Edição 516 | 04 Dezembro 2017

Nenhuma escola está imune às ondas de violência e conservadorismo

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João Vitor Santos | Edição: Vitor Necchi

Para Elí Fabris e Maria Cláudia Dal’Igna, professores e alunos são ameaçados pela criminalidade, pelo movimento Escola Sem Partido e por várias discriminações

As professoras Elí Terezinha Henn Fabris e Maria Cláudia Dal’Igna mantêm uma cumplicidade calcada em laços afetivos e profissionais há pelo menos duas décadas. Fruto desta sintonia, a entrevista que se segue foi respondida em conjunto pelas duas, como a fazer eco para uma das afirmações que formularam acerca da atuação de professores: “A docência pressupõe sujeitos em posições e funções diferenciadas de ensino e de aprendizagem. Isso não impede que as trocas entre professoras e alunas aconteçam de distintas formas. Ora a aprendente pode ensinar, ora a ensinante pode aprender, mas isso não implica uma inversão de posições e funções, em que a professora é vista como aluna e a aluna é percebida como professora”. Nas respostas, encaminhadas por e-mail à IHU On-Line, elas se posicionam “absolutamente contrárias a qualquer moda educacional que fragilize os saberes docentes e secundarize a função de ensinar, primordial para um exercício qualificado da docência”.

As duas recordam que, no Brasil, “o magistério se torna uma profissão majoritariamente exercida por mulheres” entre o final do século XIX e o início do século XX, quando o magistério tinha o valor de uma conquista para as mulheres, que podiam receber remuneração pelo trabalho e ainda ampliavam seu universo de atuação. “Por outro lado, é preciso considerar que o ingresso no magistério, em meados do século XIX, era uma das únicas possibilidades de trabalho, pois aproximava o ofício do magistério daquilo que era considerado como ocupação feminina: cuidado com a família, as crianças e o lar”, ressalvam.

Com o tempo, a caracterização do magistério como atividade própria da natureza feminina “produziu alguns efeitos nocivos para a profissão, entre eles, a desvalorização social e a baixa remuneração salarial”. Se, neste aspecto, há muito a superar, ainda existem outros grandes desafios para a docência nas escolas públicas, porque vivem-se ameaças a partir de muitas formas de violência, como, por exemplo, “os crimes ocorridos no entorno da escola, o cerceamento dos professores e professoras a partir do movimento Escola Sem Partido, ou, ainda, as várias discriminações de classe, raça/etnia, gênero, sexualidade, religião, entre outras, praticadas dentro e fora da escola”. No entendimento das professoras, “nenhuma escola está imune às ondas de violência e conservadorismo que temos enfrentado na vida social”.

Elí Terezinha Henn Fabris é doutora e mestra em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, especialista em Métodos e Técnicas de Ensino pela Universidade de Santa Cruz do Sul – Unisc e graduada em Pedagogia – Administração Escolar e Orientação Educacional pela Universidade de Passo Fundo – UPF. É professora e pesquisadora da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, onde coordena o Programa de Pós-Graduação em Educação e o Grupo Interinstitucional de Pesquisa Pedagogias, Docências e Diferenças (GIPEDI/CNPq).

Maria Cláudia Dal’Igna é doutora e mestra em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e graduada em Pedagogia pela Unisinos. É professora e pesquisadora da Unisinos, onde atua como vice-coordenadora do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid/Capes) e do Grupo Interinstitucional de Pesquisa em Docências, Pedagogias e Diferenças (GIPEDI/CNPq).

Confira a entrevista.

