Edição 209 | 18 Dezembro 2006

“Temos mais razões para ser cristãos hoje do que em outras épocas”

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IHU Online

Plínio de Arruda Sampaio, militante histórico da esquerda brasileira, um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT), ex-candidato ao governo do Estado de São Paulo pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSol), é cristão. Ele respondeu, por e-mail, algumas perguntas da IHU On-Line, argumentando as razões que ainda o  motivam a seguir a doutrina cristã nos dias de hoje.

Sampaio é ex-deputado federal constituinte, promotor público, consultor da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), professor universitário e diretor do jornal Correio da Cidadania. Sobre ele, confira uma entrevista no site www.unisinos.br/ihu no dia 23/10/2006.

Ser cristão é engajar-se, pelo amor em Cristo, na mesma tarefa que Ele veio realizar: a construção do Reino de Deus – uma sociedade baseada na justiça e na misericórdia. Com fundamento nesta definição, não faltaram razões para ser cristão em nenhuma das épocas da humanidade, porque sempre houve falta de justiça e de misericórdia; sempre os poderosos oprimiram os pobres. Mas eu me atreveria a dizer que, talvez na época atual – essa sociedade desumana que o capitalismo criou – haja ainda mais razões para ser cristão, porque a técnica e a ciência modernas tornam a vida dos pobres mais submissa aos poderosos e mais despida de sentido do que em outras épocas. Eu acredito no Cristo e na Sua segunda vinda. Ele nos mostrou o Deus trino, porque acredito no Cristo, não posso deixar de acreditar no que Ele ensinou.

A vida e o andaime

Gosto de comparar a nossa vida terrestre ao andaime que os construtores fazem a fim de construir um prédio. Assim como andaime vale como meio para a construção definitiva, a nossa vida terrestre vale como meio de construir a nossa vida definitiva – a vida eterna no seio do Pai. Do mesmo modo que nenhum arquiteto valoriza mais o andaime do que o prédio, o cristão não dá à vida terrestre mais valor do que ela tem. O andaime tem que ser funcional e sólido. Tudo o mais é desperdício, porque ele só existe para ser destruído após a conclusão do edifício. Esta convicção nos ajuda a colocar os acontecimentos da vida numa perspectiva correta. Permite que distingamos o absoluto do relativo e, portanto, a conciliar a justiça com a misericórdia. Não conheço nenhuma receita melhor para favorecer a convivência fraterna entre os homens. A consciência da relatividade da nossa vida humana ajuda também a admirar a criação divina. Animais e plantas, vistos nesta perspectiva, tornam-se motivo de contemplação e fonte de alegria. São Francisco mostrou-nos, de modo admirável essa relação entre a natureza e o sagrado.

A fé, a ciência e os desafios do cristianismo

Os conhecimentos científicos jamais abalaram a minha fé. Para mim, são duas ordens de saberes distintos e complementares. O verdadeiro discurso da ciência está sempre do lado da vida e do amor e, portanto, do lado do Cristo. O cristianismo é o conjunto dos cristãos, de modo que os desafios postos ao cristianismo são postos, na verdade, a todos os cristãos. Na minha opinião, neste conturbado inicio de século, nosso desafio mais sério é a renovação da nossa Igreja. Precisamos fazer um grande movimento para pôr em prática as recomendações do Concilio Vaticano II , a fim de despir-nos definitivamente das distorções que séculos de constantinismo introduziram em nossa Igreja e de transformarmos sua ação naquilo que o Cristo sintetizou para João Batista: “A Boa Notícia é anunciada aos pobres”.

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