Edição 422 | 10 Junho 2013

O (quase) invisível trabalho de Damian

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Ricardo Machado

Enquanto dezenas de jogadores buscam um espaço para jogar na Copa do Mundo de 2014, no Brasil, Damian já garantiu seu lugar no mundial de Futebol. Damian Steppacher, 32 anos, não é um estreante em Copa do Mundo, pois já esteve na África do Sul, em 2010. Mas ele não calça chuteiras, não é famoso e ninguém torcerá por esse gaúcho de Porto Alegre. Embora ele afirme que joga futebol três vezes por semana e que se considera um apaixonado pelo esporte, ninguém verá Damian dentro das quatro linhas, sua atuação é quase invisível, mas está longe de ser imperceptível.
Damian: “Conhecer pessoas de outros lugares é fundamental. A gente aprende a aceitar o outro"

Damian será voluntário não só na Copa do Mundo ano que vem, mas também na Copa das Confederações, que se inicia no próximo sábado. Para tanto, traz toda sua experiência de administrador de grandes empresas de telecomunicações, trabalho que realizou antes de ser aprovado em um concurso para gerente administrativo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Ufrgs. Aliado aos conhecimentos técnicos, Damian traz a experiência de 60 dias de convívio com pessoas de diversas partes do mundo no mundial de 2010. “A experiência foi surpreendente. Nós tínhamos toda uma informação, relacionada à precariedade e violência. Toda essa informação prévia não se confirmou. Quando cheguei lá percebi um país empolgado e o povo envolvido. Conheci estádios da primeira linha”, conta. “Havia alguns problemas, claro, problemas iguais a de qualquer cidade grande, mas longe daquilo que imaginávamos. Foi surpreendente”, complementa. O trabalho de Damian em 2010 era na gestão dos voluntários. Entre as tarefas realizadas estava a confecção das escalas de trabalho, a distribuição de uniforme, a gestão da alimentação aos demais voluntários. Enfim manter a engrenagem do comitê organizador do evento funcionando. “Às vezes eu fazia outras atividades quando faltava pessoas, como ficar no credenciamento, por exemplo. Era bem dinâmico”, destaca.


Sonho de menino

Estar na Copa do Mundo é o sonho de milhares de meninos, que se realiza apenas para poucos sortudos e competentes jogadores que conquistaram um espaço no milionário e disputadíssimo mundo do futebol. Para muitos, essa ainda é a única alternativa para fugir da pobreza. O caso de Damian não se trata exatamente desse clássico perfil de brasileiro, mas mesmo não sendo um jogador de futebol e, sim, um administrador, ele também tinha o sonho de participar da Copa. “Eu nunca tinha estado em uma Copa do mundo, mas eu vinha me inscrevendo desde as olimpíadas de Atenas, depois Londres. Na copa da Alemanha não fui selecionado, pois não falava alemão”, explica.

Apesar destes megaventos movimentarem bilhões e bilhões de dólares – apenas para usar uma unidade monetária de âmbito global -, a ajuda de custo aos voluntários é mínima. “Nas olimpíadas não consegui ir porque os gastos eram muito altos. Na África do Sul recebemos um auxilio praticamente insignificante, mais ou menos R$ 400. Fora isso, todo o restante é responsabilidade do voluntário”, esclarece Damian. Quando foi trabalhar na África do Sul, ele aproveitou para conhecer outros locais no país de Mandela e ficou, somando o período de voluntariado e de passeio, mais ou menos dois meses fora do Brasil. “Para ficar em torno de 60 dias gastei R$ 12 mil. Fiz passeios por cidades litorâneas e em locais incríveis. Aproveitei que estava viajando com um amigo e alugamos um carro para economizar. Umas das coisas incríveis que fiz foi mergulhar em uma piscina com tubarões. Além disso fiz safaris, safaris noturnos, foi a realização de um sonho de infância conhecer esses parques.”


Aprendizado

Damian considera que a oportunidade de poder trabalhar em um megaevento traz bons frutos para a carreira profissional. Formado em administração e com foco na área de markerting, sobretudo ao que se refere ao relacionamento com o cliente, ele considera que a oportunidade de trabalhar na Copa do Mundo é uma excelente experiência profissional.No mundial passado, Damian fez um site (www.voupracopa2010.com.br) onde realizou uma cobertura informal do evento. “Agora temos um fanpage no Facebook para contar um pouco nossa aventura, que começa agora e que segue até a Copa do Mundo”, diz.

De acordo com Damian, integrar a organização de megaeventos gera uma repercussão profissional importante e que ele já foi convidado para participar de diversos eventos. “Sou torcedor e sócio colorado há anos. Já tenho um convite para quando eu voltar da Copa das Confederações para compartilhar a experiência deste evento”, frisa. “Fora o reconhecimento, tem um lado que se torna prazeroso porque o trabalho é divertido, não pela remuneração, mas pelo fato de conhecer pessoas e se sentir fazendo parte de algo maior. É muito legal saber que fazemos as coisas acontecerem, pois a grande força de trabalho nesses megaeventos é a grande massa de voluntários. A questão da autorrealização é impagável”, destaca.

Com o trabalho na África do Sul, Damian diz que conheceu pessoas da Itália, França, Argélia, México e de toda parte da África como Camarões e Nigéria. “Conhecer pessoas de outros lugares é fundamental. A gente aprende a aceitar o outro. Um amigo que fiz da Argélia é muçulmano. Ele tem todos padrões diferentes. É um desafio conviver, mas a gente aprende a respeitar cada povo com sua cultura e isso é o mais legal”, avalia Damian.


Críticas

As questões relacionadas ao Mundial de Futebol são um tanto quanto controversas, seja pelas exigências da Fifa e sua Lei Geral da Copa, seja pela forma de condução do Estado brasileiro na realização das obras nos estádios e de mobilidade urbana. Damian parece lidar bem com as críticas e não foge da raia quando é questionado do por que trabalhar de graça em um evento que movimenta tanto dinheiro, onde há um enorme faturamento. “Tenho consciência que o mercado do futebol movimenta milhões. Eu, porém, me coloco um pouco fora disso e foco que estou investindo em meu conhecimento. Estou fazendo um curso de marketing a céu aberto. Se eu fosse escolher fazer uma especialização, eu gastaria mais. Trata-se de uma escolha e todas escolhas são passíveis de críticas”, pondera sua madura decisão.

Damian fala de um modo manso, mostra-se um sujeito tranquilo que deseja fazer seu trabalho e ajudar da melhor forma possível. O jovem administrador descobriu no voluntariado a chance de realizar seu sonho e enquanto o mundo inteiro volta os olhos ao Brasil, por conta da Copa do Mundo, Damian realiza seu (quase) invisível trabalho.

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