IHU On-Line – De que modo vocês compreendem a docência?
Elí Terezinha; Maria Cláudia – Queremos responder essa pergunta buscando apoio em nosso grupo de pesquisa, o GIPEDI – Grupo Interinstitucional de Pesquisa em Docências, Pedagogias e Diferenças. Para esse grupo, docência significa o exercício da ação de um professor, de uma professora (a partir de agora, nesta entrevista, alternamos a flexão de gênero, para dar visibilidade às relações entre docência e diferenças de gênero). Só pode exercer a docência um professor em certa condição. Ele exerce a docência quando no contexto de um processo educativo intencional desenvolve o ensino, junto a um grupo de indivíduos que estão em posição de aprendentes – são alunos. Portanto, a docência pressupõe sujeitos em posições e funções diferenciadas de ensino e de aprendizagem. Isso não impede que as trocas entre professoras e alunas aconteçam de distintas formas. Ora a aprendente pode ensinar, ora a ensinante pode aprender, mas isso não implica uma inversão de posições e funções, em que a professora é vista como aluna e a aluna é percebida como professora. A docência é uma condição exercida pelo professor, comprometido com o processo de ensino e com as possíveis aprendizagens promovidas a partir dele. Aqui, nos posicionamos absolutamente contrárias a qualquer moda educacional que fragilize os saberes docentes e secundarize a função de ensinar, primordial para um exercício qualificado da docência. Sobre isso, sugerimos ver as pesquisas desenvolvidas pelo GIPEDI sobre docência virtuosa (Oliveira, 2015), docência redentora (Brodbeck, 2015), docência S/A (Dal’Igna, Scherer, Silva, no prelo), flexível e generificada, docência terapêutica (Silva, Tomasel, no prelo).

IHU On-Line – Historicamente, quais eram os maiores desafios para a docência no Brasil? E na atualidade?
Elí Terezinha; Maria Cláudia – Pensar sobre os desafios da docência no passado e na atualidade nos faz retomar a historicidade de nossa profissão. Por sua relevância para compreender a docência brasileira, escolhemos aqui o processo de feminização do magistério para comentar, e destacar alguns dos desafios envolvidos para analisar o tempo presente. Considerando o que muitos estudos e pesquisas sobre feminização do magistério vêm mostrando (Almeida, 1996; Louro, 1987; Chamon, 1996; Tambara, 1998), no Brasil, podemos afirmar que entre o final do século XIX e início do século XX, o magistério se torna uma profissão majoritariamente exercida por mulheres.

Um processo de feminização da profissão no Brasil precisa ser analisado, ainda, a partir das transformações ocorridas no mundo do trabalho. Com base nesses estudos e pesquisas, entre outros, também podemos afirmar que, por um lado, há um protagonismo das mulheres na ocupação do mercado de trabalho em uma emergente sociedade industrial. Assim, o magistério constitui-se como uma conquista das mulheres, ao desempenharem um trabalho remunerado, e um alargamento de seu universo de atuação, com ingresso na esfera pública.

Por outro lado, é preciso considerar que o ingresso no magistério, em meados do século XIX, era uma das únicas possibilidades de trabalho, pois aproximava o ofício do magistério daquilo que era considerado como ocupação feminina: cuidado com a família, as crianças e o lar. Em certa medida, essa representação do magistério como uma atividade ligada a um suposto instinto feminino e com algumas características que foram sendo construídas historicamente como parte dessa natureza feminina, como o amor e o cuidado, por exemplo, produziu alguns efeitos nocivos para a profissão, entre eles, a desvalorização social e a baixa remuneração salarial.

Na atualidade, esses sentidos associados ao processo de feminização precisam ser retomados e investigados. Para isso, temos desenvolvido pesquisas que nos permitem problematizar a naturalização e a absolutização de uma identidade profissional docente. Uma de nós desenvolveu pesquisas com filmes hollywoodianos (Fabris, 1999) e filmes brasileiros (Fabris, 2005). Na primeira, a mulher professora estava sempre ligada ao trabalho com crianças; na segunda, eram os homens professores de jovens estudantes. Em outra pesquisa, em fase inicial de desenvolvimento, realizada por uma de nós (Dal’Igna, 2017), a docência é analisada sob a perspectiva de gênero. O que essa pesquisa busca investigar é de que modos o discurso pedagógico brasileiro referente à profissionalização do trabalho docente tem negado as perspectivas que pensavam o magistério como uma atividade ligada a um instinto feminino e com os atributos de amor, cuidado e afeto, que foram sendo construídos historicamente como parte dessa natureza feminina.

