Edição 505 | 22 Mai 2017

Implicações políticas da teologia no pensamento de Giorgio Agamben

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Castor Bartolomé Ruiz

O tema de capa desta edição da revista IHU On-Line é dedicado ao filósofo italiano Giorgio Agamben (1942) que, de 2003 a 2009 foi professor da Facoltà di Design e arti della IUAV (Veneza) onde ensinava Estética, e do College International de Philosophie de Paris. Formado em Direito, foi professor da Università di Macerata, da Universitá di Verona e da New York University, cargo ao qual renunciou em protesto à política do governo estadunidense.

A produção de Agamben centra-se nas relações entre filosofia, literatura, poesia e, fundamentalmente, política. Entre suas principais obras traduzidas em português destacamos Homo Sacer: o poder soberano e a vida nua (Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2002), A linguagem e a morte (Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2005), Infância e história: destruição da experiência e origem da história (Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2006); Estado de exceção (São Paulo: Boitempo Editorial, 2007), Estâncias – A palavra e o fantasma na cultura ocidental (Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2007); Profanações (São Paulo: Boitempo Editorial, 2007); O reino e a glória. Uma genealogia teológica da economia e do governo (São Paulo: Boitempo, 2011), O que resta de Auschwitz (São Paulo: Boitempo, 2008), Altíssima pobreza (São Paulo: Boitempo, 2014), O uso dos corpos (São Paulo: Boitempo, 2017), A linguagem e a morte (Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2005), Infância e história: destruição da experiência e origem da história (Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2006), Estâncias – A palavra e o fantasma na cultura ocidental (Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2007), Profanações (São Paulo: Boitempo Editorial, 2007).

Entre suas obras em italiano, destacamos Signatura rerum (Sul Metodo, Torino, Bollati Boringhieri, 2008); Angeli. Ebraismo Cristianesimo, Islam, a cura di (Vicenza, Neri Pozza, 2009). La Chiesa e il Regno (Roma, Nottetempo, 2010), La ragazza indecibile. Mito e mistero di Kore (Milano, Electa Mondadori, 2010) e Il fuoco e il racconto (Roma: Nottetempo, 2014).

Em 4-9-2007, o sítio do Instituto Humanitas Unisinos – IHU publicou a entrevista Estado de exceção e biopolítica segundo Giorgio Agamben, com o filósofo Jasson da Silva Martins. A edição 236 da IHU On-Line, de 17-9-2007, publicou a entrevista Agamben e Heidegger: o âmbito originário de uma nova experiência, ética, política e direito, com o filósofo Fabrício Carlos Zanin. A edição 81 da publicação, de 27-10-2003, teve como tema de capa O Estado de exceção e a vida nua: a lei política moderna

Em 30-6-2016, o professor Castor Bartolomé Ruiz, da Unisinos, proferiu a conferência Foucault e Agamben. Implicações Ético-Políticas do Cristianismo. De 16-3-2016 a 22-6-2016, Ruiz ministrou a disciplina de Pós-Graduação em Filosofia e também validada como curso de extensão por meio do IHU intitulada Implicações ético-políticas do cristianismo na filosofia de M. Foucault e G. Agamben. Governamentalidade, economia política, messianismo e democracia de massas, que resultou na publicação da edição 241 dos Cadernos IHU ideias, intitulado O poder pastoral, as artes de governo e o estado moderno.


O texto apresentado a seguir, de autoria de Ruiz, faz uma apresentação do pensamento de Agamben e abre uma sequência de entrevistas dedicadas ao filósofo.


Ruiz é conferencista no VI Colóquio Internacional IHU – Política, Economia, Teologia. Contribuições da obra de Giorgio Agamben, que ocorre nos dias 23 e 24 de maio de 2017.

Confira o artigo.


