Edição 518 | 27 Março 2018

Violência e suas múltiplas dimensões

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A brutal execução da vereadora carioca Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes, ocorrida na noite de 14 de março, expôs a violência contínua e sistêmica sob a epiderme da sociedade brasileira. Se de um lado o episódio provocou levantes em defesa dos direitos humanos em diversos quadrantes do país, de outro exibiu o teatro do horror de quem, na maioria dos casos por meio de notícias falsas, tentou justificar o duplo assassinato. Todo esse contexto ilustra a complexidade do xadrez da violência e suas múltiplas dimensões para além da caricatura policialesca que divide mocinhos, frequentemente as forças militares, e bandidos, normalmente o crime organizado. Para debater o tema, a IHU On-Line reúne uma série de professores e pesquisadores que abordam a temática. Afinal, de que ordem são os signos da violência e como eles operam?

Ainda sobre o assassinato de Marielle, publicamos o artigo de Felipe Dittrich Ferreira, mestre em Antropologia Social pela Unicamp.

A violência, cada vez mais, é pesquisada no Brasil. No que tange às periferias, no entanto, falta um detalhe importante: ouvir. “Vale a pena o esforço de escuta sobre o que as pessoas dizem. Todas as pessoas. É imprescindível ouvir as pessoas que estão direta ou indiretamente implicadas na vida das periferias para estabelecermos os contornos de o que é pertinente e o que não é para tudo o que discutimos”, destaca Daniel Hirata.

Para o cientista social Sérgio Adorno, não há respostas simples para explicar a gênese da violência no Brasil. “As raízes devem ser buscadas na colonização e em seus modos cruéis e rudes de dominação. No entanto, convém lembrar que a condenação da violência, em suas múltiplas formas, é um fenômeno moderno”, afirma.

O pesquisador Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo, professor na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS, aborda as implicações da vingança como desejo prioritário em relação à justiça. O entrevistado frisa que boa parte da sociedade adere “ao discurso do chamado populismo punitivo, ou seja, a ideia de que o puro e simples endurecimento penal, mesmo nas condições precárias do nosso sistema carcerário, poderia ser um mecanismo de contenção da criminalidade”.

Para David Léo Levisky, psicanalista e professor da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, é preciso superar uma visão rasteira sobre a questão da violência incapaz de perceber seus mecanismos que dizem respeito ao desenvolvimento humano. “Quando há um crime, é fácil identificar o motivo, a razão prática. Mas o que está subjacente, no contexto da malha social? Aquelas situações em que um garoto tem uma arma, naquele ambiente, é parte do processo de desenvolvimento e faz parte do rito de passagem”, pontua.

Bruno Manso, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, observa as transformações das dinâmicas da violência entre os grupos criminosos e como o acesso ao armamento tornou-se o calcanhar de Aquiles da segurança. “O controle de armamentos é fundamental, inclusive a diminuição do porte de armas, pois as armas são roubadas e essa é a principal fonte dos criminosos, as armas que são tomadas dos cidadãos comuns”, analisa.

Para Marcos Rolim, presidente do Instituto Cidade Segura e membro do Conselho Administrativo do Centro Internacional de Promoção dos Direitos Humanos (Unesco), nem a direita nem a esquerda produziram políticas eficientes de segurança. “Nossos presídios são máquinas de ampliação e agravamento das dinâmicas criminais”, avalia.

Nem toda a violência é explícita e alguns processos são invisibilizados, como o da injustiça. “A desigualdade é uma situação de injustiça e toda situação de injustiça é uma violência estrutural permanente, manifesta-se de diferentes maneiras e com diversos rostos”, pontua o frei dominicano Marcos Sassatelli.

Angelina Batista, professora aposentada do Departamento de Educação da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Unesp, retoma a discussão a partir do raciocínio de que a violência é, também, um instinto humano. Nesse sentido, a entrevistada sustenta que a violência é inerente à espécie homo sapiens “porque está ligada ao instinto de agressão que, como instinto, pode servir para o bem ou para o mal e existe para preservar a vida”.

Patrícia Krieger Grossi, relaciona a violência de gênero com desigualdades. “Essas desigualdades de gênero se expressam na divisão sexual do trabalho, nos menores rendimentos às mulheres pelas mesmas funções desempenhadas por homens, menor participação nos espaços políticos e de poder”, pontua.

Este número tem, ainda, entrevista com Denise Gentil, professora de Economia no Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, sobre a questão da reforma da Previdência neste ano de eleições,

Na semana da Páscoa, publicamos duas entrevistas que refletem, contexto contemporâneo, o tema da Ressurreição de Cristo. Uma com o teólogo Leonardo Boff e outra com Ferdinando Sudati, teólogo italiano que comenta recente livro de Roger Lenaers, jesuíta belga radicado em Insbruck, na Áustria, intitulado La nascita di Gesù tra miti e ipotesi [O nascimento de Jesus, entre mitos e hipóteses].

Agora em março, em Brasília, foi realizado o 8º Fórum Mundial da Água. Para refletir sobre esse tema, que é uma preocupação global, foram entrevistados dois especialistas nessa área: Heloisa Hollnagel, professora da Unifesp, e Luiz Fernando Scheibe, professor emérito do Departamento de Geociências da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC

Ainda pode ser lida a crítica de cinema de Fernando Del Corona sobre o filme Me chame pelo seu nome (2017) e o artigo de Gabriel Pessin Adam, professor dos cursos de Relações Internacionais e Direito na Unisinos, sobre a política internacional de Donald Trump e os efeitos no Oriente Médio.

A todas e a todos uma boa leitura e uma Feliz Páscoa da Ressurreição!

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