Edição 266 | 28 Julho 2008

Eusébio Schneider

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Bruna Quadros

A trajetória profissional de Eusébio Schneider é alicerçada nos princípios e valores da Unisinos. Já são 35 anos de trabalho dedicados à universidade. Ao longo deste tempo, ele acompanhou os avanços e desafios da instituição. Alguns momentos foram de dificuldade, mas nem por isso ele pensou em desistir. Hoje, Eusébio, que é gerente do setor da Gerência de Registros Acadêmicos, “veste a camisa” da Unisinos e sonha em ver a universidade reconhecida e diferenciada. Ao contar a sua história de vida para a revista IHU On-Line, Eusébio não conteve a emoção, principalmente, ao falar da família e relembrar a infância humilde no município de Poço das Antas, quando não tinha nem calçados para ir à escola.

Origens – Nasci em Boa Vista, comunidade do interior do município de Poço das Antas. Nela, havia uma única escola, uma única igreja e não existia, na época, energia elétrica. Havia, também, um moinho que produzia energia para os municípios vizinhos mais próximos, e éramos um deles. A Escola Municipal Mãe de Deus, que ficava a 3 km de casa, contava com um único professor. Nós íamos a pé e descalços, porque não tínhamos calçados. Meus pais trabalhavam na roça. Eu via a dificuldade dele e dos irmãos mais velhos, por causa do sofrimento da vida árdua que eles levavam. Somos em 11 irmãos. Estou com 53 anos e sou o sétimo filho. Havia briguinhas em casa, mas também muita união. A minha mãe está com 87 anos e, quando fazemos churrasco na casa dela, se falta um dos filhos, ela pergunta o motivo.

Estudos - Naquela época, a gente lia a Bíblia e decorava o catecismo, além de falar em alemão no colégio. No primeiro ano de escola, se comemorava a primeira comunhão. Depois de quatro anos, a gente saía da escola. Não tinha prova de avaliação no colégio. Os pais iam à escola e verificavam se os seus filhos tinham condições de ler um texto da Bíblia. Depois disso, se passava para o ano seguinte. Lembro de um padre jesuíta, Jacó Melz, que nas reuniões de catequese, após a missa, perguntava quem gostaria de ser padre. Eu não tinha a intenção, mas levantei a mão e disse que queria ser padre, porque era a única forma de sair daquela comunidade e poder estudar. Em 1964, surgiu uma escola estadual na comunidade. Quando terminei a 5ª série, a conclusão do primário, já em 1967, eu não sabia o que fazer da vida, considerando que na região não era oferecido o Ginásio, etapa seguinte ao primário na estrutura do ensino da época. Precisaria trabalhar na roça, mas não queria isso. Então, sem a autorização dos meus pais, me matriculei novamente na 5ª série para o ano seguinte. Meu irmão mais velho não gostou, porque queria que eu fosse trabalhar na roça com ele. No entanto, o meu pai admitiu que eu continuasse estudando. Após cursar pela segunda vez a 5ª série, surgiu uma oportunidade e fiz o exame de admissão, para ingressar no Ginásio. Era uma semana de provas e trabalho no colégio, que também tinha produção agrícola. Aprovado no exame de admissão, em 1969 ingressei na Escola Normal Rural Estrela da Manhã, um internato, na cidade de Estrela, a mais de 30 km de distância. Mas para chegar até lá levava horas, com o ônibus da época. Fiquei quatro anos no internato. Morei na comunidade de Boa Vista até os 14 anos. Dos 14 aos 18 fiquei no internato.

Graduação e trabalho – Me formei na Unisinos em 1979, no curso de Tecnólogo em Processamento de Dados. Eu e um primo viemos para São Leopoldo. Meu primo era um bom datilógrafo: datilografava o jornalzinho do colégio. Quando fizemos o teste aqui na Unisinos, ele foi classificado e eu não. Precisava usar uma máquina elétrica, o que eu nunca tinha feito, até então, na vida. Fiquei três meses desempregado, em São Leopoldo. Foi uma fase difícil. Em 4 de junho de 1973, aos 18 anos, consegui emprego na Unisinos como arquivista. Para conseguir um colégio, foi difícil. Nós não conseguíamos vaga em um colégio público e não tínhamos dinheiro. Então, fomos para o colégio Pio XII, em Novo Hamburgo. Fui duas noites na aula. Na terceira, conseguimos uma vaga em um colégio estadual, em São Leopoldo. Comecei a trabalhar na Unisinos, fiz o segundo grau em São Leopoldo, no colégio Pedro Schneider, o famoso Pedrinho. Mais tarde, fui promovido a datilógrafo. Em 1979, me formei em tecnólogo em Processamento de Dados. Em 1989, terminei o curso de Economia. Em 1994, fiz o MBA da Unisinos, ainda em nível de extensão, e, em 2004, o MBA em Gestão de Negócios – Ênfase: Logística e Operações em Manufatura e Serviços.

