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Graziela Wolfart
“Cada experiência de linguagem é única, como deveria ser toda e qualquer concepção do divino”, afirma o crítico e escritor francês Philippe Sollers, em entrevista por e-mail à IHU On-Line. Para ele, a leitura intensiva do pensamento de Heidegger é absolutamente necessária para a compreensão do bem e do mal na literatura teológica. Philippe Sollers , autor de vasta obra, estudou na Escola Superior de Ciências Econômicas e Sociais, em Paris. No início da década de 1960, Sollers destacou-se como importante intelectual, empreendendo uma reflexão sobre a linguagem e suas relações com o real. Foi o editor da revista Tel Quel, referencial do pensamento estruturalista. No Brasil, foi publicada sua obra Sade contra o Ser Supremo (São Paulo: Estação Liberdade, 2001). A página pessoal do escritor é www.philippesollers.net
IHU On-Line - Quais são as principais limitações e desafios que a literatura teológica tem pela frente?
Philippe Sollers - A literatura teológica, como você diz, está agora encerrada e tudo o que pôde ser dito está agora concluído. É, pois, preciso estudá-la e relê-la segundo uma restrita perspectiva histórica. Dito isso, aceito prazerosamente que se leiam meus romances como romances teológicos estrangeiros, no sentido em que Ernst Jünger emprega esta expressão.
IHU On-Line – Qual é o poder de persuação da literatura teológica?
Philippe Sollers - É um poder considerável, do qual se apossam infelizmente os clérigos para diluir sua força.
IHU On-Line - O senhor pesquisa as diversas formas literárias. Qual seria a especificidade da literatura no caso de obras teológicas?
Philippe Sollers - A grande literatura teológica encontra-se principalmente na poesia. Aqui basta você recorrer à Divina comédia, de Dante Alighieri . Evidentemente, todas as formas de misticismo, incluindo aquelas que não encerram necessariamente um acesso a Deus, devem ser estudadas. Aliás, eu erro falando de misticismo, como o prova o pensamento chinês fundamental.
IHU On-Line - A literatura do cristianismo pode ser considerada uma referência literária?
Philippe Sollers - A literatura do cristianismo é, naturalmente, considerável. Ela comporta uma biblioteca onde me permitirá preferir Pascal e Rimbaud (Uma estação no inferno).
IHU On-Line - Como o senhor considera que foi registrada na literatura a ideologia neoreligiosa da Revolução Francesa (o culto de Ser Supremo)? Qual é a contribuição da literatura para a fixação deste novo paradigma?
Philippe Sollers - Eu indico a vocês aqui o meu livro Sade contra o Ser Supremo, que aborda exatamente esta questão. Esta invenção “revolucionária” foi, como vocês sabem, de Robespierre e foi bem depressa abandonada nos fatos, mas não nas cabeças. Trata-se de uma extravagância como aquela do calendário revolucionário que deveria ter substituído o calendário cristão, o qual, salvo engano, ainda é hoje empregado em todas as transações econômicas.
IHU On-Line – De que maneira vê a importância das cartas e dos manuscritos enquanto documentos literários, para a constituição de uma literatura específica na área da teologia?
Philippe Sollers - As cartas e os manuscritos são da mais alta importância histórica e, para citar apenas este exemplo, a vida e a obra de Santa Teresa de Ávila o prova amplamente. Você lerá, em breve, uma obra fundamental de Julia Kristeva sobre esta santa espanhola católica e doutora da Igreja.
IHU On-Line - Como o senhor vê que o bem e o mal estão retratados na literatura teológica?
Philippe Sollers - Seria, enfim, preciso ler Para além do bem e do mal, de Nietzsche, como também toda a sua obra, como ultrapassagem simultânea da teologia e da filosofia. Indico aqui o meu romance Uma vida divina (Paris: Gallimard, 2006). Ou seja, a leitura intensiva do pensamento de Heidegger é aqui absolutamente necessária.
IHU On-Line - Qual é a sua opinião sobre a forma como Deus, ou o Ser Supremo das religiões é descrito nas obras literárias teológicas?
Philippe Sollers - Cada experiência de linguagem é única, como deveria ser toda e qualquer concepção do divino. No infinito, todo ponto é infinito e desenvolve sua própria forma.