Edição 206 | 27 Novembro 2006

Amar verbo intransitivo

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V CICLO DE ESTUDOS SOBRE O BRASIL

O próximo Ciclo de Estudos sobre o Brasil vai trazer o livro Amar, verbo intransitivo, primeiro romance de Mário de Andrade. A obra tem como finalidade a crítica aos costumes burgueses, com suas mazelas e hipocrisias. Escrita entre 1923 e 1924, foi publicada em 1927, e seu texto caracteriza-se pela violação dos hábitos narrativos vigentes na época. A professora de Letras da Unisinos Márcia Lopes Duarte, doutora em Literatura Comparada, será a palestrante do evento, que acontece no dia 28 de novembro, na sala 1G119, às 19h30min. Confira abaixo, a entrevista exclusiva com a professora.

Como as relações humanas se deterioram

IHU On-Line – Qual é a atualidade da obra O Amar verbo intransitivo, de Mário de Andrade?

Márcia Lopes Duarte
- A obra é extremamente atual, visto que apresenta um tema contemporâneo, a possibilidade de uma iniciação sexual programada. A perspectiva abordada por Mario de Andrade diz respeito ao modo como as relações humanas se deterioram no mundo do consumo. Para tanto, ele cria uma família modelo, se tomarmos o padrão vigente, composta por pai, mãe, um filho homem e três filhas mulheres. O pai, preocupado com a possibilidade de o filho vir a ser enganado por alguma moça que estivesse interessada apenas em seu dinheiro, contrata uma governanta para iniciá-lo sexualmente. O que está em jogo, nesse processo, é a diluição das relações afetivas, que passam a ter um valor de consumo, por isso podem ser vendidas e compradas.

IHU On-Line - Como o Brasil é retratado na obra? Quais as semelhanças com o Brasil de hoje?

Márcia Lopes Duarte
- O Brasil é visto como uma terra de oportunidades, uma vez que os estrangeiros tinham possibilidade de ter emprego aqui, coisa que talvez faltasse aos próprios brasileiros. Há uma ironia acentuada na obra, pois o narrador é bastante ambíguo no que se refere aos estrangeiros, uma vez que eles aparentam superioridade, mas ocupam posições de inferioridade. Também há uma crítica ao nacionalismo de fachada, através do qual se enaltece o país, mas cultua-se os hábitos estrangeiros como superiores. O Brasil de hoje sofre destes mesmos males, ou seja, há muitos que se ufanam do país, mas, na verdade, não perdem a oportunidade de se curvar aos modismos estrangeiros, sem questionar o conteúdo deles.

IHU On-Line – Que figuras importantes ganham espaço nas páginas do livro?

Márcia Lopes Duarte
- O livro é uma ficção, não apresenta, portanto, personagens históricas. A personagem em destaque é Elsa, uma governanta alemã, que se julga bastante superior aos brasileiros, mas que ganha a vida iniciando sexualmente os meninos das famílias da elite nacional. Ela é extremamente ambígua, pois se dedica ao seu “trabalho” com afinco, deixando-se, por vezes, envolver em suas relações, que deveriam ser puramente comerciais. Entretanto seu grande sonho para o futuro é voltar à Alemanha e constituir uma família.

IHU On-Line – Como a senhora classifica Mário de Andrade como intérprete do Brasil?

Márcia Lopes Duarte
- Mário de Andrade é um intérprete do Brasil porque ele tem a intenção, em toda a sua obra, tanto literária como crítica ou teórica, de mostrar um país autêntico, um país sem os véus da cultura européia e europeizante que lhe serviam de empréstimo. O Brasil construído por Mário de Andrade, ainda que, por vezes, nos pareça pitoresco, por força de suas excentricidades, é um país novo, no que diz respeito ao âmbito do literário e no que concerne à caracterização de uma identidade nacional. Assim sendo, Mário é o intérprete de um país plural, que abrange as mais variadas manifestações culturais e se projeta para o futuro embalado pelos ideais críticos do modernismo.

 

 

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