Edição 377 | 24 Outubro 2011

IHU Repórter

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Thamiris Magalhães e Márcia Junges

Empolgado com seu trabalho e com sua vida. Valdir José de Bona sabe o quanto se esforçou para se sentir uma pessoa realizada. Em sua definição, o sucesso é uma mistura de saúde, realização profissional e bons relacionamentos com a família e amigos. Dono dos restaurantes Ramblas e Fratello e responsável pela alimentação oferecida no Restaurante Universitário há três anos, ele está nesse ramo desde 1985, quando abriu uma sorveteria em São Leopoldo. De lá para cá, sua paixão pela comida o fez aprimorar cada vez mais os serviços que presta, fama que pode ser comprovada em um almoço no câmpus da Unisinos. Confira a entrevista concedida pessoalmente à IHU On-Line.

Origens – Nasci em Sertão, perto de Passo Fundo-RS. Sou filho de agricultores, e até os 18 anos trabalhei em uma serraria. Tenho três irmãos que continuam na região de Passo Fundo. Vim para São Leopoldo para cursar Engenharia Civil na Unisinos. Sou formado nessa profissão, mas nunca cheguei a exercê-la.

Alimentação – Gosto de São Leopoldo desde o primeiro dia em que aqui cheguei. Abri a sorveteria Fratello em 1985, mesmo ano da minha formatura. Na verdade era uma revenda de sorvetes, sucos e sanduíches produzidos por um amigo meu, conterrâneo que veio no grupo de Passo Fundo para estudar na Unisinos. Depois de 12 anos, implantei um restaurante dentro da Unisinos, o atual Fratello, que se localiza próximo ao Direito e à Comunicação. Em 1998 decidi vender os outros restaurantes e me concentrar apenas no Fratello. Nessa época eu trabalhava 17 horas por dia e fechava só no Natal e ano novo. Era muito puxado. Isso aconteceu por 12 anos. Via poucas vezes minha família, era muito desgastante, mas também foi a época de fazer o “pé de meia”. Em seguida surgiu a oportunidade de assumir a alimentação oferecida no Polo de Informática, no restaurante Ramblas da Unitec. Começamos servindo de 30 a 35 refeições, por uns dois anos. Nesse período não tínhamos vantagens com esse negócio. Com o passar do tempo é que a situação melhorou, com o expressivo crescimento do polo. Agora é que podemos dizer que temos lucro e que vale a pena.

Organização – É importante ressaltar que trabalhamos de segunda a sexta. Para suportar isso é preciso estar organizado com as finanças. Há um lado bom, pois podemos descansar. Porém, não podemos nos iludir com o faturamento do tempo de aula. É preciso “guardar gorduras” para quando chegarem as férias. Quando vem o final de novembro, começo de dezembro, diminui o número de alunos, pois o campus fica praticamente deserto. Há, ainda, recesso de dezembro e os meses de janeiro e fevereiro, que são fracos. As lancherias diminuem drasticamente seu movimento nesse período. Nessa época, tentamos diminuir as despesas, já que as receitas caem.

Dedicação – Ter um empreendimento de alimentação requer muita energia. É preciso abrir mão de diversas coisas para mantê-lo funcionando. Hoje estou revendo isso. Mas largar o negócio “ao Deus dará” não dá certo. É preciso envolvimento, acompanhamento. Depois de ter assumido a alimentação oferecida no Polo de Informática, surgiu a oportunidade de assumir o Restaurante Universitário - RU. Esse foi um desafio que aceitamos há 3 anos. Recebemos várias críticas, mas bem mais incentivos. Penso que avançamos muito em relação ao modelo antigo desse restaurante. É preciso um acompanhamento intenso, monitorando como as pessoas descascam os legumes, como utilizam o azeite, como é feita a limpeza. Isso é diário. Se você está em casa e chama amigos para jantar, após a refeição é preciso limpar tudo, organizar, deixar bem arrumadinho. A mesma coisa acontece nos restaurantes. Depois de preparar um almoço, temos que limpar e organizar tudo, deixando pronto para o jantar. Só que isso ocorre em escala bem maior. Dali a pouco chegam verduras, frutas e outros alimentos. Então, é preciso organização, treinamento e saber o que se está fazendo.
Tenho uma teoria de que restaurantes “artesanais”, como é o caso do RU e do Fratello, não dão certo em grandes redes. Uma comida com perfil mais caseiro requer que se fique “de olho” direto. É preciso ouvir o cliente, acompanhar de perto todo o processo. Servir 500 ou 600 pessoas é algo complicado. Tudo tem que dar certo. As pessoas não podem sair mal atendidas. E isso exige dedicação. O cliente até compreende o erro do restaurante se percebe que o que houve não se trata de desleixo e que estamos prontos a corrigir a situação. Por essa razão não dá para assumir um monte de restaurantes e colocar algumas pessoas para tomar conta deles e não aparecer para ver o que está havendo.

