Edição 361 | 16 Mai 2011

Teenagers: da informação ao conhecimento

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Patricia Fachin

Os Ys têm mais metas pessoais do que profissionais, querem trabalhar menos, ter mais liberdade e flexibilidade, constata Zilda Knoploch

Eles nasceram em um mundo tecnológico sem fronteiras, onde é possível ter acesso a qualquer lugar do mundo sem sair de casa. Apesar destas facilidades, os teenagers enfrentam uma necessidade maior de adaptação à vida real. Isso porque, segundo Zilda Knoploch, os Ys e os Zs vivem em um período de contradição em diversos aspectos da vida humana. Ela cita como exemplo a liberdade sexual em um mundo “assombrado pela Aids, onde a vivência desta liberdade não é mais possível como foi para os Baby Boomers”. Além do mais, as referências familiares não são as mesmas, as experiências pessoais são descartáveis e superficiais, refletindo na vida profissional. Esse paradoxo se reflete na “ansiedade constante por mudar de trabalho, de amizades, de relacionamentos, de atividades”, constata.

Mestre em Antropologia, Zilda estuda o comportamento dos teenagers, jovens da geração Y e Z, e enfatiza que, apesar de serem considerados “multitarefas” por usarem simultaneamente vários itens tecnológicos e bastante informados, “ainda não aprenderam como transformar esta hiperexposição embriagante em conhecimento”. Em função disto, a pesquisadora aposta na retomada de valores preponderantes em outras gerações. “Há movimentos cíclicos ao longo da história que nos mostram que, em certos momentos, os jovens sentem necessidade de retornar a alguns valores mais tradicionais, como forma de terem mais segurança”, aponta, em entrevista concedida à IHU On-Line por e-mail.

Mestre em Antropologia Social pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Zilda Knoploch é pós-graduada em Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM e membro da Enfoque Pesquisa de Marketing.

Confira a entrevista.


IHU On-Line – Como as gerações Y e Z lidam com o consumo?

Zilda Knoploch -
As novas gerações – aqui considero a geração Y, que hoje tem entre 18 e 30 anos, e a “@” ou Z como alguns a chamam, que é ainda adolescente, não está no mercado de trabalho, mas nas escolas – são gerações com mais poder em relação às marcas. Estes jovens são mais marketing literate, ou seja, conhecem mais sobre comunicação e são mais críticos em relação às mensagens que as propagandas lhes remetem. Eles não são diferentes das gerações anteriores no tocante a terem no consumo uma das suas formas de expressão. No entanto, eles interagem com as marcas, não desejam mais serem meros receptores de mensagens, como foram os consumidores da época anterior às redes sociais e às tecnologias de informação. Cada um dos jovens é potencialmente um formador de opinião. E isto afeta suas relações de consumo.


IHU On-Line – Quais eram e quais são hoje as principais diferenças entre as gerações? Percebe uma diferença mais acentuada entre as gerações de hoje e as de trinta, quarenta anos atrás?

Zilda Knoploch -
As principais diferenças entre estas gerações, como é o caso de qualquer outro período histórico, baseiam-se em dois conjuntos de circunstâncias: o contexto (social, econômico, político e tecnológico) e as suas aspirações, que são fortemente influenciadas por este contexto.

Assim, se olharmos os fatos a partir destes respectivos contextos, iremos notar que a geração X se caracterizou por um individualismo em função de terem metas em vez dos ideais da geração Baby Boomer, e assim o trabalho é a sua ferramenta para atingir um objetivo de estabilidade material. Esta geração já recebeu influência dos novos papéis feminino e masculino, que começaram a se redefinir a partir do advento da pílula anticoncepcional, que tornou possível a mulheres da geração anterior (Baby Boomers) decidirem se queriam mesmo ser apenas mães de família ou se desejavam controlar a vinda de seus filhos, para se tornarem mais realizadas no mercado de trabalho. Nesta geração, cresceu o número de divórcios e a adaptação a um mundo com famílias menos tradicionais fez parte do contexto.
Já a geração Y, que hoje está com 18 a 30 anos, vive uma necessidade ainda maior de adaptação. Além de viver num mundo mais violento do que seus pais viveram, as novas tecnologias nasceram quando eles estavam saindo da adolescência e eles passam a usufruir dessas vantagens na fase de “adultecência”, quando já estão com um pé na vida adulta, mas o outro, ainda não. Eles vivem a contradição de terem total liberdade sexual, mas num mundo assombrado pela Aids, em que a vivência desta liberdade não é mais possível como o foi entre seus avós, os Baby Boomers, livres para exercer sua sexualidade, e o faziam sem medo. Suas referências familiares já não são mais as mesmas. As famílias tradicionais já são exceção para esta geração. E os novos papéis femininos e masculinos estão trazendo muitas opções até para os relacionamentos. Estes últimos, cada vez mais superficiais e descartáveis tanto se exercitam na vida pessoal como na vida profissional: uma ansiedade constante por mudar de trabalho, de amizades, de relacionamentos, de atividades.

