Edição 262 | 16 Junho 2008

Nós sempre fomos ciborgues. Isso é da natureza da sociedade humana

close

FECHAR

Enviar o link deste por e-mail a um(a) amigo(a).

Graziela Wolfart e Márcia Junges

Desejamos ser máquinas e estamos reconstruindo nossos corpos, destaca Timothy Lenoir, filósofo da ciência da Duke University. De uma certa forma, sempre fomos híbridos, acredita

Em entrevista concedida pessoalmente, sobre sua conferência Biotécnica, nootécnica e nanotécnica. Os desafios para as ciências humanas, proferida em 27 de maio, dentro da programação do Simpósio Internacional Uma sociedade pós-humana? Possibilidades e limites das nanotecnologias, o filósofo Timothy Lenoir foi enfático: “Nós já somos híbridos. Algumas outras pessoas diriam que nós sempre fomos ciborgues, ou seja, sempre fomos híbridos de uma certa forma. Essa é simplesmente a natureza da sociedade humana. A sociedade humana criou e desenvolveu o humano, o desenvolveu em uma estreita combinação e diálogo com a tecnologia”. Para ele, “nós já passamos há muito da divisão homem/máquina”. O fato é que nós apenas não sabíamos disso. E ele continua: “Nós desejamos ser máquinas, estamos tornando a natureza em máquinas e utilizando processos naturais agora compreendidos como máquinas para reconstruir o corpo, reformá-lo”.
Lenoir é professor de História e catedrático do Programa de história e Filosofia da Ciência da Duke University, nos Estados Unidos. Possui extensa lista de publicações sobre a história da matemática no século XVII, história da biologia e fisiologia alemã no século XIX, sobre o impacto do uso da informática nas ciências, o conceito e implicações da tecnociência, e sobre a produção de materiais digitais para a pesquisa na área de filosofia e história das ciências. Entre seus temas de interesse atual, está a discussão da necessidade de se repensar um papel para as humanidades à luz dos grandes avanços tecnológicos, propondo o que chama de tecnohumanismo. De sua produção bilbiográfica, destacamos Política e templo da ciência. Pesquisa e exercício do poder no Império alemão (Frankfurt/Main: Campus Verlag, 1992) e Instituindo a Ciência. A produção cultural das disciplinas científicas (São Leopoldo: Editora Unisinos, 2004). Ele proferiu duas conferências no Colóquio Internacional Filosofia e Ciência: Redesenhando Horizontes, promovido em 2004 pelo Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Unisinos. A primeira teve como título Réquiem para o Cyborg, e a segunda, que encerrou o Colóquio, Inventando a universidade empreendedora: Stanford e a co-evolução do Vale do Silício.

IHU On-Line - O que o senhor entende por tecnohumanismo e como podemos associar esse conceito com as discussões acerca da nanotecnologia e do pós-humano?

Timothy Lenoir – Quando me refiro ao termo tecnohumanismo, parto da concepção de que tudo hoje é tecnociência. Antigamente, quando as pessoas faziam ciência, ela tinha alguma relação com a tecnologia. Hoje, contudo, a ciência é a tecnologia, ou seja, não existe distinção entre as duas. O objetivo dos cientistas é compreender as máquinas para que possamos fazer melhor. Isso mudou toda a noção de natureza de várias formas. Não há uma natureza independente lá fora: a natureza é fundamentalmente uma máquina. Para que pudéssemos entendê-la melhor, basicamente tivemos de transformar a natureza em uma máquina. Então, levar isso ao seu limite máximo seria o programa de nanotecnologia que Drexler  descreveu em sua fala neste Simpósio. Ele é um visionário, um tipo de promotor desse programa desde os anos 1980.
Em última análise, devemos controlar a natureza em nível submolecular, poder controlar a posição dos átomos, sua posição e organização, transformando-os em máquinas em diferentes níveis, diferentes custos, e assim por diante. Então, no meu modo de ver, o tecnohumanismo é um esforço para tentarmos entender as questões da humanidade, a mortalidade da alma, questões típicas do humanismo. O tecnohumanismo está tentando engajar a humanidade (ou as humanidades) nessa nova forma de ciência, ciência/engenharia, à qual eu chamo tecnociência.

IHU On-Line - Como o senhor acha que a sociedade recebe e lida com as novas tecnologias? Ela está preparada para os avanços da nanotecnologia?