Prata da casa – Uma das minhas preocupações é acordar a cada dia e fazer coisas boas, não prejudicar as pessoas. Não aceito desonestidade. Faço minha parte para que as coisas deem certo, seja na hora de descartar um papel corretamente, ou quando preciso usar o cinto de segurança. Se os outros não fazem algo, isso não significa que eu esteja autorizado a não fazê-lo também. Sou uma pessoa que quer acertar, que busca oportunidades e que tem clareza que é preciso dar limites ao trabalho, pois o excesso sempre é prejudicial. Alguém ambicioso em excesso não é uma pessoa feliz. Outra coisa que levo em consideração é privilegiar as compras em locais do meu bairro, em estabelecimentos menores, que eu conheço, que são da nossa terra. É preciso fortalecer o que é nosso, eu valorizo muito isso.

Resgate – Penso que é importante as pessoas se cumprimentarem mais, se expressarem mais. No dia a dia isso muitas vezes não acontece. São costumes que não deveríamos perder, ou que deveríamos resgatar. Muitas vezes exageramos no tamanho que damos aos problemas. Temos o hábito de dizer que as coisas estão erradas, mas a maioria é exagero de nossa parte.

Família – Tenho duas filhas. Uma delas, Greice, é estudante de Administração, tem 20 anos e já me ajuda nos restaurantes. A outra tem 15, e se chama Júlia. Está cursando o Ensino Médio. Minha esposa se chama Fátima e cuida do resturante Ramblas. Eu sou responsável pelo RU e pelo Fratello.

Política – Estou desiludido demais com a política. Ninguém é 100% correto, mas isso que está aí é absurdo, é demais. Todos os partidos, em alguma medida, têm se envolvido em escândalos. Na perco a esperança, até porque os jovens estão despertando suas consciências criticamente, mas a situação não está nada boa. Moralmente a situação no Brasil está péssima. É clara a falta de assistência às pessoas mais humildes, que mais precisam. Se um assalariado ficar doente, tem que contar com a sorte. Vou dar um exemplo: contratei uma cozinheira que tinha problemas cardíacos. Dois anos depois, quando foi chamada para uma triagem para realizar a operação, os exames que havia feito não valiam mais. Agilizamos novos exames e uma operação às pressas, para que ela recebesse o atendimento necessário. Agora ela está “encostada”. É disso que falo. É um descaso total. Há dinheiro para tantas coisas, mas para saúde, educação e segurança não há prioridade.

Incentivo – Agora está em funcionamento um sistema do ProUni através do qual o pessoal vem almoçar e jantar no RU. Penso que isso é fantástico. O aluno recebe a bolsa de estudos e a alimentação, algo fundamental. Coloco-me no lugar desse jovem que gostaria de fazer um curso superior, mas que não tem condições. É algo excelente que iniciou há cerca de dois meses.

Lazer – Gosto de pescar e jogar bola. Sempre que posso, faço essas duas coisas.

Religião – Sou católico “meio” praticante.

Sonho – Quero ser feliz, e isso inclui ter saúde, estar bem com minha família, ter algumas coisas que preciso e amigos. Conjugar tudo isso é um sonho que tenho. Para ser feliz, penso que não é preciso ter coisas “faraônicas”. É preciso que o dia a dia seja prazeroso, com um trabalho digno. Eu, por exemplo, não me vejo sem um trabalho. Deus me livre de ficar sem trabalhar. Claro que é bom ter qualidade no trabalho e poder tirar mais folgas, por exemplo. Todos querem trabalhar e ser reconhecidos. Comigo também é assim. Se eu faço um bom trabalho e alguém reconhece, isso me deixa satisfeito. Se alguém criticar, vou atrás para tentar resolver.

Unisinos – Para mim a Unisinos é tudo em termos de realização profissional. É aqui que eu e minha família investimentos nossas energias e dedicação.

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