Edição 517 | 18 Dezembro 2017

O ar fresco de uma Igreja em saída

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Lara Ely

Evento do IHU debate o protagonismo do pontificado de Francisco como fenômeno geopolítico

Quando a fumaça branca saiu pela chaminé da Capela Sistina em 13 de março de 2013, a Igreja não imaginava que o sucessor de Joseph Aloisius Ratzinger representaria uma lufada de ar fresco ao Vaticano. Como primeiro papa não europeu, latino-americano, argentino e jesuíta a ocupar o cargo, Francisco trouxe uma nova perspectiva teológica, muito menos teórica e mais pastoral.

Responsável pela adoção de uma postura ao mesmo tempo tolerante e ativa, ele assume um protagonismo geopolítico. Essa liderança também tem reflexos na Igreja, tensionando para que se reinvente frente aos desafios da atualidade. São ações que geram, dentro do catolicismo, muitas adesões, mas também resistências. Para tentar compreender essa outra forma de ser Igreja trazida por Mario Bergoglio, e refletir a partir das suas provocações, o XVIII Simpósio Internacional IHU A Virada Profética de Francisco – Possibilidades e limites para o futuro da Igreja no mundo contemporâneo vai discutir, entre os dias 21 e 24 de maio de 2018 em Porto Alegre, o papel da Igreja hoje.

Autor da biografia do papa e estudioso da Igreja latino-americana, o jornalista inglês Austen Ivereigh define Francisco como “reformador” não só pelo que propõe no pontificado, mas pela história de mudanças que fez. “Eu o chamo de ‘grande reformador’ porque ele tem se mostrado resoluto em seu objetivo de convocar a Igreja para voltar à sua missão essencial”, explica. Outro estudioso do tema, o escritor e jornalista Marco Politi analisa o perfil do papa a partir da enxugada feita por ele nas finanças do Vaticano, destacando o fechamento de contas, a criação de um comitê contra a lavagem de dinheiro, a criação de acordos de cooperação judiciária com Estados e a criação do Secretariado para a Economia como pontos relevantes de sua contribuição.

Ao deparar com as questões sociais, políticas e ambientais, o Papa não se furtou de assumir uma postura firme voltada às minorias. Seus quase cinco anos de papado reúnem exemplos que ilustram o que defende como uma Igreja em saída: o aceite do pedido de desculpas do líder das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia Rodrigo Londoño, o Timochenko, por toda a matança ocorrida em um conflito de meio século, a visita humanitária à ilha de Lesbos, na Grécia, onde interagiu com os refugiados do Oriente Médio, entre outros episódios.

Visita à América Latina

Esse mesmo espírito também deve ser a tônica de sua próxima visita à América Latina, entre 15 e 21 de janeiro de 2018, quando passará por Chile e Peru. No primeiro país, encontrará um governo aberto à democracia (não mais sob ditadura de Pinochet, como foi em 1987, na visita de João Paulo II), com o número de católicos diminuído em quase 60% e com índios mapuche enfrentando conflitos territoriais. No segundo país, travará diálogo com os povos da floresta amazônica, tema relacionado com a Laudato Si’ e o Sínodo dos Bispos para a Amazônia . Este assunto pautará a conferência do teólogo alemão Paulo Suess , membro do Conselho Indigenista Missionário - Cimi, durante o Simpósio do IHU. “Missão, participação, proximidade aos pobres, diálogo, estruturas a serviço do povo de Deus – eis as inspirações pastorais novamente lançadas pelo Papa Francisco", afirma o teólogo.

Quebra de paradigmas e críticas

Como ator no cenário político global, Bergoglio é dono de ações e falas que representam uma quebra de paradigma. Como bem lembrou o professor da Villanova University, nos EUA, Massimo Faggioli, “é preciso lembrar que o Papa Francisco, apesar de estar profundamente enraizado na tradição da Igreja, foi acusado de uma suposta falta de ortodoxia conservadora bem no início do seu pontificado”. As opiniões sobre ele vão de um extremo a outro: quando discursou na Bolívia, em 2015, foi elevado ao patamar de “um dos mais importantes estadistas mundiais” nas palavras do escritor e teólogo brasileiro frei Betto, repercutido pela imprensa europeia. As palavras de Cesar Kuzma, um dos mais expressivos teólogos católicos brasileiros da nova geração, expressam a visão da ala mais conservadora do Vaticano: “Francisco quer reformas e as reformas tendem a mexer nas estruturas. É óbvio que quem é favorecido pela estrutura não quer mudança”.

Essa postura de Francisco quase insurgente, o jornalista e ex-senador italiano Raniero La Valle definiu como “virada profética”. O escritor se baseia na ruptura de Francisco com uma perspectiva de mais de 30 anos de Igreja, surgindo como uma liderança popular e surpreendente onde ninguém esperava. Mesmo sem ter composto o corpo eclesial que participou diretamente dos debates entre 1962 e 1965, suas ações retomam o Concílio Vaticano II. Como saldo, alguns avanços e a formação de um papa que surpreende e provoca reflexões. O XVIII Simpósio Internacional IHU A Virada Profética de Francisco busca justamente compreender melhor esse pontificado de Francisco no século XXI e os seus efeitos dentro e fora da Igreja.■

XVIII Simpósio Internacional IHU A Virada Profética de Francisco

21 a 24 de maio de 2018
Teatro Unisinos – Campus Porto Alegre (Av. Dr. Nilo Peçanha, nº 1.640, Bairro Boa Vista)
Mais informações.

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