Edição 290 | 20 Abril 2009

A equação público = privado é cada vez mais forte

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Márcia Junges

Facebook, Twitter, Orkut. No ciberespaço, essas ferramentas quebraram o conceito tradicional de tempo e espaço, e as mudanças que promoverão no jornalismo são enormes e profundas. Muitas delas, diz Pollyana Ferrari, sequer “foram assimiladas pelos veículos de comunicação”

As redes sociais que se formam na web a partir do uso de suportes tecnológicos como Facebook, Twitter e Orkut viabilizam as mudanças pelas quais o Jornalismo já passou e irá passar. Mudanças enormes, profundas, como define a jornalista Pollyana Ferrari na entrevista que concedeu por e-mail à IHU On-Line. “O fazer jornalístico virou de cabeça para baixo. Hoje, temos a utilização de diferentes elementos midiáticos computacionais em rede na produção de conteúdo noticioso, aliados à interação com o usuário, o que gera grandes desafios e oportunidades.” A respeito do hipertexto, considerado uma linguagem híbrida, a pesquisadora acentua que ele é “capaz de se revigorar a partir da dicotomia entre oralidade e escrita, tornando muito positivo este movimento de ruptura, que vários autores identificam como pós-modernidade”.

Professora na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), no departamento de Comunicação Jornalística, é graduada em Jornalismo por essa instituição. Cursou mestrado e doutorado em Ciências da Comunicação na Universidade de São Paulo (USP), com a tese A rizomática aventura da hipermídia - uma análise da narrativa no ambiente digital. É uma das organizadoras das obras Hipertexto, hipermídia (São Paulo: Editora Contexto, 2007) e Eu, mídia (Rio de Janeiro: Opvs, 2008).

Confira a entrevista.

IHU On-Line - Quais são as principais mudanças pelas quais o jornalismo já passou e irá passar por conta das novas plataformas digitais como os blogs e microblogs (Twitter)?

Pollyana Ferrari - As mudanças são enormes e profundas. Muitas ainda nem foram assimiladas pelos veículos de comunicação, mas já estão sendo viabilizadas pelas redes sociais da web. Há três anos, quem imaginaria que vídeos seriam parte de nosso cotidiano na Internet ao lado de textos? Há dez anos, quem cogitaria as câmeras digitais que nos permitem retratar, filmar, sem gasto com filmes, quando tudo é registrável? Há quinze anos, quem imaginaria que e-mail ou celular seriam assim tão parte de nós? O fazer jornalístico virou de cabeça para baixo. Hoje, temos a utilização de diferentes elementos midiáticos computacionais em rede na produção de conteúdo noticioso, aliados à interação com o usuário, o que gera grandes desafios e oportunidades.

IHU On-Line - De que forma essa cibercultura retroalimenta um novo fazer jornalístico?

Pollyana Ferrari - A sociedade atual move-se em torno das pessoas, das suas histórias, de seus costumes, suas experiências de vida, enfim, da informação individualizada. Naturalmente, o processo de comunicação está relacionado de modo íntimo com esse macromercado de seres humanos que precisam de informação e comunicação todos os dias, da mesma maneira que precisam do ar que respiram. É uma retroalimentação orgânica.

IHU On-Line - Qual é a característica da narrativa no ambiente digital?

Pollyana Ferrari - Devem ser narrativas jornalísticas multiformes e interativas, implicando diretamente nos formatos e gêneros jornalísticos. O jornalista precisa saber manejar e editar em plataformas que utilizem diferentes elementos midiáticos computacionais em rede (áudio, vídeo, animação), aliados à interação com o usuário. Além de levar em conta o surgimento de macro e micronarrativas locais.

IHU On-Line - Como a discussão sobre a não obrigatoriedade do diploma de jornalismo para o exercício da profissão se conecta com a amplificação das possibilidades de seu exercício na web através de ferramentas como o Twitter e os blogs tradicionais?

Pollyana Ferrari - Acho que essa discussão no Brasil é política e empobrecida, ligada a sindicatos, o que remete a uma visão envelhecida da profissão e não se discute a práxis jornalística, nem chegamos ainda nos meios digitais, infelizmente.

