicanas.

IHU On-Line - Como a nossa literatura produz, nesse sentido, tensionamentos à racionalidade ocidental, compreendida como os modelos de pensamento de matriz europeia?

Terezinha Maria Scher Pereira – Produz tensionamento, na medida em que põe em suspenso o mito da “razão como panaceia de todos os males”, para usar uma expressão de Merquior.

IHU On-Line - De que modo se dá a construção do latino-americanismo na obra de Guimarães Rosa?

Terezinha Maria Scher Pereira – Pela superação do regionalismo, que é uma tradição literária tanto do século XIX, quanto do Romance de 1930.

IHU On-Line - De que maneira as linguagens rosianas produzem, então, uma performance latino-americana e, ao mesmo tempo, rompem com as tradições ocidentais da representação?

Terezinha Maria Scher Pereira – Pela invenção da linguagem que acompanha todo um movimento de renovação do gênero, que se dá nesse momento no Ocidente.

IHU On-Line - Qual a importância de ler e reler a obra de Guimarães Rosa no Brasil atual?

Terezinha Maria Scher Pereira – O Brasil atual ainda se vê à volta com as mesmas grandes questões das quais a literatura de Rosa tratou.

IHU On-Line - Deseja acrescentar algo?

Terezinha Maria Scher Pereira – O caráter renovador e até revolucionário da literatura de Rosa continua, portanto, pertinente no Brasil de hoje. ■

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