Timothy Lenoir - Penso que todos nos tornamos entusiastas da tecnologia. Ninguém parece não querê-la. É como o ar que respiramos. De fantásticos dispositivos de gravação, passando por iPods nano,  computadores e praticamente tudo à nossa volta. Até na moda as pessoas estão usando nanotecnologia para fazer novos tipos de tecidos - tecidos que não mancham nem requerem costura. Você pode, inclusive, fazer materiais autoconstituíveis. Penso que as pessoas têm um grande desejo por tecnologia, em todo lugar. Não acho que seja apenas nos EUA, nem na Europa, apenas. Aqui no Brasil, e em outros lugares também, as pessoas desejam tecnologia. A questão é como tirar benefícios dela.

IHU On-Line – Quais são as principais implicações éticas da nanotecnologia?

Timothy Lenoir - Existem problemas parecidos com os de toda nova tecnologia, como o acesso e a disponibilidade desta tecnologia para outras pessoas. Nesse momento, os principais investidores em nanotecnologia são os militares. Para mencionar apenas um exemplo, lembro sobre o desenvolvimento de sensores de todos os tipos, cruciais para os militares. Eles estão envolvidos em desenvolver isso usando nanotecnologia, assim como na medicina. Mas acho que é muito importante se pensar não apenas nos benefícios econômicos que isso possa trazer, mas quais são os potenciais impactos sociais dessas tecnologias, quem se beneficia disso, quem precisa usá-las, ou decidir sobre quais tecnologias serão disponibilizadas? Isso traz junto alguns tipos de questões e responsabilidades éticas. Nós produzimos esse tipo de material? Sabemos que efeitos terão? Que tipo de controle e de regulação devemos ter sobre isso? Uma das preocupações é que haja um diálogo mais profundo entre as pessoas que produzem novas tecnologias e aquelas pessoas conseguem usá-las e promovê-las. Acho que o problema é que todos assistimos à televisão, nos tornamos entusiastas dessas tecnologias e as desejamos. Elas são máquinas de desejar e criam outras máquinas de desejar, nomeadamente nós. Precisamos estar conscientes disso e criarmos um diálogo sobre essas questões. Como fazermos isso é a questão difícil. Isso é importante: como orquestrar essa demanda com a sociedade. Trata-se de uma questão crítica.

IHU On-Line - Que mudanças podemos vislumbrar no corpo humano com a introdução das nanotecnologias? Como será o corpo do homem pós-humano? Será um ser híbrido?

Timothy Lenoir - De certa forma, já passamos por isso. Nós já cruzamos essa ponte; já somos híbridos. Algumas outras pessoas diriam que nós sempre fomos ciborgues, ou seja, sempre fomos híbridos de uma certa forma. Essa é simplesmente a natureza da sociedade humana. A sociedade humana criou e desenvolveu o humano, numa estreita combinação e diálogo com a tecnologia. De certa forma, eu discordo da forma com que Drexler caracteriza a nanotecnologia. É fantástico o que ele está fazendo, o que falou. No entanto, o que Drexler descreve é um universo muito mecânico, constituído por máquinas, no qual fazemos ferramentas que fabricam outros tipos de ferramentas, as quais se autoconstituem em outros tipos de máquinas. É basicamente pensar em tentar aplicar esse conceito de máquina à natureza e ao ser humano, e assim por diante.
Então, para mim, o que é realmente interessante na nanotecnologia que está sendo desenvolvida é que a mais precisa máquina que conhecemos é o ribossomo  dentro da célula. É um tipo de máquina que faz produtos muito precisos, proteínas, e moléculas que organizam o corpo. Esse é um exemplo para mostrar que, para se construir máquinas como as descritas (ribossomo), as pessoas estão controlando máquinas biológicas. Elas estão controlando máquinas celulares para que essas coisas funcionem, para criarem autoconstituição, para criar precisas organizações de/em nível atômico. O que está acontecendo é que estamos potencializando a biologia e a transformando em uma máquina. Costumávamos ter esse tipo de divisão natureza/cultura, natureza/humano, natureza/animal, humano/animal. O que está acontecendo é que essa divisão está sendo suprimida. Não há mais separação. Costumávamos pensar na natureza como se fôssemos uma máquina. E, quando usamos analogias do tipo “a máquina funciona dessa forma”, podemos usá-las como modelo para entender como as células e outras coisas funcionam.

