Edição 275 | 29 Setembro 2008

Guimarães Rosa: um narrador do Brasil

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André Dick e Patricia Fachin

Para o crítico literário Flávio Carneiro, a presença do narrador nas obras de Guimarães Rosa faz a diferença

Escritor, crítico literário e roteirista, Flávio Carneiro fez mestrado e doutorado, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), e pós-doutorado, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Nessa rápida entrevista concedida à IHU On-Line, o professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), nos oferece sua compreensão sobre alguns aspectos da obra de Guimarães Rosa, e destaca que o escritor cria um personagem narrador, ou seja, “cria um bom contador de histórias, que te convida a ouvir o que ele tem para contar”.

Entre as obras de Carneiro, destacamos No país do presente: ficção brasileira no início do século XXI (Rio de Janeiro: Rocco, 2005) e A distância das coisas (São Paulo: Edições SM, 2008).

IHU On-Line - A obra de Guimarães Rosa, especialmente os contos a que ele chama “estórias”, se apresenta como metanarrativa.  Qual é a sua contribuição teórica para a literatura do século XXI?

Flávio Carneiro - O que se pode pensar como contribuição de Rosa para a ficção do século XXI é, sobretudo, uma aposta no narrador. Quem escreve às vezes se esquece disso, de que uma história precisa de alguém que a conte. O narrador de Rosa é que faz a diferença.

IHU On-Line - Grande sertão: veredas é um romance de muitos implícitos, alusões e citações de obras clássicas universais. Pensando-se que a fala de um jagunço é que conduz a narrativa, como isso se explica estilisticamente?

Flávio Carneiro – Ótima pergunta! É claro que Riobaldo jamais poderia ficar falando tudo o que fala, a um interlocutor para lá de paciente. Aqui fica claro que se trata de um artifício, de um jogo, para o qual o leitor é convidado. Rosa cria um personagem narrador – é isso que se deve lembrar sempre - quer dizer, cria um bom contador de histórias, que te convida a ouvir o que ele tem para contar.

IHU On-Line - Como você lê o pacto faustico entre Riobaldo e o demônio?

Flávio Carneiro - Acho que Riobaldo narra movido por um culpa - a de ter sido responsável pela morte de Diadorim. Riobaldo propôs um pacto com o diabo e esse pacto de fato se concretizou. Não de forma explícita (o diabo não assina promissórias), mas na forma que realmente vale. Riobaldo recebe o que pediu: vence o inimigo Hermógenes. Em troca, o diabo leva sua alma, que atende pelo nome de Diadorim. É aí, a meu ver, que o pacto se dá. E Riobaldo perde.

IHU On-Line - Conhecer o desfecho da obra não apaga para o leitor que venceu a fala
fragmentada de Riobaldo o encanto pela narrativa. O que está em jogo entre o jagunço narrador e Diadorim?

Flávio Carneiro - O mais importante da história, me parece, é a dúvida. Isso – a dúvida – é que move todo o romance. A história em si é banal, existe desde priscas eras, no ocidente e no oriente (quem não se lembra, por exemplo, do filme, do desenho Mulan?). Agora, o importante é o jeito de contar, e é nisso que o escritor faz a diferença.

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