Edição 471 | 31 Agosto 2015

Da chatice democrática à falta de projeto

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Ricardo Machado

Os desafios que as crises contemporâneas impõem ao cenário político brasileiro

Frente a uma conjuntura complexa e que muda rapidamente, as interpretações sobre o Brasil da atualidade passam por inúmeras dimensões e requerem diversas chaves de leitura para compreendermos melhor os processos em que estamos imersos. O sítio do Instituto Humanitas Unisinos - IHU, nas Notícias do Dia, publicou uma série de entrevistas com pensadores do cenário nacional, que ajudam a destrinchar as questões de fundo por trás do atual colapso em que o país mergulhou.

As mais de duas décadas de repressão militar no Brasil, no imaginário social, desenvolveram a vulgar ideia de que o caminho para o desenvolvimento nacional viria tão somente com a retomada da democracia. O fato é que a reabertura política e a retomada dos direitos civis com a Constituição de 1988 não foram suficientes para desmanchar os pactos seculares entre as oligarquias econômicas e as classes políticas governantes.

Agenda Brasil

A Agenda Brasil, um conjunto de regras para “salvar o Brasil da crise”, foi apresentada pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, como alternativa às crises. Mais uma vez, a voz das ruas foi silenciada e a saída vem por cima, de forma um tanto quanto constitucional e pouco democrática. Oposicionistas ao governo de Dilma pedem impeachment, situacionistas alegam que há nesse desejo uma retórica golpista. 

Golpe

“Se há intento de derrubar a estrutura de poder louvada em festividades da década passada em luxuosos hotéis de Brasília, a oposição com o espírito da UDN precisa chegar em Luiz Inácio para consumar o golpe branco em andamento, apesar das evidências de criminalização inequívocas por parte do partido de governo e o conluio com o grande capital contratista do Estado. Neste item, o PT imitara seus aliados e os governos anteriores”, avalia Bruno Lima, em artigo publicado nas Notícias do Dia, no sítio do IHU.

Na avaliação de Marcelo Castañeda, não há disputas na crise política, mas composição, e avalia que se houve golpe, ele foi dado em Junho de 2013. “Se houve golpe, ele foi dado pelo próprio PT ao longo dos seus governos, mas em especial a partir de junho de 2013, quando o partido morreu como possibilidade de construir alternativas à esquerda na medida em que preferiu a repressão ao diálogo”, critica.

Desafios

Reconhecido por sua proximidade com o PT e com o ex-presidente Lula no momento de fundação do Partido dos Trabalhadores - PT, Chico de Oliveira gradualmente e crescentemente se distanciou do partido, tanto que atualmente é filiado ao Psol. Para ele, a democracia permitiu com que mais pessoas tivessem acesso a bens de consumo, permitiu maior liberdade, menos abuso policial e a possibilidade de escolhermos nossos representantes. Entretanto, ele dispara: “A democracia ocorre, e é chata”.

Na sua avalição, o Estado perdeu o protagonismo no estabelecimento dos rumos da economia e, segundo seu prognóstico, o tecnicismo econômico tornou-se mais poderoso que a própria política. “Seja com a Dilma ou qualquer outro presidente, FHC ou mesmo o Lula de novo, o Estado não tem mais a importância que tinha na era Vargas. Isso acontece porque a economia mudou, e a economia brasileira é mais poderosa hoje e importante internacionalmente, e a ação do Estado é menos decisiva. Ou seja, não se mudam as relações de força no interior da economia como se mudava antes”, constata.

Sem surpresas

Carlos Lessa, ex-reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ e ex-presidente do BNDES, insiste em sua tese de que não tem como construir uma economia sólida sem a reconstrução de um projeto de país de longo prazo. “Qual é o Brasil que você sonha? A primeira grande pergunta é essa. Essa pergunta não foi feita, porque o debate brasileiro não chega a isso”, provoca. 

“Na verdade, se você prestar atenção, o corte está sendo feito em cima dos setores da economia brasileira que não dependem ou não vivem do sistema financeiro. Enquanto isso, o lucro do último trimestre dos bancos cresceu de maneira espantosa — os lucros do Bradesco, Itaú e Banco do Brasil estão mais de 15% acima em relação ao último trimestre do mesmo período do ano passado”, pontua Lessa.

Notícias do Dia

As análises e citações desta reportagem são excertos das entrevistas especiais e artigos publicados no sítio do Instituto Humanitas Unisinos – IHU (ihu.unisinos.br). Acompanhe diariamente, nas Notícias do Dia, os diversos artigos, entrevistas, reportagens e análises publicadas pelo IHU. Para ler a íntegra das entrevistas publicadas neste texto, acesse o link disponibilizado na seção Leia mais. ■

Leia mais...

- A crise política e os limites da democracia liberal como vetor de desenvolvimento soberano no Brasil e na América Latina. Artigo de Bruno Lima Rocha publicado nas Notícias do Dia, de 04-08-2015, no sítio do IHU;

- Crise política: não há disputa. Há uma composição. Entrevista especial com Marcelo Castañeda publicada nas Notícias do Dia, de 18-08-2015, no sítio do IHU;

- "A democracia brasileira é chata. Não entusiasma ninguém". Entrevista especial com Francisco de Oliveira publicada nas Notícias do Dia, de 20-08-2015, no sítio do IHU;

- “Essa Agenda Brasil é uma fraude. A prioridade absoluta deve ser tomar conta da rede urbana”. Entrevista especial com Carlos Lessa publicada nas Notícias do Dia, de 20-08-2015, no sítio do IHU;

- A nova direita e o objetivo estratégico do impeachment quase inalcançável. Artigo de Bruno Lima Rocha publicado nas Notícias do Dia, de 28-08-2015, no sítio do IHU.

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