Edição 292 | 11 Mai 2009

Bolívia: um governo apoiado nos movimentos sociais

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Patricia Fachin | Tradução Benno Dischinger

Na opinião de René Cardozo, Evo Morales será reeleito sem contratempos. No entanto, “é preciso analisar é se ele obterá uma maioria mais ou menos ampla”, adverte

Em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, o jesuíta René Cardozo diz que a Bolívia vive atualmente “um profundo processo de mudanças políticas e econômicas”, mas não percebe no país “grandes convulsões sociais, como se via com relativa frequência nos últimos anos”. Apesar de consolidar um movimento forte e importante na política boliviana, Cardozo diz que os indígenas têm conflitos internos, “em sua maioria causados por ocuparem espaços de poder no Estado atual”. A política desenvolvida por Evo Morales mostra que “estão se abrindo espaços para a representação indígena, embora ainda seja em pequeno grau”, aponta.

Ao comentar a possibilidade de integração no continente latino-americano, René Cardozo destaca a importância de respeitar as diferenças entre os país. “Isso quer dizer que não se pode falar de um único modelo que se imponha a todos. Cada país tem sua própria realidade, seu próprio ritmo e seu jeito de integração”, ressalta. E ainda dispara: “O que se apresenta como muito complexo é igualar economias que são muito desiguais.”

René Cardozo é politólogo diplomado pelo Instituto de Estudios Políticos de Paris. Pároco de uma zona rural de Cochabamba, é o atual Provincial dos Jesuítas da Bolívia.

Confira a entrevista.

IHU On Line – Como caracteriza a situação política e econômica da Bolívia atualmente?

René Cardozo - Creio que vivemos um profundo processo de mudanças políticas e econômicas. São muitos os desafios com que nos defrontamos. De todas as formas, a Bolívia já não vive as grandes convulsões sociais, como vivia com relativa frequência nos últimos anos.

IHU On-Line – Quais são as políticas do governo Evo Morales?

René Cardozo - Foram principalmente a aprovação da Nova Constituição Política do Estado, a preparação das próximas eleições, um conjunto de políticas sociais e a nacionalização de recursos naturais e empresas estratégicas.

IHU On-Line - Como define os movimentos sociais na Bolívia? O que os torna fortes e atuantes?

René Cardozo - Creio que o governo de Evo Morales se apoia nos movimentos sociais. Por isso têm muita influência. Não se pode esquecer que nos últimos anos eles foram inclusive capazes de fazer presidentes renunciarem.

IHU On-Line - Quais são os conflitos internos entre os movimentos sociais na Bolívia?

René Cardozo - Creio que existem, sim, conflitos, em sua maioria causados por ocuparem espaços de poder no Estado atual.

IHU On-Line - Em que sentido a eleição de Evo Morales caracteriza um avanço ou um esvaziamento entre os movimentos sociais?

René Cardozo - Creio que Evo Morales representa significativamente o governo que surge de movimentos sociais bem organizados.

IHU On-Line - A opção de Evo Morales em abrir espaço no governo para novos atores sociais, como os indígenas, apresenta uma forma de mudança e nos permite pensar em efetivas transformações sociais em longo prazo?

René Cardozo - São mudanças muito profundas e, ao mesmo tempo, creio que sejam necessárias para um país como a Bolívia.

IHU On-Line - Qual é o significado político de mudar a lei eleitoral da Bolívia? O que isso significa para o país?

René Cardozo - Significa que estão se abrindo espaços para a representação indígena, embora ainda seja em pequeno grau. 

IHU On-Line - Quais são as perspectivas gerais de reeleição na Bolívia? Evo Morales tem forças para se reeleger?

René Cardozo - Creio que Evo Morales poderá ser reeleito sem contratempos. O que é preciso analisar é se ele obterá uma maioria mais ou menos ampla.

IHU On-Line - O senhor diz que, com a nova Constituição Federal, se ampliam as autonomias na Bolívia. O que significa essa autonomia para o país e que força tem o movimento que a ela se opõe?

René Cardozo - Na realidade, a Constituição é autônoma e não federal. Todavia, considera a Bolívia um Estado unitário no qual, porém, irão se desenvolvendo várias autonomias. O movimento autônomo tem, na Bolívia, um apoio majoritário.

IHU On-Line - De que modo a crise internacional repercute no país?

René Cardozo - A crise tem uma repercussão limitada, dado o tamanho restrito da economia. Sem embargo, onde a crise tem muita repercussão é na baixa dos preços de matérias-primas e no possível desemprego pela queda de vendas das empresas e a diminuição de ingressos financeiros para o Estado. 

IHU On-Line - Qual é o papel do vice-presidente Alvaro García Linera como intelectual nas políticas de Evo Morales?

René Cardozo – Trata-se de um contrapeso importante para um presidente indígena.

IHU On-Line - É viável a Alba?

René Cardozo - Creio que a Alba é, antes de tudo, um projeto alternativo a outros.

IHU On-Line - Nunca se falou tanto em integração latino-americana como nos últimos tempos. É possível falar de uma identidade comum na América Latina, que dê conteúdo a uma possível integração?

René Cardozo - Creio que deva ser uma integração que respeite as diferenças. Isso quer dizer que não se pode falar de um único modelo que se imponha a todos. Cada país tem sua própria realidade, seu próprio ritmo e seu projeto de integração.

IHU On-Line - A proposta de criar uma moeda própria da América Latina é considerável? Isso pode ajudar na integração do continente?

René Cardozo – A meu ver, pode ajudar para uma maior integração. O que se apresenta como muito complexo é igualar economias que são muito desiguais.

Leia mais...

>> Rene Cardozo já concedeu outra entrevista à IHU On-Line. Ela está disponível na página eletrônica www.unisinos.br/ihu.

Entrevista:

• Bolívia. A nova constituição é muito positiva. Publicada nas Notícias do Dia, de 06-01-2009.

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