Sobre a mais nova geração @, há muito pouco ainda para sermos assertivos: eles ainda não saíram da adolescência e, sim, são nativos digitais: sua relação com a tecnologia é natural. Eles nasceram e cresceram junto com as tecnologias. E isto já faz toda a diferença em suas jovens vidas.


IHU On-Line – Em que aspectos elas se assemelham?

Zilda Knoploch -
Quando olhamos para os momentos em que estas gerações estavam na mesma idade, ou seja, quando eram crianças e ou adolescentes, o que há e sempre haverá em comum é a necessidade de construir sua identidade, de se desligar do domínio da sua família, criar sua independência. O que diferencia estas gerações, entretanto, é o contexto das famílias – maior ou menor tradicionalismo, relações de poder ou de autoridade – e as formas de que eles dispõem para exercer esta conquista de espaço pessoal, independência e sua própria identidade. Neste caso, a tecnologia tem tido um papel excepcionalmente diferenciador. Basta pensar nas formas que cada uma destas gerações tinha para se comunicar, se educar e vivenciar seu meio. Juventude da geração X: sem celular, sem internet, sem cartão de crédito, sem TV fechada, sem games; geração Y, como os itens anteriores, porém na sua maioria vivendo na casa dos seus pais até bem mais tarde, sem seu espaço privativo, o qual passaram a criar dentro da sua casa, no seu quarto, com sua TV, seus games, seus celulares. E a geração @, que chega com tudo isso à sua disposição, sendo, inclusive a que ensina seus pais e avós (das gerações X e Baby Boomers) a usar estes recursos.


IHU On-Line – Quais são os valores dos teenagers?

Zilda Knoploch -
Os teenagers de hoje ainda estão num processo de formar seus valores. Neste sentido ainda são muito influenciados pela geração anterior, Y, com a qual ainda dividem muitas características e, possivelmente, da qual absorverão ainda muitos dos valores. Estes teenagers são, igualmente, multitarefas, podem usar – e usam – simultaneamente vários itens de conteúdo e comunicação (TV, computador, celular, iPod). Mas com o fenômeno da convergência, eles tenderão a se expressar pela telas dos tablets. Eles são um tanto egocêntricos e autocentrados, um tanto exibicionistas e encontram nas redes sociais sua possibilidade de viver uma cultura de microcelebridades. Eles têm uma forma mais natural de sexualidade, estimulada pelo conteúdo a que são expostos, quase sempre sem supervisão dos seus pais. E esta nova sensualidade é uma das bases do sucesso de ícones como Lady Gaga , Shakira , e outros pop stars que entram em suas telas sem qualquer restrição. Eles são impacientes, como a geração Y, e acreditamos que serão ainda mais, pois sua noção de tempo e de velocidade, cunhada pela velocidade da internet banda larga, os torna mais exigentes e mais angustiados em consumir e produzir mais e mais informação: seja vídeos, fotos e diálogos em “real time”.

Por isto tudo, sua relação com seus avós, da Geração X ou Baby Boomer, causa a estes crescente angústia: o que posso ensinar para estes netos? Como entender o que eles falam? Como estabelecer um diálogo? Como traçar limites?


IHU On-Line – Quem são os heróis e os mitos destas novas gerações?

Zilda Knoploch -
Os heróis e mitos das novas gerações (Y e @) são as celebridades do mundo musical e dos esportes. Não são os políticos, nem os cientistas, nem os empresários. E o herói máximo (heroína) é a Mãe. Há uma crescente descrença em relação a figuras públicas, governantes, legisladores. Um vazio de lideranças. Um culto a realização rápida, sem tanto esforço, talvez com algum talento, mas não necessariamente. Vide as celebridades geradas pelo BBB.


IHU On-Line – Como as antigas gerações podem compreender e se comunicar com a juventude?