A natureza como máquina

O que está acontecendo com a nanotecnologia é muito mais audacioso, um processo muito mais transformador do que parece, que pensa a natureza como já sendo uma máquina. Desse modo, melhoramos, nas máquinas, as falhas que poderíamos cometer. Só precisamos controlar as ferramentas da biologia. Essa é uma das coisas que está acontecendo. Acho que é interessante voltar à questão original, sobre o híbrido humano-máquina. Então, por exemplo, um cientista brasileiro muito famoso que trabalha na universidade em que atuo, a Duke University, Miguel Nicolelis,  fez interfaces cérebro-máquina. Isso é um exemplo de controle da biologia do cérebro para permitir que animais e pessoas – para propósitos beneficentes, para pessoas paraplégicas ou tetraplégicas – sejam capazes de pensar o que gostariam que seus membros fossem capazes de fazer e ter isso traduzido para um sinal de computador, e assim por diante.

Então, há essa integração acontecendo, entre a máquina e o cérebro de forma muito poderosa. Há outras tecnologias similares que as pessoas estão desenvolvendo. Estamos desenvolvendo interfaces maquínicas que então tornam-se parte do corpo. A maioria das pessoas diz: “Isso é fantástico, não tem problema: pessoas que têm problemas de visão agora podem colocar chips que as ajudem”. Mas há outras dimensões: “por que apenas restaurar a visão, por que não torná-la melhor? Por que não criar um chip que faça visão de infravermelho também?”, o que tem implicações militares óbvias se você for capaz de usar visão infravermelha para se movimentar por aí. Acho que a resposta à sua questão é: já passamos há muito da divisão homem/máquina, apenas não sabíamos disso. Parece uma coisa muito poderosa e controversa, mas o que estamos fazendo, nesse meio tempo, é criar uma nova ideologia, que afirma que sempre fomos ciborgues, sempre fomos máquinas, e isso facilita. Lembro aqui do que Deleuze  chama de “máquina de desejo”. Basicamente, o que estamos fazendo é criar máquinas de desejo: desejamos ser máquinas e estamos transformando a natureza em máquinas, utilizando processos naturais, agora compreendidos como máquinas, para reconstruir e reformar o corpo.

Um dos lugares mais poderosos em que se vê isso é nos esportes. As pessoas estão chateadas porque os atletas estão tomando dopping. Mas os atletas sempre fizeram qualquer coisa que lhes desse algum tipo de ligeira vantagem sobre seus concorrentes. Agora existem laboratórios onde as pessoas estão seriamente buscando vários tipos de neuromúsculos para implantes, vários tipos de coisas que estimulem os atletas a atingir maiores níveis de performance. Há discussões sobre formas de detectar o que as pessoas suspeitam que estará acontecendo nas Olimpíadas da China, onde haverá novos tipos de tecnologia genética dificilmente detectáveis e que permitirão que o corpo produza mais hemoglobina para um melhor transporte de oxigênio. Então, já estamos nesse nível, e a questão é “o que fazemos?”.

IHU On-Line - O senhor desenvolveu um projeto de aprendizagem com base em jogos, tendo em vista a Paz Virtual. Pode explicar um pouco melhor essa idéia que lhe rendeu o prêmio MacArthur?

Timothy Lenoir - Da última vez que estive aqui na Unisinos, eu falava sobre videogames feitos em mídia digital e a propriedade potencialmente transformadora dessas tecnologias, e alguém me fez essa pergunta aqui, o que foi muito bom: “Você não está se tornando mais do que um entusiasta, um apoiador? Você fala sobre essas tecnologias militares de modo que os usos militares estão ganhando tecnologia para melhorar suas habilidades. Você não está no processo de fazer isso se tornando um apoiador?”. Decidi que essa é uma pergunta muito importante. Ao longo dos anos, eu fiz muito mais pesquisas sobre esse tópico específico e me tornei realmente interessado na forma pela qual os militares estão aproveitando a forma com que outras pessoas estão modificando sua tecnologia e a apresentando. Então, o Hezbollah  desenvolveu sua própria versão – estudei todo esse game on-line gratuito, chamado America's Army [O exército da América], usado para recrutar pessoas para as forças militares dos EUA, mas que também tem a capacidade de determinar que a pessoa, enquanto jogador, participando desse game, qual papel militar melhor desempenharia, transformando isso numa maneira que mensure sua performance e os tipos de emprego em que você teria melhores habilidades nas forças militares. Da forma que você coloca o código na Internet, outras pessoas podem pegá-lo e criar uma modificação [mod] desse game. Então o Hezbollah tem sua própria versão desse mesmo jogo, com a qual eles treinam.

