Edição 231 | 13 Agosto 2007

Andréa Brächer

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IHU Online

A vida de Andréa Brächer, publicitária e professora de fotografia na Unisinos, é marcada por muitas experiências pessoais e profissionais. A mais emocionante, e que a mantém em contato com a infância, aos 37 anos, é a de ser mãe. Os gêmeos Artur e Mariana, de 3 anos, são muito mais do que filhos. São fontes de inspiração para o trabalho de Andréa no doutorado, que consiste em um resgate da própria infância através do contato com o universo infantil. A arte de revelar as emoções em imagens está presente em sua vida desde o início dos estudos acadêmicos. No entanto, hoje, a maternidade a fez mudar o foco de suas fotografias. Conheça um pouco mais desta gaúcha, descendente de alemães e austríacos, por meio dos relatos de vida contados com exclusividade à revista IHU On-Line.

Origens - Sou natural de Porto Alegre e sempre morei lá. Minha mãe é de Cachoeira do Sul e meu pai nasceu em Berlim, na Alemanha. Veio para o Brasil com a minha avó, quando criança, depois da Primeira Guerra Mundial, somente com a roupa do corpo. Eles venderam tudo o que tinham e, mesmo assim, tentavam pegar o navio para o Brasil e não conseguiam. Minha avó costurava muito, mas o dinheiro para comprar a passagem não era o suficiente, devido à alta inflação no período. Eles passaram por algumas dificuldades, comeram banha de baleia, porque não havia manteiga, e o pão era feito com serragem de madeira. A família da minha mãe é de descendência austríaca. Como boa parte dos imigrantes no Rio Grande do Sul, trabalhavam com agricultura e pecuária. Meus pais se casaram já com bastante idade, e, quando me tiveram, minha mãe tinha 43 anos, e meu pai, 53. Minha mãe era dona-de-casa, e meu pai, corretor de imóveis. Sou filha única e as pessoas com quem eu mais convivia eram minha mãe e minha madrinha, que mora conosco até hoje, também está com 91 anos.

Infância - Fui para a escolinha muito cedo, aos três anos. Um dia, meus colegas me chamaram para ver algo dentro do armário e me trancaram lá. Nunca mais me esqueci daquilo e, por conta disto, até hoje tenho medo do escuro. Tento compensar o trauma com a idéia da fotografia. Depois de um certo tempo, convivendo com outras crianças, passei a aprender as malandragens.

Relação com os pais - Minha relação era e ainda é muito boa. Meus pais eram muito severos. Meu pai, que hoje está com 91 anos, sempre esteve presente em qualquer coisa que eu fosse fazer, inclusive nos momentos que eu não gostaria que ele estivesse, como, por exemplo, nas festas, quando ele me levava e me buscava. Até os 15 anos, eu tinha que voltar à meia-noite para casa. Ele ficava me esperando na porta da festa até eu sair. Não podia dormir na casa de nenhuma amiga nem voltar de carona.

Vida escolar e ingresso na Universidade - Eu era muito dedicada na escola. Era natural eu estudar e tirar boas notas. Nunca fui premiada por isso, mas sentia orgulho em ser uma boa aluna. Quando estava no 2º Grau, queria fazer muitas coisas. Entre elas, ser missionária na Índia, professora, arquiteta. Fiz vários testes vocacionais e nada me agradava. No vestibular, optei pelo curso de Turismo, na PUCRS, e Relações Públicas, na UFRGS. Passei nos dois e preferi fazer Relações Públicas. Não me encontrei muito no curso. Então, fiz vestibular para Publicidade e Propaganda. Comecei em 1987, aos 17 anos, e me formei em 1991. Ao mesmo tempo em que cursava Publicidade, fazia disciplinas de Artes Visuais. Fiz muitos estágios em várias áreas da Comunicação. Fui locutora e produtora na rádio da Universidade de um programa chamado Por volta do meio-dia, que existe até hoje. Desde que fiz a disciplina de fotografia, fiz muitas fotos. E, por ser uma atividade ligada com as Artes Visuais, fui cada vez gostando mais. Quando terminei Publicidade, me arrependi de não ter feito artes visuais e, mais tarde, fiz mestrado nesta área. Agora, estou fazendo doutorado em Artes Visuais, na área de concentração chamada Poéticas Visuais.

Experiências profissionais - Logo que saí da Faculdade, trabalhei em uma empresa que fazia fotos à moda antiga. Depois, passei em um concurso para a Secretaria de Cultura do Rio Grande do Sul e trabalhei na Casa de Cultura Mario Quintana, no Instituto Estadual de Artes Visuais. Passei em outro concurso e fui trabalhar no Tribunal Regional do Trabalho. Já não estava mais ligada à área de artes, mas estava voltando a estudar, me preparando para o mestrado. Também trabalhei na Assessoria de Comunicação do Tribunal Regional do Trabalho. Depois disso, comecei a dar aulas. E, entre trabalhar na assessoria e dar aulas de fotografia, preferi as aulas.

