Edição 253 | 07 Abril 2008

Alexandre Rocha da Silva

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Graziela Wolfart

Ele tem apenas 36 anos, mas carrega um vasto currículo e experiências de vida. Alexandre Rocha da Silva, professor no PPG em Comunicação da Unisinos, conta sua história de vida na edição desta semana, trazendo sua visão sobre a política, arte, comunicação, e especificamente sobre a semiótica, sua principal área de estudos. Conheça a trajetória deste professor e jornalista, que acredita na força dos movimentos sociais.

Origens - Nasci em Capão da Canoa, por “acidente”. Meus pais foram passar o Natal na praia de Atlântida e eu os surpeendi nascendo de oito meses, no dia 26 de dezembro. Morei com a família até meus 18 anos, em Porto Alegre. Tenho uma irmã mais nova, minha mãe é professora de literatura e meu pai, engenheiro civil.

Formação – Minha formação foi predominantemente pública, exceto os quatro anos iniciais do ensino fundamental, quando estudei em uma escola particular. A partir da 5ª série, fui para o Colégio Militar. Na escola católica, aprendi a cultura cristã e me interessei pelas ações da Igreja junto aos movimentos sociais (era uma época em que a Teologia da Libertação ainda exercia forte influência). No Colégio Militar, fiquei mais disciplinado do que gostaria. Em contrapartida, aprendi muita matemática e muita física, o que foi, para mim, fundamental para os estudos de semiótica mais tarde no Mestrado. Hoje, avaliando tais experiências, sinto falta desse comprometimento que havia por parte da Igreja com os movimentos sociais e com o país, e considero um erro conjugar disciplina militar e educação. Em 1990, ingressei na UFRGS para estudar Comunicação Social e me formei em Jornalismo em 1995. Foi lá que, no segundo semestre, comecei a estudar semiologia. A descoberta da semiologia levou-me ao mestrado em Semiótica, aqui na Unisinos e, depois, ao doutorado em Comunicação Social, também na Unisinos. Fiz ainda um doutorado-sanduíche em semiótica na França e um pós-doutorado, também em Paris, em Audiovisual, que constitui atualmente meu objeto de pesquisa na Linha Mídias e Processos Audiovisuais. Estou investigando as teorias (ou projetos latentes de teorias) dos cineastas brasileiros sobre o audiovisual.

Mestres – Tive excelentes mestres neste período. Não poderia citar todos. Mas há uma em especial, que me acompanhou desde a graduação, que me apresentou à semiótica e que foi também minha orientadora de mestrado e de doutorado: a professore Ione Bentz. Se só pudesse citar um nome seria o dela. Mas também houve outros: na UFRGS, Christa Berger; na pós-graduação, Elizabeth Bastos Duarte, Norval Baitello Jr, Lúcia Santaella; na França, François Jost, que me acolheu e orientou e, lá também, alguns intelectuais a quem admiro e de cujos seminários pude participar: Jacques Derrida, Alain Badiou, Jacques Fontanille e Antônio Negri.

Militância – Ainda na Ufrgs, também fiz política, partidária (era simpatizante do PT) e estudantil. Fui coordenador geral da Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (ENECOS). Nesse período, os estudantes contribuíram com a formação do Fórum Nacional de Democratização da Comunicação. Mas o que mais me interessa, desde aquela época, são as capacidades de invenção dos movimentos sociais, e não suas formas institucionalizadas. 

Influências intelectuais – No início da minha vida estudantil, tive formação católica (com admiração pela Teologia da Libertação) e militar. Rompi com ambos os pensamentos quando entrei para a Faculdade e comecei a me interessar mais pontualmente por política. As leituras de Marx, de Rosa Luxemburgo, de Trotsky e de Althusser me encaminharam para outros rumos. Contribuí com o Movimento dos Sem-Terra durante um tempo. Embora eu fosse da cidade, achava (a ainda acho) o MST bastante importante para o País. Também me interessavam, já nessa época, os movimentos de minorias, fortemente influenciado pelo trabalho de Foucault. Me interessavam as minorias e as organizações sociais, mais do que os partidos políticos. Achava que ali havia algo novo surgindo no Brasil. Em certa medida, as marchas com o MST tinham alguma relação com o trabalho que a Igreja fazia. A Igreja Católica, naquela época, sobretudo com a Teologia da Libertação, tinha um papel social bastante importante, que, infelizmente, se perdeu nos últimos 20 anos. Também na faculdade, me aproximei de autores do pós-estruturalismo, como Deleuze, Foucault, Derrida, Barthes e Nietzsche, e isso me fez romper com o marxismo e com o trotskysmo.