IHU On-Line – Como compreender as particularidades do processo de formação e do exercício da docência na escola pública? E qual o papel da universidade na preparação desses professores?
Elí Terezinha; Maria Cláudia – Hoje os desafios da docência nas escolas públicas têm aumentado porque vivemos ameaçados por muitas formas de violência, como, por exemplo, os crimes ocorridos no entorno da escola, o cerceamento dos professores e professoras a partir do movimento “Escola Sem Partido”, ou, ainda, as várias discriminações de classe, raça/etnia, gênero, sexualidade, religião, entre outras, praticadas dentro e fora da escola. Mas, essa é uma condição da sociedade contemporânea e tal condição, apensar de ser difícil e complexa, não deve nos paralisar como docentes. Nenhuma escola está imune às ondas de violência e conservadorismo que temos enfrentado na vida social, embora tenhamos que reconhecer que existem contextos mais vulneráveis que outros, com mais ou menos condições de (re)ação e enfrentamento. Portanto, para analisar o exercício da docência na escola pública (e privada) e a função da universidade na preparação das futuras professoras, precisamos compreender a docência como uma ação de profissionais que precisam de políticas públicas que contribuam para a sua qualificada formação inicial em diferentes cursos de licenciatura, assegurando o direito de aprender a ser docente na escola e na universidade, durante a iniciação à docência (Pibid) e os estágios supervisionados e, após a conclusão de seu curso, no processo de inserção profissional (residência pedagógica).

Defendemos que os cursos de licenciatura devem organizar seus currículos contemplando um corpo de conhecimentos específicos de distintas áreas e de conhecimentos pedagógicos, aliados com um processo de socialização na profissão desde os primeiros anos do curso, para formar um profissional professor capaz de ensinar e de enfrentar as ondas de violência e conservadorismo atuais. Desse modo, compreendemos que a universidade tem uma função muito importante na formação inicial desta profissional. Mas, temos advogado que ela precisa também, ao “entregar” a egressa professora para a sociedade e a escola, desenvolver um programa de acompanhamento. Nessa direção, entendemos que as universidades e o poder público poderiam estabelecer parcerias para criar um programa de residência pedagógica após a conclusão da formação inicial para acompanhar e subsidiar a atuação dos professores iniciantes na carreira. Eles poderiam, por exemplo, se manterem vinculados aos grupos de estudo e pesquisa nas universidades para fortalecer a relação teoria e prática e para qualificar a sua formação continuada e a sua atuação como professor iniciante.

IHU On-Line – Como reduzir as desigualdades entre ensino na rede pública e na privada, a partir da perspectiva da atuação da prática docente?
Elí Terezinha; Maria Cláudia – A “pedagogia da redenção” (Brodbeck, 2015) e ou a “pedagogia do herói” (Fabris, 2010) nos conduz a acreditar que a professora pode ser uma semideusa, uma heroína que a todos pode salvar. A professora, ao exercer a docência, tem limites definidos para sua ação. As práticas pedagógicas possuem limites. A escola possui limites. Para reduzir as desigualdades sociais e educacionais, precisamos de políticas públicas que deem sustentação para o exercício da docência atingir seus objetivos e metas.

Em uma das pesquisas que desenvolvemos (Fabris, 2012) em uma escola de periferia, isso ficou bem evidente. Tínhamos um grupo de professoras alfabetizadoras extremante comprometidas com a condição social em que a escola estava inserida, mas os alunos apresentavam graves dificuldades no processo de alfabetização. Após um estudo amplo e detalhado, o que verificamos foi que era preciso promover ações em rede, sustentadas por políticas públicas, nas áreas da saúde e da assistência social, em articulação com a educação, para atender os alunos e suas famílias. Além disso, era preciso uma revisão na política de inserção dos professores na escola, proposta pela secretaria do município, porque os docentes eram conduzidos para a escola, localizada em uma região de “difícil acesso”, com a promessa que ficariam um ano e, depois, poderiam pedir transferência, portanto, não criavam vínculo com a escola. Além dessas ações de gestão do processo educacional, também era necessária uma revisão da prática docente. Então, desenvolvemos, naquele momento, um grupo de estudos para as professoras alfabetizadoras que estudavam no final das aulas junto com a pesquisadora e no final, elaboraram princípios para alfabetizar naquela escola, com aquele grupo de alunos e alunas, passaram a analisar a “matriz pedagógica” daquela escola (Fabris; Silva, 2015). Esse é um exemplo que mostra a necessidade de criar projetos coletivos, em que a educação básica e a educação superior compõem parceria com outros setores da sociedade para qualificar o ensino e seus resultados educacionais.

IHU On-Line – O ensino a distância e a mediação do processo de ensino e aprendizagem por ambientes virtuais, apostilas, manuais e monitores (muitas vezes sem formação docente) são uma realidade. Quais os limites e as possibilidades dessa reconfiguração do ambiente de sala de aula?
Elí Terezinha; Maria Cláudia – O uso de diferentes tecnologias e metodologias educacionais tem sido um indicador utilizado para atestar a condição da inovação em sala de aula. No entanto, mesmo entendendo que não podemos negar aos nossos estudantes distintas oportunidades e recursos para o seu desenvolvimento pleno, temos de registrar que uma educação de qualidade e um projeto educacional inovador não se restringem a isso.