Fotografia - Além de ser um meio que pode ser útil nas áreas da Comunicação, a fotografia é muito importante na vida de todos. Desde a descoberta, ela passou a ser algo que nos ajuda a reconstruir ou recuperar a nossa memória, ou recontar a nossa história. Embora a gente possa trocar a maneira de visualizar as imagens, se fossem em chapas antigas, de prata, vidro, papel ou até mesmo no celular, ainda continuamos carregando as fotos dos entes queridos conosco.

Família - Casei em 1994 e morei durante um período de tempo em Fraiburgo, Santa Catarina, conhecida como a Capital Nacional da Maçã. Meu marido trabalhava com a exportação da fruta. Em 2004, tive um casal de gêmeos, o Artur e a Mariana. Fiquei dois anos de licença para ficar com eles e iniciar o meu projeto de doutorado, que fala sobre a amnésia da infância. Me pergunto se, como mãe e artista, não tenho como recuperar um pouco da criança que eu fui, através da convivência com eles. Nesses anos de trabalho, meus filhos são minha fonte de inspiração para a vida e, também, para o projeto de doutorado.

Maternidade em dose dupla - Ser mãe de gêmeos não foi um susto. Devido aos tratamentos que fiz, poderia ter tido mais filhos. A felicidade de ter filhos, quando a gente deseja, independente de quantos sejam, supera qualquer outro tipo de susto. Como eu era mãe de primeira viagem, dizer que era uma ou duas crianças não fazia diferença, porque não sabia o trabalho que ia dar. É uma experiência bastante gratificante, principalmente porque acompanho o crescimento de duas crianças que são gêmeas, mas, ao mesmo tempo, diferentes. Meu trabalho está muito conectado à minha experiência materna. Foi a partir deste momento que eu mudei o objeto das minhas fotografias e passei a pensar sobre o universo infantil, que é o universo deles misturado ao meu.

Lazer, filme e livros - Minhas horas de lazer são dedicadas aos meus filhos. Aos finais de semana, tento não trabalhar. Assisto a desenhos, leio histórias infantis e saímos juntos para fazer algum tipo de programa. O último filme que vi no cinema foi o infantil Ratatouille. Lia muito quando criança, e ainda leio muitos livros ao mesmo tempo. Estou retomando um que se chama Fadas no divã, de Diana e Mário Corso. Foi desta obra que surgiu a luz para guiar o meu trabalho de doutorado. O livro faz uma análise de contos de fadas, histórias em quadrinhos e livros dedicados às crianças, sob o viés psicanalítico. Nele, estava a passagem que fala sobre a amnésia da infância, que me fez pensar sobre esta etapa da minha vida. Quando cai um livro ou uma revista na mão, interrompo tudo e começo a ler. As pessoas falam e eu não dou muita bola, pareço estar abduzida pelo livro.

Emoções - Já vivi muitos momentos felizes, mas o mais importante foi o nascimento dos meus filhos. Uma grande tristeza foi perder o meu amigo Paulo de Tarso Dresch da Silveira no desastre com o avião da TAM, em julho. Ele era advogado e professor universitário, colega de faculdade do meu marido e nosso padrinho de casamento, além de ser um excelente amigo.

Sonhos - Tenho muitos sonhos. O atual é receber o aceite de uma universidade da Inglaterra, para que eu possa fazer meu estágio de doutorado.

Política brasileira - Sou uma pessoa um tanto negativa em relação à política. Desde que comecei a votar, sempre optei por candidatos ou partidos que defendam as causas ambientais, uma das grandes discussões do nosso século. Me entristece muito o que aconteceu com o avião da TAM e o descaso com que certas coisas são tratadas neste país. É triste ver a maneira com que os políticos se portam diante de uma tragédia que afetou muitas pessoas, tanto as que morreram quanto as que sentiram a tristeza de perder alguém de forma tão estúpida.

Unisinos - É uma universidade que tem se preocupado com questões de ponta, em termos de ensino e de meio ambiente. É, também, respeitada em todo o país pelo trabalho de pesquisa e cursos de graduação e pós-graduação. Gosto muito dos alunos que tenho. Trabalho aqui desde 1999 e me sinto respeitada em exercer minha profissão aqui.

Instituto Humanitas Unisinos - Conheço pouco o Instituto, mas gostei bastante da revista IHU On-Line. Acho interessantes os assuntos abordados. A idéia de trazer professores e funcionários da Universidade para conversar, contar seus relatos de vida, é uma maneira de fazer os colegas conhecerem um lado que não está contabilizado no currículo Lattes, nosso lado “todo dia”, que nos move pela vida.

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