O filósofo Giorgio Agamben, entre as diversas contribuições do seu pensamento, vem realizando uma espécie de exploração crítica das potencialidades da teologia para a política. Este percurso epistêmico do autor tem alguns objetivos e várias influências. Agamben adentra na teologia desde a perspectiva da filosofia crítica com objetivo de explorar a potencialidade crítica de categorias teológicas para a ação política e, em outro viés, desconstruir assinaturas sacralizadoras da ordem que persistem em nossas instituições contemporâneas.

A exploração crítica da teologia na obra de Agamben tem, entre outras, as influências de Walter Benjamin e de Michel Foucault . A abordagem que Agamben faz da teologia sintoniza, por um lado, com a primeira tese sobre a história de Benjamin em que este autor retrata a teologia como um anão feio e corcunda que permanece oculto no tabuleiro da história, ao qual atualmente não se dá atenção pela feiura, mas é fundamental para entendermos os movimentos dos acontecimentos históricos que nos envolvem. A teologia, para Benjamin, contém um potencial epistêmico de transformação e até de revolução que a racionalidade moderna perdeu pela erosão das categorias políticas contemporâneas. Em outra perspectiva de abordagem, Foucault pesquisou a genealogia das práticas do cristianismo em relação, entre outros aspectos, à constituição do sujeito ocidental e à conformação do próprio Estado moderno. Destacando, por exemplo, de um lado, a relevância do ascetismo cristão dos primeiros séculos como uma forma de vida que recolhia as práticas de vida das escolas cínicas e que se desdobrariam nas práticas de resistência dos diversos movimentos sociais das sociedades ocidentais. Por outro lado, Focault pesquisou a genealogia do poder pastoral, um poder que cuida e governa a vida humana, como prática de governo inerente à formação do Estado moderno.

Agamben, em suas pesquisas, dá continuidade a diversas trilhas epistêmicas das implicações políticas da teologia abertas por Benjamin e Foucault. Entre outras, poderíamos destacar a importância que as pesquisas de Agamben vêm dando a categorias como: messianismo, oikonomia trinitária, liturgia, regra de vida monástica e profanação.

O messianismo

O messianismo é uma categoria teológica herdeira do judaísmo que Benjamin explorou na sua filosofia. Agamben entende que a ordem social contemporânea tende a perpetuar-se sob o modelo do controle biopolítico das condutas. Neste marco político, os sujeitos são compelidos a produzir condutas condizentes com a preservação da ordem. São condutas governamentalizadas por dispositivos de controle que a cada dia se expandem mais e aprimoram sua eficiência na condução e governo dos comportamentos. Nesta lógica, a ordem social segue uma espécie de previsão de metas de governo, seguindo um tipo de ordem natural das coisas na qual os sujeitos, se quiserem sobreviver e progredir, têm que se acoplar e modelar suas condutas. O messianismo é a categoria teológica que atesta a possibilidade da ruptura histórica como princípio constitutivo da historicidade dos acontecimentos. O messianismo representa a possibilidade de que, em um momento dado e de forma imprevisível, é possível a novidade histórica. O messianismo pensa a história como possibilidade de que um acontecimento novo irrompa de forma imprevisível e modifique o curso da história. O messianismo representa uma esperança na possibilidade da ruptura e inovação históricas. Benjamin formulou a metáfora de que o instante é a porta por onde pode entrar o messias. O messianismo representa a possibilidade da revolução histórica como forma política de mudar a ordem social estabelecida.