Ingresso na Unisinos – Entrei na Unisinos para fazer o Mestrado em 1996. Depois, voltei para o doutorado em 1999 e para ser professor em 2003. Hoje, trabalho em um Grupo de pesquisa denominado Audiovisualidades, com as professoras Nísia Martins do Rosário e Suzana Kilpp. Efetivamente, continuo fazendo semiótica, uma semiótica pós-estruturalista, que tem como desafio abordar a problemática do audiovisual. Essa problemática é circunscrita pelo nosso grupo de pesquisa a partir de um conceito, o de audiovisualidades, que implica pensar o audiovisual em sua irredutibilidade a qualquer mídia (televisão, cinema, vídeo) e como devir de culturas.

Autores – Gilles Deleuze e Charles Sanders Peirce.

Livro – Para além do bem e do mal, de Friedrich Nietzsche.

Filme – Dos contemporâneos, Dogville, de Lars von Trier, e, entre os brasileiros, O dragão da maldade contra o santo guerreiro, de Glauber Rocha.

Nas horas livres – Há horas livres? Quando as invento, música, cinema, teatro, literatura e botecos. Gosto de conversas de bar.

Sonho – Poder fazer pesquisa de forma coletiva, em rede, com bons intercessores, e sem os critérios quantitativos impostos pelas agências que têm impedido, no Brasil, a produção de obras de fato fundamentais. Gostaria de ver essas obras sendo gestadas e apoiadas no país. Mas o que vejo, infelizmente, é o oposto. Estamos todos cada vez mais produtivos em termos quantitativos e, paradoxalmente, menos fundamentais.

Política – Acredito que o Brasil hoje esteja melhor do que jamais esteve, do ponto de vista da institucionalidade. Isto não significa que não reconheça os graves problemas que temos. Há 20 anos, seria impossível imaginar que o Brasil teria um presidente como Fernando Henrique e depois um outro, como o Lula. Pensando que nós tivemos ditadores, como o Médici, o Costa e Silva, incompetentes, como o Sarney, corruptos, como o Collor, e todos os bandidos que assaltaram o país desde o seu descobrimento, seria improvável imaginar que o Brasil conseguiria ter instituições tão seguras como as que tem hoje, e um presidente com a trajetória de Lula. Do ponto de vista político, o Brasil demonstra que é mais forte do que seus partidos. O que me preocupa, na política atual, é que os movimentos sociais que, para mim, são mais importantes do que quaisquer partidos políticos, ou qualquer presidente, hoje se vêem encurralados, de certa forma, pela imagem do Lula. Embora ele seja um avanço em relação ao nosso passado, também pode representar uma paralisia dos movimentos sociais para o futuro. O desafio do Brasil hoje é que os movimentos sociais imaginem que Lula e PT foram uma invenção histórica importante, mas que precisam ser superados.

– Considero as experiências religiosas como importantes produções da cultura. Entendo-as e as respeito como expressões de cultura. Penso que as igrejas deveriam produzir conhecimento nos seus termos (teológicos, por exemplo), assim como a ciência deveria desenvolver conhecimento nos seus termos. Minha crítica é quando uma tenta intervir no âmbito da outra, como ocorre, por exemplo, com a questão das células-tronco, por parte de muitas igrejas, ou no questionamento de dogmas, por parte de muitos cientistas. Muitas vezes, a ciência, preconceituosa com as religiões, não percebe que ali há descobertas e invenções muitos importantes que ela pode transformar em alvo de pesquisa.

Unisinos – Entre as universidades não públicas, a Unisinos é uma das melhores. Há aqui espaços de liberdade para se propor e para pensar coisas novas. É uma das poucas universidades não públicas que ainda respeita a produção de conhecimento.

IHU – Recebo o material do IHU e gosto do que divulgam. É um dos espaços da universidade que tem comprometimento com as questões comunitárias, sociais, com a produção do conhecimento. Penso, porém, que essas questões poderiam ser mais ampliadas, pois essa é uma preocupação da universidade como um todo. 

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