Edição 202 | 30 Outubro 2006

Valores e inquietações da juventude

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IHU Online

Encontros de Ética

Valores e inquietações da juventude leopoldense: revelações de uma pesquisa é o tema que o Pe. Hilário Dick apresentará nos Encontros de Ética da segunda-feira, 6 de novembro. A atividade, aberta a toda a comunidade acadêmica, tem entrada franca e vai das 17h30min às 19 horas, na sala 1G119 do IHU.

Pe. Hilário é Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Juventude da Unisinos, ex-assessor do Setor Juventude da CNBB, co-fundador do Instituto de Pastoral de Juventude de Porto Alegre e pesquisador do Grupo Temático Juventude do IHU. Também é autor de diversos livros para a juventude, entre eles Gritos Silenciados, mas evidentes. Jovens construindo juventude na história. São Paulo: Loyola. Confira abaixo a entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line.

IHU On-Line - Por que a questão da juventude ganhou mais visibilidade agora? O jovem está de fato interessado em discutir os próprios problemas?

Hilário Dick
- A maior visibilidade nasce de vários fatores: A) Vivemos numa “onda juvenil”. Ao mesmo tempo em que estamos diante de um segmento demograficamente em alta, todos querem “ser jovens”. Assim como há os que sonham ser adolescentes... Em busca do tempo perdido. B) Os jovens são vistos porque seus gritos não podem ser mais abafados (apesar de todos os esforços). Os jovens sempre estavam aí com sua energia, sua beleza, seus problemas, mas o mundo dos adultos resiste a todos que competem com ele e pensa diferente dele. C) A visibilidade juvenil relaciona-se, infelizmente, com as páginas policiais, com os atos de violência e não pelas idéias que têm e defendem (do seu jeito). Os jovens são vistos porque traem os problemas que a sociedade vive, mas não querem enfrentar como problemas seus (eles são os culpados). Os jovens estão interessados, sim, em discutir os seus problemas porque “os seus problemas” são os problemas da sociedade (e não tem a humildade de reconhecer) e a juventude está “mais por dentro” do que imaginamos.
 
IHU On-Line - Quais são os maiores problemas enfrentados pela juventude de São Leopoldo?

Hilário Dick
- Os maiores problemas não são somente de São Leopoldo. São do Brasil. São o desemprego e a violência. O jovem leopoldense (assim como o jovem em geral) vive três medos: o medo de morrer (violência), o medo de sobrar (desemprego) e o medo de estar desconectado (não estar na moda). Eles falam, também, de forma um tanto enigmática, das drogas. Para muitos, no entanto, a droga não é problema; é solução... A juventude de São Leopoldo intui em suas respostas que lhes falta (também por culpa dos adultos, educadores) eixos integradores. A escola não integra; o emprego não integra; a comunidade não integra. “Integrar” significa tornar uma atividade capaz de o jovem se “empoderar” socialmente, não somente de modo individual. Faltam atividades que integrem.
 
IHU On-Line - Como está, hoje, a discussão sobre políticas públicas de juventude? A sociedade já consegue reconhecer a necessidade de discutir os problemas enfrentados pela juventude, como a violência e a dificuldade em conseguir o primeiro emprego?

Hilário Dick
- Esta discussão das políticas públicas de, para e com a juventude amadureceu muito, mas – além da dificuldade que há em o jovem assumir sua identidade - a sociedade dá um jeito que ela fique em água morna porque uma verdadeira política pública para qualquer sociedade deveria ser uma questão de todos e não uma solução para um segmento. A questão juvenil é uma questão de todos: sociedade, igrejas, associações, partidos. Todos estamos em jogo. Uma boa política pública de juventude significa uma mudança de todos. E o “velho” sempre teve medo da novidade. A violência não é uma questão juvenil; o primeiro emprego só é problema para os jovens de uma sociedade que não ama a si mesma nos jovens.
 
IHU On-Line - Por que a violência atinge principalmente os jovens? A própria sociedade estimula a violência? Como evitar que os jovens se alistem em facções violentas? Que elementos são necessários para a construção de uma cultura de paz?

