Edição 444 | 02 Junho 2014

Direito e literatura em cinco obras

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Ricardo Machado

O professor Lênio Streck apresenta algumas das grandes narrativas literárias em perspectiva aos fenômenos jurídicos
Antígona – Sófocles

Lênio Streck apresenta cinco clássicos da literatura ocidental que nos ajudam a estabelecer atravessamentos com as atividades de natureza jurídica. A proposta é oferecer aos leitores alguns exemplos concretos de obras que ajudam a compreender melhor as relações entre as duas áreas.

Lênio Luiz Streck cursou mestrado e doutorado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC e pós-doutorado pela Universidade de Lisboa. Atualmente, além de professor da Unisinos, é visitante da Universidade de Coimbra, Roma Tre e Universidade Javeriana, na Colômbia. É presidente de honra do Instituto de Hermenêutica Jurídica, membro catedrático da Academia Brasileira de Direito Constitucional e procurador de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Entre seus livros publicados citamos Hermenêutica jurídica e(m) crise (10 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008) e Verdade e Consenso: Constituição, Hermenêutica e Teorias Discursivas - da possibilidade à necessidade de respostas corretas em direito (4.ed. Saraiva, 2011). Seu site pessoal é http://www.leniostreck.com.br/.

Confira as dicas.

 

Antígona – Sófocles

Esta tragédia, representada pela primeira vez em 441 a.C., é um belíssimo texto para a compreensão do fenômeno jurídico. Por meio da oposição entre Antígona e Creonte, é possível perceber, pelas mãos de Sófocles, que o Direito não cabe inteiramente na lei. Assim, muitos séculos antes do positivismo exegético, os gregos já haviam desmistificado a “equiparação” ou “igualação” entre lei e Direito.      

 

Medida por medida – Shakespeare

No início do século XVII, Shakespeare antecipou a discussão hermenêutica que será o centro das preocupações dos juristas do século XIX até os dias atuais. Medida por Medida desvendou o mistério que existe entre as concepções objetivistas e subjetivistas no âmbito do Direito. Nesse sentido, o texto shakespeariano permite o desvelamento das debilidades de dois modelos de decisão judicial que ainda continuam vigentes na contemporaneidade. A atitude de Ângelo, ao condenar à morte o jovem Cláudio pelo crime de fornicação, mostra um modelo formalista de justiça, naquilo que, séculos depois, foi marcado como o “juiz boca da lei”, fruto do positivismo exegético francês. Do mesmo modo, Ângelo, ao propor a soltura/absolvição de Cláudio em troca do amor de Isabela, mostra-se como o contraponto voluntarista do positivismo do século XIX. De escravo da lei, Ângelo se transforma em “dono da lei”. Do “mito do dado” à “vontade do juiz” ou “à vontade de poder” do juiz. 

 

O mercador de Veneza – Shakespeare

Neste texto, Shakespeare problematizou alguns temas muito caros à modernidade, como a necessidade da interdição por meio da lei e os riscos do voluntarismo judicial numa comunidade política. Assim, a partir da juíza Pórcia, é possível refletir sobre as consequências negativas do solipsismo judicial para o fortalecimento da autonomia do Direito. Tão importante é esse texto do bardo que Von Ihering dedica parte de sua introdução do livro A Luta pelo Direito à discussão acerca da temática da segurança jurídica. Ihering, então ainda adepto da pandectística — versão alemã do positivismo exegético francês —, critica a decisão que impediu a Shylock de executar seu contrato. Anos depois, o jusfilósofo alemão muda de ideia, ao escrever o livro A Finalidade do Direito.   

 

Os últimos dias de um condenado - Victor Hugo

Este é um texto essencial para se compreender o que é decidir por princípio. O livro fala de um condenado à morte sem que em algum momento seja revelado o crime e as circunstâncias de ele ser culpado ou inocente. Victor Hugo, simplesmente por princípio, é contra a pena de morte. Não importa o crime. Ele era contra. Isso é “princípio”. Desse modo, segundo o exemplo de Victor Hugo, devemos ser contra a pena de morte por princípio e não conforme as conveniências do caso.

 

As idéias do canário - Machado de Assis 

Entre tantas questões que podem ser refletidas a partir deste conto machadiano, está a atuação da dogmática jurídica e do senso comum teórico que domina a atividade dos juristas. Afinal, qual é o tamanho do nosso mundo? Podemos construir uma doutrina e uma jurisprudência melhores do que as que temos aqui? Ou o mundo jurídico (o imaginário dos juristas) é uma gaiola pendurada em uma loja de quinquilharias? Existe um espaço infinito e azul no universo dos juristas? 

 

Leia mais...

- “Montesquieu nunca pensou em um Judiciário nos moldes brasileiros”. Edição 383 da IHU On-Line, de 05-12-2011; 

- Uma análise sociológica do direito. Edição 305 da IHU On-Line, de 24-08-2009;

- Reféns da Lei. Que justiça é essa? Edição 269 da IHU On-Line, de 18-08-2008.  

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