Edição 496 | 31 Outubro 2016

Flerte com a morte

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João Vitor Santos | Tradução Vanise Dresch

A partir da ideia de corporeidade, David Le Breton analisa como a exposição ao risco e à iminência do falecimento podem contribuir na busca de sentido para a existência

“Para um número crescente de nossos contemporâneos, não basta viver, é preciso sentir-se existindo.” A frase do antropólogo David Le Breton pode funcionar como uma pista para se entender certas condutas de risco tomadas quase que para colocar em xeque a própria vida. Apressadamente, pode-se pensar que essas posturas se dão por um descaso total com a sua existência. “Expondo-se ao risco de perder a vida, o indivíduo pisa no território da morte e traz de lá um troféu que não é um objeto, mas uma duração impregnada de intensidade de ser, carregando com ela o reforço persistente do momento em que, por sua coragem ou iniciativa, conseguiu arrancar-lhe a garantia de uma vida agora bem ativa”, esclarece.

Na entrevista a seguir, concedida por e-mail à IHU On-Line, o professor destaca o flerte de muitos jovens de hoje com a morte. “As condutas de risco das jovens gerações não significam um desejo de morrer, não são uma forma desastrada de suicídio, mas um desvio simbólico para adquirir a certeza do valor da existência, para rejeitar o medo da insignificância pessoal”, pontua, ao lembrar que para sair desses “jogos mortais” é necessário ao jovem adquirir consciência de sua fragilidade e também liberdade.

David Le Breton é antropólogo e sociólogo francês, professor de sociologia da Universidade de Strasbourg. Membro do Institut Universitaire de France e do Institut des Etudes Avancées da Universidade de Strasbourg (USIAS). Autor de obras publicadas em português, dentre as quais se destacam Antropologia dos sentidos (Petrópolis: Vozes), Antropologia da dor (São Paulo: FAP-Unisep), Antropologia do corpo e modernidade (Petrópolis: Vozes), Condutas de risco. Dos jogos de morte ao jogo de viver (Campinas: Autores Reunidos), As paixões ordinárias. Antropologia das emoções (Petrópolis: Vozes), Compreender a dor (Lisboa: Estrela Polar), A sociologia do cuerpo (Petrópolis: Vozes), Do silêncio (Lisboa: Instituto Piaget), Adeus ao corpo (São Paulo: Papirus), Sinais de identidade. Tatuagens, piercings e outras marcas corporais (Lisboa: Miosotis).

 

Confira a entrevista.


IHU On-Line - Como compreender a morte a partir da ideia de corporeidade?

David Le Breton - Em nossas sociedades, o cadáver se tornou um objeto antropológico não identificado. Ele materializa uma representação da morte, dando a esta um conteúdo concreto. Porém, enquanto para alguns continua sendo a pessoa, para outros, é apenas um resto, um puro objeto, eventualmente disponível como recurso para transplante de órgãos ou experimentos. Os significados vinculados ao cadáver dependem da representação social da morte e daquilo que o indivíduo faz dela. Ela está ligada ao status da pessoa.

Falo disso em meu livro, La chair à vif. De la leçon d’anatomie aux greffes d’organes , que não está traduzido em português. Essas representações são inerentes ao contexto social e cultural, bem como aos atores que se confrontam e que podem não ter as mesmas representações. Qualquer alteração da parte corporal do homem é uma alteração dele mesmo. O homem não tem um corpo, ele é carne, a condição humana é corporal. Entretanto, a morte é a alteridade absoluta, ainda mais perturbadora quando seu entendimento é inacessível, e o cadáver permanece presente, mas nada diz, trazendo também seu enigma. Embora submerso na morte, podemos tocá-lo, pensar que permanece próximo.

A noção de cadáver marca uma transformação radical do status da pessoa, sua passagem da vida à morte. Viva, ela é corpo, morta, torna-se cadáver. E se o corpo é reversível, na medida em que pode, às vezes, designar o cadáver, este último termo nunca é aplicado a uma pessoa viva. A individualização do sentido leva cada um a ter uma representação própria, muitas vezes reformulável, do que é: resto indiferente, ou então, a pessoa sob outra forma. Nunca estamos diante de um cadáver, mas sempre diante de significados e valores. E, além disso, o cadáver é sempre uma questão de relação.