Hilário Dick
- São várias perguntas. 1) A violência atinge principalmente os jovens porque, na sua busca de coerência, ainda reagem de forma rápida a toda situação de injustiça, isto é, de violência. Os adultos são mais “prudentes” e mais acomodados, tolerando coisas que não podem ser toleradas. 2) A juventude é violenta não por ela, mas pela sociedade que é violenta (luta de classe, fome, preconceito, egoísmo, corrupção, injustiças evidentes). Vivemos num sistema neoliberal violento onde o pobre já não é pobre, mas excluído. Uma coisa que sobra... Tanta coisa que os jovens não aceitam! (e que para os adultos se tornaram “normais”). 3) O jovem deseja vivências comunitárias bonitas, desafiadoras. Se elas não são oferecidas (nem construídas) ele encontra formas de viver esse “comunitário”. Uma das coisas fundamentais que deveriam preocupar toda sociedade são as vivências grupais dos jovens. 4) Uma cultura de paz não se pode dissociar de uma cultura de justiça. As duas caminham juntas ou são irreais, insignificantes, enganosas.
 
IHU On-Line - Como os projetos de tecnologia para a inclusão social podem contribuir? Qual a receptividade dos jovens para as atividades desenvolvidas?

Hilário Dick
- Os projetos de tecnologia podem responder ao medo de sobrar e de estar desconectado, mas não resolvem se não se trabalhar, de forma pedagógica, a questão da integração do jovem. Toda atividade que vai na linha do “sair de si”, de “ser útil”, de “ter resultado” etc. Tem receptividade no jovem não só porque o inclui na sociedade, mas também o inclui nele mesmo. A busca de autonomia, de ser sujeito de sua história, de ser protagonista, de “empoderar-se” é uma das grandes buscas que os adultos não sabem respeitar porque (no fundo) gostariam de ter pessoas submissas e não autônomas que pensem e ajam do seu jeito. Aliás, seria a melhor forma de a sociedade amar-se a si mesma.
 
IHU On-Line - Quais foram os impactos do Governo Lula para a vida da juventude brasileira? O que a juventude deve esperar e cobrar do próximo governo que for eleito?

Hilário Dick
- Em primeiro lugar, a melhor pesquisa sobre a juventude brasileira é a do Instituto Cidadania, próximo da Secretaria Nacional da Juventude. Quem acompanha esta Secretaria pode perceber como crescemos e como não é fácil ser democrático, sem ser manipulador e autoritário. Pelas mensagens, reflexões e planejamentos que já se fazem, percebe-se o “sangue juvenil” que está em efervescência, procurando o bem de todos. Somente citando tudo que se está fazendo com relação ao primeiro emprego, ao Pró-Jovem, ao que se faz no Consórcio Social da Juventude, com a implantação de “coordenadorias” de juventude nas prefeituras (mesmo que, por vezes, manipuladas por interesses “velhos” e “adultos”) e tantas outras iniciativas, pode-se dizer que a juventude, no Governo Lula, teve condições de começar a viver, com ela, renovad a “cidadania juvenil”. Espera-se que esse espírito seja fomentado, sem castrações ideológicas que sonham com uma juventude impedida de ser protagonista.
 
IHU On-Line - Por que existem mais ações do governo voltadas para a criança que para o jovem?

Hilário Dick
- É mais fácil lidar com um segmento que ainda não aprendeu e não desejou ser autônomo, que pensa, reclama e manifesta-se. Também nas Igrejas verifica-se que se investe mais nas crianças porque é mais fácil, com menos incomodação e com menos exigência, fazer um mundo de coisas sem ser questionado. Imaginem as crianças reclamando contra a forma como são educadas e catequizadas... Não estou dizendo que as políticas para a infância não sejam fomentadas; estou dizendo que – de forma sempre mais pedagógica e madura – sejam fomentadas políticas que levem à juventude a ser mais feliz. Isso não se dá sem a vivência do protagonismo juvenil.

 

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