Podemos e devemos pensar a inovação junto com as Artes, com a Pedagogia, a Filosofia, a Sociologia, a Educação Física, a Língua Portuguesa, a Matemática... enfim, com os campos de saber que fundamentam os processos educativos, sustentam a produção de novos conhecimentos e geram subsídios para a criação de projetos educativos inovadores. Além disso, para refletir sobre a reconfiguração da sala de aula hoje e no futuro, precisamos analisar o que entendemos como aula. Para isso, recorremos a uma ideia de Gilles Deleuze (1996), sobre ser professor e sobre a aula: “Para mim, uma aula não tem como objetivo ser entendida totalmente. Uma aula é uma espécie de matéria em movimento. [...] Numa aula, cada grupo ou cada estudante pega o que lhe convém. Uma aula ruim é a que não convém a ninguém. Não podemos dizer que tudo convém a todos. [...] Uma aula é emoção. É tanto emoção quanto inteligência. Sem emoção, não há nada, não há interesse algum. Não é uma questão de entender e ouvir tudo, mas de acordar em tempo de captar o que lhe convém pessoalmente. [...] [Para dar aula] é preciso estar totalmente impregnado do assunto e amar o assunto do qual falamos. Isso não acontece sozinho. É preciso ensaiar, preparar. É preciso ensaiar na própria cabeça, encontrar o ponto em que... É muito divertido, é preciso encontrar... É como uma porta que não conseguimos atravessar em qualquer posição”. (DELEUZE, 1996, s.p.).

A partir dessa ideia, podemos afirmar que uma aula requer muito planejamento, ao mesmo tempo em que é um ensaio, um exercício, um movimento provisório e sempre inacabado. O ensaio proposto pelo autor é isso, é composto por um momento de planejamento no qual antecipamos o que pode acontecer, perguntas, desafios, questões..., e por um momento de execução, esse espaço para as descobertas junto com os alunos e alunas. Um ensaio que não é só repetição, um ensaio que é preparação para uma experiência formativa. Em uma aula, nem sempre conseguimos interpelar todos os nossos alunos e alunas, mas temos que seguir perseguindo esse objetivo. Se, por um lado, não podemos recuperar uma aula, por outro lado, podemos retomá-la e ressignificá-la porque há uma continuidade prevista no trabalho formativo, e de uma semana para outra podemos perceber mudanças. Isso é fascinante!

IHU On-Line – Atualmente, fala-se que a “lógica da uberização” chegou ao campo da educação. Como essa perspectiva tem impactado a profissão docente e os processos de ensino e aprendizagem?
Elí Terezinha; Maria Cláudia – Para relacionar a empresa Uber, o trabalho e o trabalho docente, temos que contextualizar o processo de “uberização educacional”, se pudermos dizer assim, no tempo vivido. Uma série de transformações do trabalho estão em curso há décadas, e a “lógica da uberização” é um dos efeitos das políticas neoliberais desenvolvidas no Brasil, as quais produzem nuances importantes e específicas para as relações entre Estado, mercado e educação. Para contextualizar essas relações no campo da Educação, podemos citar aqui estudos de colegas professores sobre a formação da “Cultura do Empreendedorismo” (Costa, 2009), ou ainda, da construção de “Modelos Educacionais Gerencialistas” (Álvaro Hypolito, 2010). Esses estudos nos permitem propor uma análise do trabalho docente focalizando as relações empresa-escola, empresa-universidade, sujeito e capital, custo e benefício. Nesses termos, o professor-trabalhador é visto como uma espécie de empresa para si mesmo. Trata-se de uma mudança poderosa, de grande impacto para a profissão docente e para os processos de ensino e aprendizagem, uma mudança de ordem subjetiva, que dá visibilidade a uma nova forma de organização, gestão e avaliação do trabalho docente. Assim, assistimos à criação e propagação acelerada de termos educacionais antes utilizados somente em empresas: o diretor da escola ou da universidade passa a ser gestor, o coordenador pedagógico é gerente, o professor é colaborador, e o aluno é cliente.