IHU On-Line – De que forma ser confrontado com um cadáver pode contribuir para a elaboração sobre “o que é a morte”?

David Le Breton - A interrogação sobre a morte se faz primeiramente em proximidade com o cadáver de um parente. O morto está ali sem estar, pertence a outra dimensão, inacessível ao entendimento para quem não se contenta com uma posição materialista. O “real” do cadáver é indeterminável, pois é sempre permeado por representações e valores. A relação com o cadáver é individualizada, alimenta significados pessoais, muitas vezes difíceis de explicitar e transmitir a outros. A condição do cadáver se funde nas sensibilidades individuais. 


IHU On-Line - Em que medida a falta de desprendimento humano/social ao corpo traz apenas uma perspectiva material sobre a morte, limitando a complexidade de reflexão sobre o fim da vida? 

David Le Breton - Creio que a consciência de sua própria fragilidade é propícia a intensificar a relação com o mundo. Os adeptos das atividades físicas ou esportivas de risco demonstram isso. A multiplicação dessas atividades anda de mãos dadas com uma sociedade em que, para um número crescente de nossos contemporâneos, não basta viver, é preciso sentir-se existindo. Não se tem a evidência tranquila de viver, é preciso sentir a concretude de sua existência. É porque temos a possibilidade de perdê-la que a existência se torna digna de valor. Os esportes radicais são uma técnica de intensificação do sentimento da presença no mundo. Fazem do confronto da pessoa com ela mesma uma prova de verdade, uma chance que o indivíduo oferece a si mesmo, sob pena de pagar por isso se fracassar em sua tentativa.

Defrontando-se com o pior, ele tenta ganhar o melhor, tenta converter seu medo, seu esgotamento, em determinação de caráter. Se sair ileso da prova, tem a impressão inebriante de estar garantido. Expondo-se ao risco de perder a vida, o indivíduo pisa no território da morte e traz de lá um troféu que não é um objeto, mas uma duração impregnada de intensidade de ser, carregando com ela o reforço persistente do momento em que, por sua coragem ou iniciativa, conseguiu arrancar-lhe a garantia de uma vida agora bem ativa.

Momentos como esses são raros, principalmente quando se apresentam com vigor, à maneira de um breve transe profano que mergulha num formidável sentimento de exaltação ou de potência. A morte é uma espécie de reserva selvagem ao alcance do indivíduo que deseja se entregar ao mundo, aceitando as consequências da aposta. Voltaremos a falar do caráter extremo dessas provas, que remetem à imagem da ordália [ou do ordálio]. Longe de um enraizamento religioso, esses momentos compõem breves transes profanos, uma forma eminentemente moderna de “mística selvagem”, pertencente à estrita intimidade.


IHU On-Line - Em sua obra Adeus ao corpo, o senhor destaca que o corpo pode ser tomado como simples suporte da pessoa. Nessa perspectiva, como a morte se perfaz como limite do corpo?

David Le Breton - A condição humana é corporal. O indivíduo só existe em se mantendo através de sua sensorialidade, sua afetividade, seus gestos ou seus movimentos. Sua presença no mundo é sempre aquela de uma corporeidade em ação. Através dela, ele apropria-se da substância de sua existência de acordo com sua condição social e cultural, sua idade, seu sexo, sua história, e a retransmite aos outros, num processo infinito de comunicação. Sem ela, o indivíduo desaparece, pois não há mundo sem corpo.

O meu ponto de vista é o de uma fenomenologia social. É claro que as representações comuns associam o corpo a um simples suporte da presença, mas essas são representações dualistas, herdeiras de uma velha metafísica ocidental que vê o homem como um composto de alma ou espírito e corpo. A presença do indivíduo no mundo é indissociável da carne. O homem é seu corpo, não o possui como um objeto, mas confunde-se com ele. Qualquer alteração da parte corporal do homem é uma alteração dele mesmo. Mas a morte introduz uma ruptura radical, inapelável. O indivíduo expõe seu corpo à apreciação dos vivos. Morrer é um abandono de toda e qualquer vontade sobre seu próprio corpo. Isso é deixado para os outros. 