Agamben, entre outras, analisa a prática messiânica de São Paulo como paradigma de uma experiência histórica de ruptura com o tempo e o império romano que lhe tocou viver. São Paulo formulou a tensão da sua experiência messiânica cristã na fórmula viver como-se-não numa vivência da temporalidade do ainda-não. Agamben analisa de forma muito detalhada esta prática messiânica na obra O tempo que resta, que é um estudo dos primeiros versículos da carta aos Romanos, de São Paulo. Viver como-se-não significa provocar uma tensão entre o tempo presente e a possibilidade de um tempo futuro que ainda não existe, mas cuja existência é possível. O como-se-não representa uma postura militante na qual se está dentro de uma ordem como-se-não se pertencesse a ela. Como-se-não é tomar distância do tempo e da ordem social presentes na expectativa de um outro tempo e uma outra vida. O como-se-não induz uma forma de vida que resiste à captura comportamental do tempo presente e abre para a criação de formas de vida diferentes daquelas dominantes no presente.
Ainda nas implicações políticas do messianismo, poderíamos destacar a relação entre a lei e a vida. A postura messiânica torna a lei inoperosa porque almeja viver uma vida além da lei. O messianismo não pretende viver uma vida sem lei, o que provocaria um estado de exceção em que a vida humana é fragilizada pela falta de lei, nem promove uma vida fora de lei como se a lei fosse sempre negativa. O messianismo pretende propor o ideal de vida além da lei, ou seja, uma vida que não se limita a viver segundo a lei, como se esta fosse um ideal para viver. Para o messianismo, viver em plenitude significa superar todas as prescrições legais vivendo uma forma de vida que torne a lei desnecessária, inoperosa, porque a vida vive a lei em plenitude, a supera em tudo o que a lei poderia ter de positivo.

Nas atuais sociedades de controle, a proliferação de normas opera como dispositivo de normatização de comportamentos. A postura messiânica de vida nos libera da miragem de que a proliferação de normas e leis é o modelo a seguir para viver uma vida melhor. A vida messiânica torna inoperosa a lei.

Oikonomia Trinitária

Agamben, assim como Foucault, pesquisou a genealogia da economia política moderna. Agamben desenvolve a tese, principalmente em sua obra O reino e a glória, que o conceito moderno de economia política, que atualmente adquiriu a hegemonia da governamentalidade biopolítica da vida humana, é uma ressignificação dos debates que o cristianismo desenvolveu durante os séculos 2, 3 e 4 a respeito da compreensão da dimensão trinitária de Deus, assim como o problema da relação entre a vontade de Deus e a liberdade humana. A teologia cristã desses séculos, entre outras várias questões, teve que dar resposta a duas interpelações: como pode ser Deus um e ao mesmo tempo três pessoas? Como Deus pode governar o mundo e ao mesmo tempo respeitar a liberdade humana?

Essas questões aparecem de forma inovadora com o cristianismo. Nunca antes nem depois, nenhuma religião pensou Deus como pluralidade interna, neste caso trinitária, e a cosmogonia greco-romana entendia que o Logos comandava o mundo segundo as determinações da natureza. Neste suposto, não há liberdade histórica, senão determinismo do destino (anake). Desde o início, o cristianismo entendeu que há uma difícil tensão a ser preservada entre a onipotência de Deus no governo do mundo e a liberdade dos homens. Se negasse a liberdade humana, como faziam, por exemplo, os estoicos, não há possibilidade de pensar em salvação ou condenação; nesse caso a redenção de Cristo fica sem sentido.

A questão de como Deus governa o mundo a partir da liberdade humana, paradoxalmente, é a mesma questão da economia política, ou seja, como governar a conduta das populações sem utilizar medidas de soberania autoritária. A grande questão da economia política é como governar a liberdade humana. Algo diferente da teologia cristã que entende que Deus não pode governar a liberdade, já que esta é condição sine qua non para a salvação ou não de cada um. Por muito paradoxal que possa parecer, a economia política pretende governar a partir da liberdade, tendo por objetivo final governar a própria liberdade dos indivíduos induzindo sua conduta e produzindo seu comportamento a partir de estímulos indutores.

De outro lado, o cristianismo entendeu que o paradigma político da soberania não servia para explicar a relação intratrinitária de Deus, nem para entender como Deus governa o mundo. Por isso, os teólogos cristãos rejeitaram utilizar as categorias da soberania política tradicionais na teologia bíblica do antigo testamento, como rei, e em seu lugar incorporaram a categoria de oikonomia para explicar o governo de Deus no mundo. A categoria teológica da oikonomia foi desenvolvida como conceito que explica o governo de Deus sobre o mundo. Por meio da oikonomia, Deus governa o mundo não de forma absolutista, como um soberano déspota ou um rei, mas respeitando a liberdade humana através da noção de providência. Agamben mostra como o uso teológico que o cristianismo fez do termo oikonomia como governo influenciou diretamente os teóricos modernos da economia política que, na sua maioria, eram teólogos ou tinham estudado teologia. Lembrando que a economia, no século 17, não existia como saber, era uma parte da filosofia e da teologia moral.