O que fazemos tem feito crescer o potencial de violência no mundo por espalhar essa tecnologia e por causa dessa natureza viral dessa tecnologia e da forma como ela funciona, de modo que as pessoas podem obtê-la, modificá-la, mudar seus propósitos etc. Para mim, em vários sentidos, isso está totalmente fora de controle. Acho que seria muito bom se pegássemos essa tecnologia e a usássemos para a paz. Então, a minha idéia era: por que não pegar essas tecnologias que estão tendo usos militares para treinar essas forças especiais para irem a lugares como Afeganistão e Iraque, conduzindo missões muito delicadas? Por que não pegar essa mesma tecnologia e mudar seu propósito, basicamente recodificando-a e reciclando-a para fazer paz e para a resolução de conflitos? Esse é o objetivo do programa.
Eu, na verdade, estou colaborando com a mesma empresa que fez o America's Army na construção desse recurso. E, como modelo, utilizamos o Furacão Mitch,  da Nicarágua. Temos um modelo para construir outros tipos de cenários de paz e resolução de conflitos.

IHU On-Line - Como o senhor percebe as possibilidades dos cientistas de modificar um embrião humano, criando um embrião híbrido (humano-animal)? Essas mudanças também compõem o novo mundo pós-humano?

Timothy Lenoir - Existem muitas fantasias sobre modificar o genoma. Um dos objetivos daqueles que trabalham no campo da nanotecnologia, na medicina, são realizados, em última instância, para racionalizar sobre por que devemos fazer isso para resolver doenças genéticas e todos os tipos de problemas. Não vejo muito futuro nisso. Acho que já estamos construindo híbridos. Existe, inclusive, a possibilidade de mesclar animais com humanos. Pegar seqüências de genes de animais que têm sucesso em vários tipos de coisas e integrá-los em nós. Quem sabe? Precisamos de programas muito complicados para compreender quais dessas possibilidades são válidas e o que poderíamos fazer, ou não. Devo dizer, contudo, que é muito complicado domar a natureza de forma que possamos predizer algo.

IHU On-Line - Quais são os principais aspectos que o senhor abordou na conferência do Simpósio?

Timothy Lenoir - Antes de ouvir Drexler no Simpósio, eu planejei uma certa fala e suponho que eu tenha que permanecer com ela. Entretanto, terei que fazer algumas mudanças. O tema da conferência é quais são os limites para o humano? Estive preocupado com isso recentemente. Como disse anteriormente, já somos ciborgues. Drexler e alguns outros cientistas falaram sobre a singularidade que está próxima. Em algum momento dos próximos 25 anos, eles predizem, como resultado do que está acontecendo na nanotecnologia e na informática, que a fusão entre nanotecnologia, biotecnologia e tecnologia da informação irá criar máquinas inteligentes. Já estamos confiando em máquinas inteligentes para fazerem muitos de nossos trabalhos. Essas coisas irão se tornar cada vez mais poderosas, e eventualmente elas precisarão decidir se ainda precisam de nós. Então, a singularidade é quando humanos se fundem com máquinas - é essa a idéia. Assim, no princípio, me perguntei se já havíamos feito isso, mas, por outro lado, há questões como: “O quão possível é isso?”, “isso é realmente possível?”, “o que queremos dizer quando pensamos sobre isso?”. Então, minha fala utilizou bastante tempo em busca da primeira singularidade. A primeira singularidade é a invenção do humano, para começar. Ou seja, na minha visão e linguagem, seres humanos são a única espécie que manipula simbolicamente espécies, o que possibilita a criação do “eu”.