IHU On-Line - Quando a morte pode ser tomada como o fracasso do corpo?

David Le Breton - Nunca. Porque a existência está impregnada no corpo, e com ele se confunde. O corpo é a própria condição de nossa potência no mundo. Sem corpo, nada mais existe para o indivíduo. A morte não é o fracasso do corpo, é a condição do sabor do mundo, mas também de nossa vulnerabilidade. 


IHU On-Line - Numa sociedade que põe a tecnociência no centro, como o conceito de morte é atualizado? Quais os avanços e limites dessa perspectiva?

David Le Breton - Esse foi o tema de meus dois livros: Adeus ao corpo (Papirus) e Antropologia do corpo (Vozes). Muitas abordagens da tecnociência concebem o corpo como um esboço a ser corrigido ou até mesmo completamente eliminado por causa de sua imperfeição. Numa curiosa ressurgência laica da gnose , sob uma forma contemporânea, o desprezo pelo corpo assume uma feição digna e científica e propõe uma política de desencarnação do humano. O corpo é tido por alguns tecnófilos como superado e, mesmo que seja biologicamente necessário, o sonho, agora, é desvencilhar-se dele.

Se esse corpo é o lugar da morte ou da doença, não mais a condição de existência do homem, e sim aquela de seus limites, então, uma vez eliminado, a morte, a doença ou os limites não teriam mais sentido. O homem sente-se indigno diante da perfeição emprestada complacentemente à técnica, da qual é o autor. Doença endêmica da mente, o corpo é claramente um excedente para certas correntes pós-humanistas, que desejam o surgimento próximo de uma humanidade finalmente libertada desse entrave anacrônico. Ele é percebido como o lugar da queda, de uma ensomatose , como dizem os teólogos.

A encarnação seria, então, um erro originário a eliminar. Demasiadamente imprevisível, lento em suas reações e defasado em relação à eficiência das tecnologias, o corpo é percebido como uma relíquia indigna de uma condição pós-humana cujo reinado se anuncia. O discurso mais radical a esse respeito vem dos transumanistas, que sonham apenas em eliminar o corpo ou transformá-lo em totalidade para que fuja justamente da fragilidade ou da mortalidade. Agora que os lugares de culto são seguidamente abandonados, os cientistas reivindicam em alto e bom som substituir Deus para nos prometer imortalidade e potência. 


IHU On-Line - Na sociedade contemporânea, como se dão os jogos de morte e vida?

David Le Breton - Esse tema diz respeito à sociologia ou à antropologia do risco. A questão do risco está, hoje, no cerne de nossas sociedades. Os perigos não são os mesmos do passado, sua virulência deslocou-se. Condições de existência menos precárias e uma expectativa de vida crescente não são suficientes para anular o sentimento de vulnerabilidade. A individualização do sentido em nossas sociedades desliga o ator das antigas solidariedades e o torna mais isolado, marcado por um sentimento maior de fragilidade. Além disso, diferentemente dos riscos de outrora, os riscos que percorrem nossas sociedades hoje ameaçam o planeta inteiro e as condições de vida das futuras gerações, fato do qual se tem plena ciência.

Os riscos mudaram de status e de natureza, mas não desapareceram. Não tememos mais o fim do mundo por causa da ira de Deus, mas não podemos ignorar que nossas sociedades nunca estiveram tão expostas a ameaças capazes de destruí-las ou danificá-las profundamente. O risco é também inerente à vida cotidiana. Em nossas sociedades relativamente seguras, o risco se prolifera para cada um por causa dos outros, mas também está presente para os outros por causa de cada um; conforme as circunstâncias, cada um é para os outros um perigo potencial. Ele mora nas nossas menores atividades, está presente em qualquer decisão, em qualquer escolha.