Liturgia

Agamben mantém uma posição muito crítica em relação ao modelo de democracia contemporânea. Para o autor, este modelo se caracteriza por ser o que ele denomina de democracia de massas e democracias espetaculares.

Para as atuais democracias, a política tornou-se um espetáculo, e os cidadãos, meros consumidores de uma mercadoria que é fabricada nos bastidores do poder e oferecida para o consumo como qualquer outro produto. As atuais democracias fizeram da política uma encenação por meio da qual reduzem os cidadãos a meros espectadores passivos com a ilusão de participarem na medida que podem opinar com reações espontâneas próprias de um espectador ante um espetáculo. Este modelo espetacular de democracia reduz o povo a uma massa de espectadores que consomem um produto. Uma democracia de massas procura prever a reação da massa antecipando-se a seus gostos, para tanto, cria estratégias de imagem e linguagem por meio das quais procura direcionar a “opinião pública” da massa e seu comportamento. Esta equação de governamentalização das condutas, própria das democracias de massa, está longe do demo-kratos, o poder do povo.

Agamben analisa como entre os dispositivos utilizados pelas democracias espetaculares destaca-se a “aclamação”. Aclamar equivale a referendar de forma espontânea o poder de quem fala. Neste ponto, Agamben lembra, de forma crítica, as teses de Carl Schmitt , o jurista do nazismo, que defendia o que ele denominava de “democracia pura”. Para Schmitt a verdadeira democracia realiza-se no ato aclamatório do povo ao líder. Na aclamação realiza-se, para Schmitt, o poder puro do povo, que reconhece ao líder como seu legítimo governante. A aclamação seria o ponto culminante da democracia, uma democracia pura.
Agamben mostra que as democracias de massas substituíram, cada vez mais, o poder deliberativo do povo pelo dispositivo da aclamação. O poder, nas democracias de massa, legitima-se, cada vez mais, por novos dispositivos aclamatórios do poder como as pesquisas de opinião e a imagem pública do governante. A opinião pública é o novo dispositivo aclamatório da massa, utilizado pelos novos líderes que acenam midiaticamente num espetáculo político consumido por um povo reduzido, cada vez mais, a uma massa de consumidores.

Agamben investiga como o dispositivo da aclamação tem uma forte raiz na liturgia religiosa. Seguindo os estudos de teólogo Peterson e seus debates com Schmitt, Agamben traça a genealogia do dispositivo da aclamação na liturgia. O termo liturgia, paradoxalmente, tem origem política na ágora da Polis, assim como as aclamações também têm uma origem política. A aclamação teve grande importância em Roma para legitimar o poder de imperadores e generais. A liturgia cristã incorporou a aclamação como parte do seu ritual, no qual aclama-se a Deus como soberano e senhor. Nas democracias de massas, assistimos, cada vez mais, à utilização dos dispositivos aclamatórios como forma de legitimação do poder.

Como sabemos, a aclamação foi e é o dispositivo utilizado pelos fascismos e as diferentes formas de caudilhismo para legitimar o poder dos líderes. Na medida em que nossas democracias tendem a legitimar efetivamente o poder através de dispositivos aclamatórios, afastando o poder deliberativo real do povo, Agamben aponta para o grave paradoxo de estarmos produzindo democracias autoritárias.

