Edição 230 | 06 Agosto 2007

Novos arranjos familiares: qual é papel do pai na família contemporânea?

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IHU Online

Para a psicóloga e professora da PUC-Rio, Andréa Seixas Magalhães, na contemporaneidade, a “paternidade tem sido permanentemente desafiada”. Ela explica que os diferentes arranjos familiares, constituídos nos últimos anos, estão contribuindo para as transformações no exercício da paternidade. Ela  também destaca que as vivências atuais, entre pai e filhos, influenciarão e “moldarão os modelos paternos futuros”.

Andréa Seixas Magalhães é mestre e doutora em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Atualmente, Andréa é membro efetivo da Sociedade de Psicoterapia Analítica de Grupo do Estado do Rio de Janeiro – SPAG-E RIO.

Andréa concedeu a entrevista a seguir, por e-mail, à IHU On-Line. Confira:

IHU On-Line - Quais são as implicações e desafios do exercício da paternidade atualmente? Há diferenças entre o pai de uma família monoparental, biparental ou reconstituída?
Andréa Seixas Magalhães -
Considerando as mudanças aceleradas e fluidas da sociedade contemporânea e a transformação dos padrões tradicionais familiares, parâmetros de referência para o desempenho dos papéis parentais nas décadas anteriores, a paternidade tem sido permanentemente desafiada. Os diferentes arranjos familiares da atualidade, famílias monoparentais (feminina ou masculina), biparentais (hetero ou homossexuais) e reconstituídas, impõem transformações no exercício da paternidade. Nos múltiplos arranjos familiares encontrados, as regras familiares, os valores, os modos de expressão dos afetos, a hierarquia, assim como as metas familiares, constituem-se diferentemente. Ressalto que o tipo de arranjo familiar não determina a possibilidade de criar filhos emocionalmente saudáveis. Contudo, as diferentes condições familiares influenciam o modo de exercer a paternidade.

IHU On-Line - Após o divórcio, como fica a relação entre pai e filhos? O pai divorciado ganha uma nova função na sociedade contemporânea?
Andréa Seixas Magalhães -
Na sociedade contemporânea, o pai divorciado freqüentemente enfrenta a dificuldade de manter um contato mais próximo com os filhos (nos casos em que não tem a guarda dos filhos) e vê-se diante da necessidade de desenvolver tarefas que, anteriormente, eram atribuições da mãe. Por outro lado, os homens contemporâneos já vêm desenvolvendo habilidades que, na sociedade tradicional, eram quase exclusivas das mulheres. Uma das funções mais importantes do pai divorciado é fortalecer o vínculo parental, mantendo uma relação afetiva, íntima e segura com seus filhos.

IHU On-Line - Com a separação conjugal, muda também a concepção de família e de parentalidade?
Andréa Seixas Magalhães -
Enfatizamos que a separação conjugal dissolve o subsistema conjugal, mas o subsistema parental, embora sofra alterações, não deve ser dissolvido. Isso quer dizer que temos ex-marido e ex-mulher, mas não há ex-pai e ex-mãe. Os papéis parentais devem ser preservados no sistema familiar. Com a separação conjugal, freqüentemente, a comunicação entre os pais muda e os afetos também. Mas os pais necessitam compartilhar decisões importantes sobre a criação dos filhos, sobre projetos e metas educativas, assim como estar presentes em muitos momentos importantes da vida desses. A vivência da separação conjugal, sem dúvida, altera a concepção de família dos membros familiares envolvidos, sobretudo pais e filhos.  

IHU On-Line - Alguns especialistas dizem que o contato dos filhos com o pai é importante para que a criança construir sua identidade. Como fica essa questão da construção da identidade numa sociedade em que nem sempre os filhos são criados pela figura paterna?
Andréa Seixas Magalhães -
A construção da identidade depende de inúmeros fatores. A relação com os pais é um dos fatores mais importantes desse processo. O fato de não ser criado pelo pai não elimina a figura paterna na criação. O pai pode ser muito presente na criação dos filhos, dentro e/ou fora de casa. A qualidade da relação parental não é medida pelo tempo de co-habitação. A convivência é um fator importante, na medida em que o compartilhamento de experiências é necessário para a consolidação do vínculo. Ademais, outras pessoas emocionalmente significativas para a criança também participam nesse processo de construção da identidade.

IHU On-Line - Se o pai é visto como referência na concepção do universo masculino, como a masculidade pode ser construída numa sociedade sem pai?
Andréa Seixas Magalhães -
Considero que, na sociedade contemporânea, há uma série de transformações nas noções de masculinidade e de paternidade. Contudo, discordo da idéia de uma “sociedade sem pai”. O pai continua sendo uma referência importante de masculinidade. Ressalto, ainda, que a construção da masculinidade também é transmitida pelas mães, a partir do modo como elas percebem a masculinidade.

IHU On-Line - O exercício da paternidade atual irá influenciar na criação de um modelo paterno no futuro? De que maneira?
Andréa Seixas Magalhães -
Sim. As vivências e percepções da paternidade atual modularão os modelos paternos futuros, considerando que esses modelos são transmitidos consciente e inconscientemente.

IHU On-Line – Quais são as principais mudanças que estão ocorrendo na concepção de paternidade nos últimos anos?
Andréa Seixas Magalhães -
As principais mudanças na concepção de paternidade estão relacionadas às mudanças nas relações de gênero e às mudanças nos arranjos conjugais e familiares. O mundo atual é veloz, pautado por valores individualistas e pelo culto ao prazer. O laço conjugal se mantém na medida da satisfação dos parceiros e os modos de obter satisfação e prazer são cada vez mais diversificados. A família se transforma também em decorrência das mudanças na conjugalidade. Os cônjuges são considerados os arquitetos da família. As relações de gênero tendem a ser mais igualitárias, e as diferenças entre os papéis parentais também tendem a ser menos nítidas. Além disso, a desconstrução de estruturas sociais hierárquicas mais amplas reflete-se sobre a autoridade parental.

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