As consequências de um ato nem sempre têm a transparência da decisão que o originou. Ninguém sabe de antemão se uma decisão está correta, tampouco se o fracasso ou o acidente não oferecem uma oportunidade inesperada ou, ao contrário, se o sucesso encontrado não é a promessa do pior. Somente o futuro sabe a resposta e, mesmo não estando presente no momento da decisão, é condicionado por esta. No cotidiano, na vida pessoal e/ou profissional, muitas razões fazem esquecer qualquer prudência ou a tornam vã: a fatiga, a indiferença, o descuido, o esquecimento, o erro, a ignorância do perigo ou a negligência dos outros. No âmbito do trabalho, um conhecimento intuitivo dos riscos de seu ambiente, das especificidades desse lugar e do cargo ocupado, assim como uma vigilância incorporada aos fatos e gestos do cotidiano permitem precaver-se em parte, desde que não se ceda à distração ou a uma superestimação de sua margem de ação.

Essa rede de precauções integradas nos hábitos de vida se baseia constantemente em riscos potenciais. Os instrumentos mais familiares tornam-se, às vezes, fontes de perigo (acidente, eletrocussão, explosão, asfixia etc.). Um temporal que transforma o rio tranquilo em uma enxurrada de lama que invade um camping ou moradias, a explosão de uma usina química, uma catástrofe nuclear que provoca morte num imenso território, um atentado, uma epidemia ou, simplesmente, um acidente de trânsito, um infarto, provocam um drama, justamente quando ninguém esperava. 


IHU On-Line - No que a ideia de morte pode inspirar reflexões sobre condutas de risco hoje?

David Le Breton - As condutas de risco das jovens gerações não significam um desejo de morrer, não são uma forma desastrada de suicídio, mas um desvio simbólico para adquirir a certeza do valor da existência, para rejeitar o medo da insignificância pessoal. Longe de visarem à autodestruição, tais condutas são buscas identitárias. São apelos à vida, mas raramente desejo de morrer.

Para jovens que perderam a escolha dos recursos, trata-se de um difícil nascimento de si mesmo. Apesar dos sofrimentos que causam, elas favorecem a aquisição da autonomia do jovem, a busca de suas próprias marcas. Meios para a construção de uma identidade, essas condutas não deixam de ser dolorosas em suas consequências, pelas dependências, feridas ou mortes que provocam. Podem minar as possibilidades do jovem, principalmente isolando-o da escolaridade. Mas o sofrimento é anterior, perpetuado por uma conjunção complexa entre uma sociedade, uma estrutura familiar, uma história de vida. Ilustram uma vontade de debater-se para finalmente existir.

Com o tempo, o jovem domestica seu mal-estar, elabora uma identidade propícia. A turbulência vivenciada torna-se então um recurso para viver com uma consciência de que a existência é um privilégio. Mas, para sair desses jogos mortais, o jovem precisa adquirir a consciência aguçada não só de sua fragilidade, mas também de sua liberdade. Precisa dar um sentido e um valor à sua vida.


IHU On-Line - Como compreender a concepção de fim da vida nos jovens de hoje, a partir da relação com o próprio corpo?

David Le Breton - A morte é irredutível para o pensamento, não cabe na força da linguagem. Por natureza, não tem outra representação além do imaginário, pois ninguém poderia testemunhar sobre um estado para o qual, contudo, todo mundo se encaminha. É o desconhecido que está sempre presente no horizonte.

Para Freud , o inconsciente não tem nenhuma representação dela. O sentimento íntimo da morte é informulável, não cabe na força da linguagem. Até os seis anos de idade aproximadamente, a criança não tem consciência da morte, ela a vê mais como uma ausência que será seguida por um retorno, como uma separação provisória. A morte é simplesmente um outro lugar de vida. As representações da morte remetem, segundo ele, às angústias de separação, ao medo de perder a presença e o amor dos entes próximos. A morte está associada ao sono, portanto, mais cedo ou mais tarde acordaremos.