Igualmente, nessa perspectiva, são criadas políticas curriculares baseadas nas competências e nos resultados gerenciais, e proliferam exames nacionais e modalidades de premiação e ranqueamento de alunos e alunas, professores e professoras, escolas e universidades. Essas estratégias de regulação das vidas escolar e universitária contemporâneas precisam ser identificadas e examinadas com criticidade, e não simplesmente serem celebradas ou demonizadas. É o exercício de pensamento, e não o julgamento, que torna possível a qualificação das práticas e a criação de outros modos de ser e viver a docência na contramão da “lógica da uberização”. Não sonhamos com a vida perfeita. Sabemos que estamos vivendo em um mundo em que a regulação da vida humana é cada vez mais intensa, em todos os sentidos. Justamente por isso, entendemos que a escola e a universidade podem se constituir como lugares para exercício de pensamento e criação de projetos de vida mais coletivos e menos individualistas, projetos ancorados em um “ethos docente” (Aquino, 2014) e um “ethos de formação” (Dal’Igna; Fabris, 2015).

IHU On-Line – Como as senhoras avaliam as recentes “reformas educacionais” propostas pelo Governo Federal, entre elas a Base Nacional Comum Curricular? No que consiste essa base? Em que medida ela reduz a possibilidade do desenvolvimento de conteúdos regionalizados, valorizando culturas e hábitos, saberes locais?
Elí Terezinha; Maria Cláudia – Nós duas estivemos envolvidas em diferentes momentos com as discussões que foram organizadas por região (2013 a 2015) para elaborar a Base Nacional Comum Curricular - BNCC. Nestes momentos, ressaltamos a nossa satisfação com os diálogos coletivos estabelecidos entre escolas, universidades, secretarias e conselhos municipais e estaduais. Do mesmo modo, manifestamos a nossa preocupação com os pressupostos orientadores da Base Curricular em vigor e que estão claramente expressos no documento final: “A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – 9.394/1996) deixa claros dois conceitos decisivos para todo o desenvolvimento da questão curricular no Brasil. O primeiro, já antecipado pela Constituição, estabelece a relação entre o que é básico-comum e o que é diverso em matéria curricular: as competências e diretrizes são comuns, os currículos são diversos. O segundo se refere ao foco do currículo. Ao dizer que os conteúdos curriculares estão a serviço do desenvolvimento de competências, a LDB orienta para a definição das aprendizagens essenciais, e não apenas dos conteúdos mínimos a ser ensinados. Essas são duas noções fundantes da BNCC”. (Brasil, 2016).

A partir desse excerto, podemos perceber que a Base Curricular propõe o foco nas aprendizagens e não nos conteúdos. Além disso, os conteúdos curriculares devem estar a serviço do desenvolvimento de competências. Considerando que esse é um documento de caráter normativo que define os modos de organização dos currículos dos sistemas e redes de ensino das Unidades Federativas, como também as propostas pedagógicas de todas as escolas públicas e privadas de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, em todo o Brasil, é importante pensar sobre os pressupostos orientadores. Que sentidos são atribuídos à docência, ao ensino, à aprendizagem, aos conhecimentos, aos conteúdos e às competências neste documento (BNCC)? Indicamos aqui alguns pontos que merecem ser examinados com cuidado e para isso sugerimos a entrevista do professor Roberto da Silva, nesta edição da Revista IHU On-line, e o artigo da professora Elizabeth Macedo (2016).

IHU On-Line – Desejam acrescentar algo?
Elí Terezinha; Maria Cláudia – Gostaríamos de concluir esta entrevista convidando as pessoas para conhecerem o GIPEDI – Grupo Interinstitucional de Pesquisa em Docências, Pedagogias e Diferenças. Acesse o Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico: http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/1673844229666121.
Em breve faremos o lançamento da página do GIPEDI. ■