Zilda Knoploch -
Esta é uma resposta que vale muitos milhões de dólares, não é? Não há uma fórmula. Temos que acompanhar estas gerações através de pesquisas, como empresas vêm fazendo ao longo de pelo menos 20 anos. Hoje, ao pesquisar as várias gerações que convivem na nossa sociedade, observamos como elas se relacionam, e que desafios cada uma tem tido para manter um diálogo produtivo. Da mesma forma, as marcas precisam deste acompanhamento a fim de poder serem relevantes para estes jovens de hoje. E isto quer dizer: estabelecer conversas, diálogos, em vez dos monólogos que eram não só aceitáveis, como a única forma possível antes das novas tecnologias. E acompanhar como as tecnologias afetam estas relações, como venho fazendo e orientando muitos dos meus clientes no meio empresarial.


IHU On-Line – Como o comportamento das gerações X e Y refletem no mercado de trabalho? Quais os limites e as possibilidades dessa relação?

Zilda Knoploch -
As gerações X e Y são muito diferentes quando o tema é o mercado de trabalho. Há grandes conflitos decorrentes deste gap. Se para a geração X, a produtividade e a objetividade são valores predominantes para atingir metas, para a geração Y, as metas no trabalho não as sensibilizam. Eles têm mais metas pessoais, querem trabalhar menos, ter mais liberdade, mais flexibilidade. E, principalmente, não aceitam bem as hierarquias tradicionais no trabalho. Isto gera um imenso conflito no ambiente funcional e uma grande insegurança – por parte da geração X – de como lidar com estes jovens, que, em grande parte, têm excesso de autoconfiança e pouca noção de circunstâncias. Eles são, quase sempre, vistos como difíceis de liderar. Eles não querem lideres no ambiente de trabalho, nem querem liderar. Querem relações de igual para igual. Por outro lado, falta-lhes o conhecimento que a geração X detém, e este é o trunfo desta geração neste relacionamento delicadíssimo. Afinal, as empresas precisam destes jovens Y, pois eles serão os futuros gestores, quando a geração X começar a se retirar.


IHU On-Line – A senhora menciona que a sociedade ainda não assimilou como entender os teenagers, como entrar no seu mundo e projetar seu comportamento quando assumirem o papel adulto. O que podemos esperar desta geração nos próximos anos?

Zilda Knoploch -
Eles vão crescer e viver seus próprios desafios, de crescer num mundo mais dominado pela tecnologia, que deixa de ser vantagem competitiva, já que todos a dominarão. Eles vivem numa era que já classifico como a era do conhecimento, e não mais da informação. Os Y são superinformados, mas ainda não aprenderam como transformar esta hiperexposição embriagante em conhecimento. Creio que os atuais teenagers deverão se encaminhar mais nesta direção. Há movimentos cíclicos ao longo da história que nos mostram que, em certos momentos, os jovens sentem necessidade de retornar a alguns valores mais tradicionais, como forma de terem mais segurança. Isto já se delineia um pouco, ao vermos um movimento meio “retrô” em vários aspectos do consumo. A música é um deles (os jovens estão curtindo os Rolling Stones e Paul McCartney, sexagenários, junto de seus pais e avós). De toda a forma, vejo que o ambiente social como um todo (família, escola, empresas, política, economia) será afetado e afetará as novas possibilidades que a tecnologia disponibiliza às novas gerações, acelerando seu processo de educação, de informação, de formação e até, infelizmente, de deformação. Todos teremos que reinventar muitas das nossas práticas de relacionamento com os jovens, tanto no plano da família quanto nas outras instâncias da sociedade que estão em mutação a cada geração. Só reforço que tudo com eles é muito mais rápido. A sociedade, entretanto, em muitas coisas, como a infraestrutura, os programas educacionais, as ferramentas de inserção tecnológica, não tem se mostrado ágil e daí decorrem e decorrerão muitos abismos a serem vencidos.


IHU On-Line – Quais são as pretensões profissionais das novas gerações?

Zilda Knoploch -
Os jovens Y querem menos rigidez, mais liberdade, e não darão o sangue para crescer nas empresas como a geração anterior fazia. Eles são superficiais e impacientes e sua vida pessoal tem prioridade sobre a vida empresarial. Isto já causa grandes conflitos. A geração @ tenderá a aumentar este tipo de comportamento. Porém, à medida que vai encontrar superiores da geração Y, o conflito que hoje existe no ambiente de trabalho tende a ser menor. Vamos vivenciar cada vez mais trabalhos remotos, flexibilidade de horário, bancos de horas, remuneração baseada em cumprimento de metas e não de horário. O resto é um pouco de futurologia.

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