Edição 247 | 10 Dezembro 2007

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Thiago Ponce de Moraes

Editoria de Poesia

O poeta Thiago Ponce de Moraes nasceu no Rio de Janeiro, em 1986. É um dos editores da revista eletrônica Confraria do Vento (www.confrariadovento.com) e estuda literaturas inglesa e norte-americana na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), pesquisando, junto com o professor Marcus Alexandre Motta, questões de artisticidade na Arte de Fernando Pessoa. Além disso, escreve, diariamente, em www.thiagoponce.blospot.com.
No ano passado, ele lançou seu livro de estréia, Imp. (Rio de Janeiro: Caetés). À primeira vista, a poesia de Thiago, como o título de seu livro, pode causar apenas estranheza. Mas não só. Thiago é um dos poetas da atualidade que melhor manejam o corte no verso, numa profusão de elipses, revelando isso claramente no poema “Disto hei”: “Corte sinestésico / Elíptico / Transcendente / Eclipse improvisado / / Claro frescor / / Cataclismo novamente”. No entanto, ele não apresenta palavras e versos soltos, mas, sim, trabalha com o espaço na página como Mallarmé, com suas “constelações de palavras”. O trabalho gráfico cuidadoso de sua obra mostra um apurado olho para entender os ganhos da poesia moderna, experimental, que vai de Mallarmé, cummings e poetas concretos ao trágico Paul Celan. Seus poemas, ao mesmo tempo, apesar de lidarem com uma metalingüística, não são separados de um traço empírico em que o sujeito se sente, constantemente, abalado pelo mundo que o cerca. As  indagações que a linguagem fornece são o que movimentam este poeta, até a partir de um personagem literário, como em “A Werther” (da obra de Goethe): “Bosque coalhado de rocio / Campo tão fresco / À nossa volta / Corpulentas nogueiras dissipando / Mergulham sombra em sombra / Até calar”.
Com isso, a questão do discurso é vital para entender os caminhos de Thiago Ponce. Ele fratura o discurso linear, num poema como “Como se fosse ontem”, e, assim, remete aos cortes de Paul Celan, impedindo uma leitura linear: “Tua melodia – teu /silêncio, / silêncio. Uma canção / se toca / de outra – mesma / tua, / a tua / não se ouve, / ouves”. Ou em “Alheamento”: “Aqui jaz sob / Sono de / Retorno algum. / / Aqui jaz. / Folhas / Ao longo e ao largo / Sonhas / Simples números, traços, coisas / Simples”. Ao mesmo tempo, esse discurso é baseado, muitas vezes, em impressões corriqueiras, em poemas onde Thiago parece se aliar à poesia marginal – mas sem cair no chiste, que apenas diluiria Oswald e Cacaso, num poema como “Opus citatus”: “Não há / Dúvidas: / / Toda dúvida que / Há / É pensamento”. Suas imagens são bem construídas e, além da contorção lingüística empregada, investem numa musicalidade, às vezes implícita, outras vezes quase barroca, a exemplo do que ocorre no poema “Irrigar o rio”, dedicado ao poeta gaúcho Carlos Besen. Nele, podemos ler os seguintes versos: “Se ilumino lâmino, simulo, / Um flúmen também é lírio: / / Mesmo que azul / Ou não azule, mesmo que / Sem fórmula, só flâmula, deságüe / Em desigual revide, é lume, silêncio / firme, feição devolvida, estado em riste. / / O rio já é lar, semente furtada, páramo, pálpebra: / / Sua intenção de sombra, / Pluma de brasa, seu argumento / Nítido em caules d’água”. Uma musicalidade que podemos perceber também claramente em “Sensório”, com sua pauta aliterativa: “Sopro / Sempre sopro / / Sopro sempre / Segue / Sabor / Silepse / Símile / Sem saber / Sensação / Semprecisar”. A seguir, leia dois poemas que Thiago enviou especialmente à IHU On-Line.

 

A si disseste enquanto nada
 
 A si disseste enquanto nada:
 – Íntima figura do
Divino, desiste da forma
Desta extinguível língua.
 
Quando o silêncio volte,
Relutante, também haja, talvez,
Além da água puríssima que
A terra inunda, algo, ou
Alguém, que a origem funde.



Detalhe de 1849: um outro outubro

Nunca a ti eleves. A alheia vontade, inda que falha,
Cumpras por própria e tua face te não deixe.

Ninguém te dá quem és. Nem tua face ao perdê-la
Sabes para a nula foice deste gesto de talhá-la.

Sucede o que acontece em acontecer-te neste
Negro instante que de entre os sonhos ergues.

A veracidade plena, súbita de estar entregue
Novamente a nada e sem rogar verdade alguma,

Emudece o desígnio com palavras só de ti intelecto.

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