Edição 202 | 30 Outubro 2006

Crônica de uma Fuga

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IHU Online

O comentário é de Alysson Oliveira e publicado no www.cineweb.com.br, 06/10/2006

Ficha Técnica:

Nome: Crônica de uma Fuga
Nome original: Crónica de una fuga
Cor filmagem: colorida
Origem: Argentina
Ano produção: 2006
Gênero: drama
Duração: 103 min
Classificação: livre

Sinopse:

Buenos Aires, 1977, Cláudio (Rodrigo de La Serna) é seqüestrado por um grupo a mando do governo militar. Levado a uma casa isolada, ele encontra uma série de jovens na mesma situação. Após um tempo de cativeiro e tortura, ele e outros rapazes planejam uma fuga. Filme exibido em competição no Festival de Cannes 2006.

Comentário:

As ditaduras militares deixaram feridas políticas, econômicas e emocionais com as quais os latinos tentam lidar até hoje. Nos últimos anos, o cinema tem sido uma das principais formas usadas para catarse desse trauma. O argentino Crônica de uma Fuga pode ganhar o título de um dos exemplares mais densos sobre o tema. Depois de filmes sérios, mas com um tom mais intimista (como Kamchatka e Machuca), chega esse drama doloroso e visceral sobre um grupo de jovens presos e torturados pelo regime.

Baseado numa história real, o longa usa um drama pessoal para retratar um problema que afetou diversos países na época dos governos militares. Baseado numa história real, o roteiro, assinado pelo diretor uruguaio Israel Adrián Caetano, mostra um grupo de jovens confinados a uma casa isolada, enquanto são torturados por agentes do governo em busca de informações.
Um deles é Claudio Tamburrini (Rodrigo De la Serna), que, embora não seja um ativista político, acaba preso e torturado, pois tem amigos supostamente terroristas. Entretanto, seja por lealdade ou mesmo falta de envolvimento político, o rapaz não tem nada nem ninguém a entregar a seus torturadores. Como sabe que não tem muitas esperanças de ser libertado, com outros rapazes acaba planejando uma fuga, depois de mais de 100 dias de cativeiro.

Crônica de uma Fuga é, em sua essência, um thriller político sem medo de tocar em algumas feridas que ainda estão abertas na América Latina. Algumas cenas beiram a crueldade e, por isso mesmo, são necessárias. O elenco, em especial De la Serna, é eficiente e sua transformação emocional e física é visível ao longo do filme.

A sinceridade e competência que dominam Crônica de uma Fuga (que competiu em Cannes) é evidente. Perto dele, alguns filmes que têm o mesmo pano de fundo (como o brasileiro Zuzu Angel), mais parecem capítulos de telenovela.

Outros comentários:

Para Marcelo Janot, na página www.criticos.com.br, 13-10-2006, “mais do que uma crônica da fuga, trata-se de um estudo do comportamento humano quando submetido a tamanha violência física e psicológica, mostrando como reações individuais imprevisíveis podem ser determinantes no destino de todos. O diretor pega emprestado alguns recursos dos filmes de suspense/terror, como os súbitos movimentos de câmera e a música sombria, e em ritmo de thriller capta a atmosfera claustrofóbica de uma forma distinta daquela a que nos habituamos a ver nos filmes sobre tortura de presos políticos”.
Marcelo Hessel comenta o filme escrevendo na página www.omelete.com.br, 12-10-2006:

“O diretor uruguaio Adrián Caetano cimenta o seu manifesto contra a repressão, antes de tudo, preocupando-se em montar um suspense tenso. Iluminação baixa, vastos espaços e câmera fixa, para impor a claustrofobia. Eliminar dramatização excessiva é parte do processo (não há homens fazendo suas últimas preces ao som de violinos). Outra parte é não ter medo da realidade - se os presos eram mantido desnudos, sujos e machucados, que o elenco reproduza a situação. Claudio passa boa parte do tempo pelado, coberto de hematomas, e isso é bom avisar. Não é coisa para qualquer espectador.

Da relação de sobrevivência entre Claudio e os presos vêm a força conceitual do filme. Eles não tentam escapar em nome de uma "causa". Não lutam para derrotar o regime. Não pregam suas idéias ao demais. Querem apenas retomar suas existências. Não são seres apolíticos, de maneira alguma. Mas o fato de não abraçarem bandeiras é o que permite expor as suas fragilidades, é o que torna a tortura tão dolorosamente verdadeira. Ver que Claudio de uma hora para a outra passa a recorrer a Deus é um desses exemplos do que pode acontecer a uma pessoa normal em momento de ruína. Questionar a ideologia do protagonista é algo que jamais ocorreria num filme político de panfleto.

Não há cena mais latente desse humanismo do que o reencontro com a grávida. É uma sacada.”

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