 

Criança

A criança não vive na duração do tempo da mesma maneira que o adulto, ela está mergulhada no tempo imediato e tem dificuldade de distinguir uma separação provisória de uma separação definitiva. Muitos pais vivenciaram isso ao tentar explicar à criança a morte de um avô, por exemplo. Alguns dias mais tarde, para sua surpresa, a criança pergunta, como se nada tivesse acontecido: “Quando é que vovô volta?” Depois, aos poucos, ela absorve a irreversibilidade da morte, sua dimensão trágica, lida, às vezes, no rosto dos pais enlutados, mas a criança sabe sem saber, da mesma forma ambivalente em que dizemos: “Eu sei, mas mesmo assim...”.

 

Adolescente

E o adolescente, com alguns anos a mais, sem ignorar a separação da morte, não tem a certeza absoluta de seu perigo. Não possui aquela visão fatal e irreversível da morte que os mais velhos possuem. A morte não é percebida como uma autodestruição, não significa a finitude da existência. Enquanto permanecer longe do adolescente, aprisionada nas ficções, nos sites, nos videogames, dos quais ele é muitas vezes um adepto apaixonado, a morte não é nem irreversível, nem trágica, nem contagiosa. Ao contrário, ela proporciona poder, pois o jovem pode retroceder para rever mais detalhadamente uma decapitação ou uma cena de tortura, ver em câmera lenta uma cena de acidente para contemplar a morte dos outros com toda a segurança ou rever mil vezes um efeito especial num filme gore muito sangrento.

 

Controlando a morte

Trata-se, neste caso, de uma morte sob controle e puramente virtual, a morte de outrem. Em seguida, ele clica em outro site ou desliga o computador para fazer outra coisa. Mas a morte pode atingir a escola sem rodeios, e não é possível desligar o real ao seu redor. À medida que os anos passam, o jovem se desapega de seu sentimento de onipotência e, mesmo que continue se sentindo a-mortal, não deixa de sentir ao mesmo tempo sua precariedade. No entanto, persiste a fantasia de que a morte não o atinge. Essa fase da vida é acompanhada por uma subavaliação sensível da fragilidade da existência. 


IHU On-Line - De que forma a morte pode interferir na autonomia do sujeito?

David Le Breton - A existência individual oscila entre vulnerabilidade e segurança, risco e prudência. Pelo fato de que a existência nunca é dada previamente, o gosto pela vida a acompanha na sua evolução e reforça o sabor de todas as coisas. A resposta à precariedade relativa da vida consiste justamente nesse apego a um mundo em que o gozo é medido. Só tem preço aquilo que pode ser perdido, e a vida nunca é adquirida de uma vez por todas como uma totalidade fechada e garantida por si mesma.

Além disso, a segurança sufoca a descoberta de uma existência sempre parcialmente dissimulada e que só toma consciência de si mesma na troca por vezes inesperada com o mundo. O perigo inerente à vida consiste provavelmente em nunca se desafiar, em mergulhar numa rotina sem aspereza, sem tentar inventar, nem em sua relação com o mundo, nem em sua relação com os outros.

Assim, nem a segurança nem o risco são modos de autorrealização e autocriação. O gosto pela vida implica uma dialética entre risco e segurança, entre a capacidade de questionar-se, de surpreender-se, de inventar-se, e aquela de se manter fiel ao essencial de seus valores ou de suas estruturas de identidade. É porque podemos perdê-la que a existência é digna de valor. O consentimento ao risco, aliás, não exclui nem o cálculo nem a prudência, como a filosofia de Aristóteles . A distância reflexiva em relação ao mundo se deve à convicção de que uma parte inesperada é sempre previsível. Quem cede à precipitação demonstra uma avaliação lacunar da situação, cujas consequências não tardam. A prudência se impõe como uma qualidade moral essencial ao homem político ou ao cidadão que assume uma responsabilidade para com outrem. Ela é a consciência aguçada daquilo que qualquer decisão implica em termos de consequências indesejáveis para si mesmo e os outros.■

 

Leia Mais

- O corpo e as novas tecnologias. Entrevista com David Le Breton, publicada na revista IHU On-Line, número 121, de 01-11-2004.

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