IHU On-Line - Esse fenômeno demonstra que as pessoas estão cada vez mais sequiosas de informação enquanto consumidoras, ou que querem ser elas mesmas as produtoras dessa informação?

Pollyana Ferrari - Acho que temos um misto dos dois mundos. Nunca se consumiu tanta informação, mas também temos os consumidores gerando muita informação. Do nosso lado, temos de ter todos os cuidados inerentes à profissão: checar muito bem a notícia, ouvir os dois lados e fazer o copydesk correto: tarefas que independem se a publicação é impressa ou on-line. Fora isso, o repórter precisa pensar no áudio, vídeo e fotos, o que no meio tradicional é feito por outros profissionais.

IHU On-Line - De que maneira o hipertexto se relaciona com a multiplicidade e fragmentação características de nossa sociedade contemporânea?

Pollyana Ferrari - Considerado uma linguagem híbrida, o hipertexto é capaz de se revigorar a partir da dicotomia entre oralidade e escrita, tornando muito positivo este movimento de ruptura, que vários autores identificam como pós-modernidade.

IHU On-Line - Ferramentas como o YouTube, Facebook e Orkut apontam para quais tendências a respeito da subjetividade e intimidade do sujeito? Em que medida tais recursos promovem a interação de redes sociais?

Pollyana Ferrari - Vou dar um exemplo que demonstra bem essa intimidade midiática e ao mesmo tempo uma exposição para o mundo. Mariana Santarém, 18 anos, estudante de Jornalismo da PUC-SP, não sai do Twitter. Ela (http://twitter.com/viiixxxen) discute suas impressões sobre o mundo e também dá dicas de maquiagem e links para o seu próprio canal no YouTube (http://www.youtube.com/user/viiixxxen), endereço que contabilizou 49.802 visitas até março de 2009. A equação público = privado se fortalece cada vez mais. Viiixxxen é conhecida no ciberespaço e isso a tornou garota propaganda do Boticário. A rapidez dessas ferramentas já ultrapassou o tempo euclidiano.

IHU On-Line - Que limites e possibilidades de sociabilidades vislumbramos a partir dessas tecnologias?

Pollyana Ferrari - Possibilidades mil. O Facebook, por exemplo, atingiu 200 milhões de usuários, enquanto o Twitter saltou de 600 usuários para 6 milhões em apenas 12 meses. O Brasil tem 41,3 milhões de telefones fixos e 151,9 milhões de móveis. Só vejo compartilhamento em escala ascendente.

IHU On-Line - É possível dizer que o espaço e o tempo merecem ser rediscutidos e novamente conceitualizados após a experiência dessas redes sociais? Por quê?

Pollyana Ferrari - No meu livro Hipertexto, hipermídia, digo que nos deslocamos do espaço euclidiano, como nos dizia McLuhan,  aflorando geometrias não-euclidianas nas redes sociais, já que a ambiência da cibercultura nos supre de sensações capazes de gerar um olhar distante (de fora) sob as diversas formas de leitura e interpretação visual de conteúdos colaborativos. O espaço tornou-se um rizoma, repleto de ramificações. A gente não percebe isso no dia-a-dia, mas o suporte não importa mais, o hardware não importa mais. Se usarmos um computador pessoal, notebook, celular, ir a lan house ou acessar o e-mail de uma geladeira inteligente, o importante é ter a informação ao alcance das mãos, onde você precisa, na hora em que precisa.

IHU On-Line - Até que ponto ferramentas como o Twitter se prestarão ao exacerbamento de informações, dando notícias que não são relevantes ao público leitor?

Pollyana Ferrari - Acredito que agora o leitor faz esse filtro, já que tem papel ativo no fluxo informacional. Nós que selecionamos o joio do trigo. Vou dar dois exemplos pessoais que mostram isso: eu seguia o G1 e o New York Times, mas ao perceber que as notícias entravam aos montes (automaticamente) e sem edição e critério, apenas uma ferramenta de replicagem das home-pages, parei de seguir.

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