Unisinos – Agora, no dia 4 de junho, completei 35 anos de trabalho na Unisinos. A universidade passou por várias fases, algumas difíceis, e também por tempos bons. Os anos 70 foram de crescimento. Em 1982, começou a entrar em crise, por questões econômicas e inflação alta. Caímos de 24 mil para 16 mil alunos. Depois, a universidade se recuperou de novo e teve outros momentos difíceis, de greves e planos econômicos. Agora, nos anos 2000, parece que a crise pegou mais forte ainda. A universidade sentiu a concorrência e custou para se dar conta e tomar as decisões mais adequadas. Meu sonho é vê-la de novo como ela já foi reconhecida. Hoje, com a reestruturação, eu me sinto mais útil e mais preparado e motivado para reconstruir esta Unisinos. Gosto muito de fazer gestão, de lidar com pessoas. Atualmente, sou gerente do setor da Gerência de Registros Acadêmicos. Faço o que eu gosto.

Família – Vim para São Leopoldo em 1973. Arrumei uma namorada aqui da Unisinos mesmo, e já são 25 anos de casado. Temos duas filhas: a Jéssica, de 23 anos, estudante de Direito, e a Jaluza, 18 anos, estudante de Psicologia. Dou todo o apoio a elas, para que seus sonhos se realizem. A família é uma instituição em crise, lamentavelmente. Entretanto, é a base, em termos de qualidade de vida. Nos momentos críticos, de doença, parece que os outros somem e só fica a família.

Valores – Meus pais me passaram a questão da moral, da ética, da honestidade, da responsabilidade. Foi uma educação bem rígida, de obediência. Rezava-se à mesa, com a família reunida. São bases que não esqueço. Passamos por muitas dificuldades: como falei antes, não tínhamos calçados, mas nunca faltou alimento, que a gente produzia na roça.

Sonho – Pretendo continuar trabalhando mais um tempo na universidade, para construir uma Unisinos cada vez melhor e ter o reconhecimento da comunidade como um todo. Além disso, vou primar pela minha família, para que todos se realizem com saúde e consigam fazer o seu futuro.

Lazer – Meu maior lazer é o futebol. Jogo futebol de salão duas vezes por semana. Gosto de assistir e torcer pelo meu time, o Grêmio. Também gosto de me reunir com a família e os amigos para um churrasquinho. Aprendi a pescar a pouco tempo e estou gostando cada vez mais. É um momento em que realmente esqueço do dia-a-dia.

Livro – Recentemente, li O líder do futuro, de Peter Drucker, e Como se tornar um líder servidor – O monge e o executivo, de James Hunter.

– Fui criado na religião católica. Hoje, não sou praticante assíduo, mas ainda sou desta religião. Tive algumas dificuldades até levar as minhas filhas a fazer a primeira comunhão e a crisma, mas consegui. Esta crença é a que mais me agrada até hoje.

Política brasileira – Em termos de política, nós estamos melhorando, gradativamente. Já vivemos o tempo da ditadura, depois houve a transição para a democracia. Foram anos difíceis, mas, atualmente, temos uma política mais adequada. No entanto, ainda está longe das nossas necessidades. Há muito que fazer, como, por exemplo, resolver a questão ética na política e a corrupção. Vamos viver da esperança que a gente ainda tem. Este país tem tudo para se desenvolver e se destacar. Meu sonho é vê-lo sem analfabetismo.

Instituto Humanitas Unisinos – O Instituto é um espaço de reflexão, o que é uma necessidade e um diferencial da Unisinos na formação. Ele projeta a própria Unisinos, ao tratar de assuntos atuais. Ler a revista IHU On-Line toda a semana é, praticamente, estar atualizado. O trabalho do Instituto é muito válido para a universidade e está atingindo os seus objetivos. Pena não haver um envolvimento maior dos funcionários e dos professores com o IHU.

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