Um novo eu

Uma das questões que cercam a pós-modernidade é a dissolução do “eu”. É uma questão que surge com a tecnologia moderna, e, particularmente, com todos esses dispositivos que estão ao nosso redor. Além disso, ela também está presente na forma com que cada vez mais nos integramos em ambientes inteligentes, em que máquinas interagem conosco. Existem muitas discussões, hoje, sobre como os jovens, pessoas da nova geração, podem escrever mensagens com 10 janelas de texto abertas e escutar a uma reprodução de áudio no Google, e todas essas coisas ocorrendo ao mesmo tempo. Estamos ou não sendo reprogramados? Estão ou não nossos cérebros se tornando diferentes de forma muito significativa? Uma das coisas que observo é que chegamos a um ponto em que todo novo regime midiático constrói um novo sujeito. Você pode endossar evidências disso nas sociedades não alfabetizadas, pessoas que não lêem nem escrevem. Seus cérebros são equipados de outra forma, têm neuroestruturas diferentes daquelas que lêem e escrevem. Então, escrever instala no cérebro seu próprio sistema, e a questão é se a nova mídia instala um novo tipo de sistema e o que acontece com o “eu”. Muitas pessoas celebram isso, de que estamos nos tornando múltiplos, “eu sou o eu que ‘googleia’”. Todas essas novas mídias estão nos construindo de novas maneiras.

Penso que o paralelo que estava fazendo antes é: há um limite? Há um limite na multiplicidade de “eus”? Ian Hacking  fez essa pergunta. No início, eu fui resistente à resposta dele, que fala da existência de um limite. Fui, durante anos, um entusiasta da tecnologia em busca do “ser múltiplo”, mas hoje eu me pergunto se há ou não limites para isso. O que ouvimos na ciência, nos anos 1990 e início dos anos 2000, é que o “eu” é uma miragem, uma espécie de construção artificial, e que não há realmente função para ele. Isto é, ele pode se tornar múltiplo ou desaparecer, o que seja, não há importância. A minha visão é diferente agora. Infelizmente, na minha fala no Simpósio, não chegamos a uma conclusão. Eu, no entanto, cheguei a uma, depois de escrever a fala. E passei muito tempo, desde que escrevi a fala, fazendo mais pesquisas sobre as várias opiniões dos neurobiólogos sobre a função do “eu” e se poderíamos ou não dispor dele e qual seria o seu significado nesses ambientes altamente midiáticos.

IHU On-Line – Você acredita que a nanotecnologia pode provocar uma nova revolução como a que vemos ultimamente com a escrita, a TV, computadores? Estamos nos encaminhando para algo maior?

Timothy Lenoir - Penso que nos encaminhamos para algo maior. Uma das coisas com as quais me decepciono e que gostaria de ter chance de me aprofundar mais é sobre o impacto social dessas nanotecnologias. Acho que já vimos isso na biotecnologia. Se você olhar para trás, para a História, uma das coisas que aconteceram na biotecnologia que tiveram sucesso, se nos focarmos em desenvolvimento, é o projeto do genoma humano e a idéia de seqüenciar os genes, e assim por diante. Então, essas coisas que podem se tornar digitais se tornam os focos da biotecnologia, se tornando o “caldo” da globalização. A biologia da revolução digital fez a biotecnologia conveniente para a globalização. É por isso que as multinacionais estão tão interessadas nisso. A nanotecnologia levará isso a algo ainda mais extremo. E a questão é: quais são as implicações sociais, as transformações sociais que resultarão? Muitas pessoas enxergam a globalização como apenas uma outra forma de ideologia de corporações multinacionais. Existem grandes corporações com base na Europa, nos EUA, em qualquer lugar, utilizando esses contatos para seus próprios propósitos. Mas, na verdade, me parece que as coisas vão em uma direção bastante incontrolável no momento. Afinal, essas redes globais têm transformado o Planeta diversas e imprevisíveis formas, e acho que devemos refletir sobre isso. Não penso que seja só uma questão de controlar o terrorismo. Também não acredito que essa seja uma direção compreensível. Uma questão fundamental, a meu ver, é que a nanotecnologia realmente amplia as oportunidades de controle, em níveis moleculares, pelo mundo todo, de uma forma um tanto quanto parecida com aquilo que vemos acontecendo na biotecnologia. Se essas coisas podem fazer interface com computadores e se tornar móveis através de redes globais, essas são as coisas que são produzidas? E estamos falando sobre fazer isso agora com tudo através da nanotecnologia. Esse é o tipo de revolução quantitativa que talvez possa se tornar massivamente qualitativa.

IHU On-Line – Você tem medo desse cenário?

Timothy Lenoir - Penso que não estaremos mais aqui quando isso tudo acontecer.

Últimas edições

  • Edição 552

    Zooliteratura. A virada animal e vegetal contra o antropocentrismo

    Ver edição
  • Edição 551

    Modernismos. A fratura entre a modernidade artística e social no Brasil

    Ver edição
  • Edição 550

    Metaverso. A experiência humana sob outros horizontes

    Ver edição