Referências

- ALMEIDA, Jane Soares de. Mulheres na escola: Algumas reflexões sobre o magistério feminino. In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 96, p. 71-78, fev., 1996.
- AQUINO, Julio R. Groppa. Da autoridade pedagógica à amizade intelectual: uma plataforma para o éthos docente. São Paulo: Cortez, 2014.
- BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Terceira versão revista. Brasília: MEC, 2016. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/a-base Acesso em: 27 fev. 2017.
- BRODBECK, Cristiane Fensterseifer. Docência em ciências nas práticas Pibidianas do subprojeto biologia e a produção de uma pedagogia da redenção. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2015.
- CHAMON, Magda Lucia. Relações de gênero e a trajetória de feminização do magistério em Minas Gerais (1830-1930) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1996.
- COSTA, Sylvio de S. Gadelha. Governamentalidade neoliberal, teoria do capital humano e empreendedorismo. In: Educação & Realidade, Porto Alegre, v.34, n.2, p. 171-186, mai./ago., 2009.
- DAL’IGNA, Maria Cláudia. A produção de sentidos sobre afeto, amor e cuidado na formação inicial docente sob a perspectiva de gênero (2017-2021). São Leopoldo: Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, 2017. [Projeto de Pesquisa].
- DAL’IGNA, Maria Cláudia; FÁBRIS, Eli Henn. Constituição de um ethos de formação no Pibid/Unisinos: processos de subjetivação na iniciação à docência. In: Educação Unisinos. Volume 19, n. 1, janeiro a abril 2015, p. 77-87.
- DAL’IGNA, Maria Cláudia; SCHERER, Renata Porcher; SILVA, Jonathan Vicente da. Docência S/A: Gênero e flexibilidade em tempos de educação customizada. In: FABRIS, Elí T. Henn; DAL’IGNA, Maria Cláudia; SILVA, Roberto R. Dias da. Modos de ser docente no Brasil contemporâneo: pesquisa e formação. [livro no prelo].
- DELEUZE, Gilles. L’abécédaire de Gilles Deleuze. Entrevista feita por Claire Parnet, filmada e dirigida por Pierre-André Boutang. Paris: Vidéo Éditions Montparnasse, 1996.
- DERRIDA Jacques; ROUDINESCO, Elisabeth. De que amanhã... Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004.
- FABRIS, Elí. T. Henn. Representações de espaço e tempo no olhar de Hollywood sobre a escola. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1999.
- FABRIS, Elí. T. Henn. Em cartaz: o cinema brasileiro produzindo sentidos sobre escola e trabalho docente. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2005.
- FABRIS, Elí. T. Henn. A pedagogia do herói nos filmes hollywoodianos. In: Currículo Sem Fronteiras, v. 10, p.232-245, 2010.
- FABRIS, Elí. T. Henn. As tramas do currículo e o desempenho escolar: as práticas pedagógicas nos anos iniciais do ensino fundamental (2008-2012). São Leopoldo: Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, 2012. [Relatório de Pesquisa].
- FABRIS, Elí. T. Henn; SILVA, Roberto R. Dias da. Análise de uma matriz pedagógica escolar: a invenção da docência e de pessoas em uma escola de periferia. In: Currículo Sem Fronteiras, v. 15, p. 492-507, 2015.
- HYPOLITO, Álvaro Moreira. Políticas curriculares, Estado e regulação. In: Educação & Sociedade, São Paulo, v. 31, p. 1337-1354, 2010.
- LOURO, Guacira Lopes. Prendas e anti-prendas: uma escola de mulheres. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 1987.
- MACEDO, Elizabeth. Base nacional curricular comum: a falsa oposição entre conhecimento para fazer algo e conhecimento em si. In: Educação em Revista, Belo Horizonte, v.32, n.2, pp.45-68, 2016.
- OLIVEIRA, Sandra de. Tornar-se professor/a: matriz de experiência e processos de subjetivação na iniciação à docência. Tese (Doutorado em Educação) –Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Vale do Rio dos Sino, São Leopoldo, 2015.
- SILVA, Miriã Zimmermann da; TOMASEL, Soraia. Socialização e desejos: a docência terapêutica em dois atos. In: FABRIS, Elí T. Henn; DAL’IGNA, Maria Cláudia; SILVA, Roberto R. Dias da. Modos de ser docente no Brasil contemporâneo: pesquisa e formação. [livro no prelo].
- TAMBARA, Elomar A. Callegado. Profissionalização, escola normal e feminilização: magistério sul-rio-grandense de instrução pública no século XIX. In: História da Educação. Pelotas, n.3, p.35-58, abr.1998.

Leia mais

- Governamentalidade, gênero e educação, uma relação complexa. Entrevista com Maria Cláudia Dal’Igna, publicada na revista IHU On-Line número 463, de 20-04-2015.

- A escola e o trabalho docente no cinema hollywoodiano e nacional. Entrevista com Elí Terezinha Henn Fabris, publicada na revista IHU On-Line, número 182, de 26-05-2006.

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