Regra de vida

Agamben, seguindo as trilhas abertas pelas últimas pesquisas de Foucault, também adentrou no estudo da genealogia das práticas do cristianismo primitivo. O interesse de Agamben centra-se especificamente na forma-de-vida do monasticismo cristão dos primeiros séculos. O autor procura resgatar uma forma-de-vida em que se problematizou de forma inovadora a relação entre a regra e a vida. Agamben chama atenção para o fato de que, antes do monasticismo cristão, encontramos muitos estudos sobre o problema da lei e da norma, mas não há obras nem está problematizada a questão da regra. A partir do século 2 d.C., vemos proliferar uma grande literatura sobre a regra e a vida, a regra de vida. Para Agamben, nestes tratados encontramos os vestígios de uma prática de forma-de-vida muito singular. A característica principal é que as novas comunidades cristãs que escolheram viver na forma de vida monástica pretenderam viver uma vida e, a partir dessa vivência, estabelecer uma regra para viver.

Na regra de vida do monasticismo cristão, o prioritário é a vida que decide qual a regra apropriada para essa forma-de-vida, e não o contrário. Agamben destaca a singularidade desta prática de vida, haja vista que nós estamos inseridos em sociedades de controle em que a norma é utilizada como dispositivo de normalização de condutas. A proliferação normativa de nossas sociedades é uma técnica através da qual a vida humana é, cada vez mais, normatizada capilarmente em seus comportamentos para ajustá-la aos requisitos do sistema. Por isso, Agamben entende que as novas formas de resistência aos dispositivos normatizadores do controle social haverão de criar novas formas-de-vida em que a norma e a lei derivem da vida, e não ao contrário, como ocorre atualmente.

Profanação

Por último, entre outras muitas categorias, destacamos a importância que Agamben dá ao conceito da profanação como prática indutora de uma nova ação política. As sociedades modernas instituíram o modelo da secularização como meio para separar a religião da política, a teologia do poder. Contudo, para Agamben, o modelo de secularização moderno realizou uma maquiagem superficial, mantendo no âmago do poder moderno a assinatura da sacralização.
A sacralização é o dispositivo religioso ancestral através do qual parcelas da vida humana são retiradas do alcance do poder comum das pessoas para serem administradas por especialistas do sagrado, os sacerdotes. Sacralizar algo significa, entre outras coisas, retirá-lo do domínio direto das pessoas comuns, transferindo o poder de controle dessa dimensão para uma esfera, supostamente divina, administrada por pessoas devidamente preparadas, que são os sacerdotes. Agamben entende que o poder moderno manteve o dispositivo da sacralização no seu âmago e o transfere para a maioria das instituições que cria. Com isso, as pessoas comuns não seriam competentes para lidar com o poder nem com as instituições do poder. Para lidar com a complexidade do poder moderno, seria necessário ser um técnico especializado (novos sacerdotes). Assim, instituições como o mercado, o Estado, a lei etc., mesmo afetando a vida cotidiana das pessoas, continuariam tendo a assinatura da sacralização que as mantêm distantes delas numa nova transcendência secularizada. Mesmo a vida das pessoas sendo afetada e atingida por estas instituições, considera-se que o poder de gestão e governo excede a capacidade do povo, por isso devem ser “técnicos especializados” os responsáveis por gerenciar o poder dessas instituições. Para Agamben, a assinatura da sacralização persiste nas sociedades secularizadas, possibilitando que o exercício do poder continue a ser privilégio de pessoas selecionadas para esse fim.

Agamben introduz o conceito de profanação para denominar a prática – mais radical que a mera secularização – através da qual há que despojar o poder da aura de inatingível para permitir que as pessoas comuns possam decidir sobre as principais questões que afetam as suas vidas, sem transferir para especialistas e instituições misteriosas a solução dos mesmos. Profanar significa retirar do poder sua aura de transcendência para permitir que as pessoas consigam decidir sobre seus destinos. Paradoxalmente, Sócrates foi condenado à morte por profanar a lei divina da polis, de igual forma Jesus foi crucificado por profanar e lei e o templo. Para Agamben, a profanação seria uma prática política que deve desconstruir de forma efetiva as assinaturas transcendentes do poder.■

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