Edição 407 | 05 Novembro 2012

Deus não intervém no Universo, mas sustenta o sistema, que tem vida própria

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Márcia Junges, Luís Carlos Dalla Rosa e Isaque Gomes Correa | Tradução: Sílvia Ferabolli

Temerosa de um mundo em constante mudança, a instituição milenar está transitando em um paradigma equivocado, assinala o teólogo Roger Haight. Deus está “dentro” da História, e não intervém no sistema finito porque Ele é infinito

Nas décadas de 1960 e 1970 a Igreja Católica ganhava novos ares na esteira do Concílio Vaticano II e passava a dialogar mais com o mundo. Veio, então, o papado de João Paulo II, e com ele o medo de onde isso poderia levar essa instituição milenar, pondera o teólogo jesuíta Roger Haight, na entrevista que concedeu pessoalmente à IHU On-Line. “Todos estão familiarizados com a ideia de que a Igreja Católica é uma instituição que não muda. Essa é a sua reputação mundo afora e em Roma há bastante orgulho disso”, acrescentou. Contudo, o mundo de hoje é totalmente diferente e a mudança em si mesma é o que rege seus acontecimentos. A Igreja, por sua vez, “caminha junto ao paradigma errado”, e aspira por uma posição estável, como se a mudança fosse ruim. “A Igreja está tão fora de contato com a realidade que ela nem ao menos tem um paradigma básico, uma visão da realidade que esteja em contato com o que restante do mundo pensa”. Assim, pode-se compreender que não haja um interesse verdadeiro no diálogo inter-religioso, mas sim numa ideia de conversão. “A Igreja Católica romana não está aberta nem ao menos para os movimentos ecumênicos. No segundo Concílio essa ideia foi mencionada, mas nunca saiu do papel, nunca houve um movimento real por parte da Igreja Católica romana para fazer avançar o movimento ecumênico”.

Recuperando ideias panenteístas, Haight acentua que não há intervenção divina no sistema do mundo: “Deus não intervém, mas segura/sustenta a estrutura que tem vida própria, sujeita a leis e eventos aleatórios que criam movimento”. E explica: “Deus não age no sistema como causa finita porque Deus é infinito. Deus age no Universo como causa infinita para controlar o todo do sistema, e o sistema como um todo, no ser e no mover do Universo”.

Roger Haight é ex-presidente da Sociedade Teológica Católica dos EUA e professor visitante no Union Theological Seminary, em Nova Iorque, uma tradicional casa de formação de teólogos fundada em 1836 como uma instituição presbiteriana e onde estudaram grandes nomes da teologia mundial. Foi professor de Teologia por mais de 30 anos em escolas da Companhia de Jesus em Manila, Chicago, Toronto e Cambridge. Foi professor visitante em Lima, Nairóbi, Paris e em Pune (Índia). De sua produção bibliográfica, citamos: Jesus, símbolo de Deus (São Paulo: Paulinas, 1999); Dinâmica da teologia (São Paulo: Paulinas, 1990) e O futuro da cristologia (São Paulo: Paulinas, 2005).

Em 04-10-2012, Haight proferiu a conferência A semântica do Mistério da Igreja hoje. Uma abordagem cristológica, como parte da programação do XIII Simpósio Internacional IHU Igreja, cultura e sociedade. A semântica do Mistério da Igreja no contexto das novas gramáticas da civilização tecnocientífica, promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

Confira a entrevista.


IHU On-Line – Por que a Igreja perdeu relevância pública?

Roger Haight –
Eu acredito que se possa responder a essa pergunta usando-se as lentes da história. Para mim, a história recente começa com a Revolução Francesa, quando a Europa é virada de “cabeça para baixo”. Aquela era uma época de caos político no continente, quando as pessoas começaram a se afastar do liberalismo político e buscam formas de autoridade mais estáveis. A sociedade europeia então olha para o papado – e o papado mantem-se firme no resguardo de sua instituição, dado que a Europa era muito cristã, mesmo depois da Reforma. Então, houve uma mudança para a autoridade e isso se refletiu no primeiro Concílio Vaticano, quando o papa passou a ser considerado infalível, o que refletia essa necessidade de autoridade. Mas o que aconteceu na Igreja Católica é que a autoridade, estabelecida com a infalibilidade – entendida não só como dogma, mas como símbolo – se firmou “contra” a ciência, “contra” a história (e contra a disciplina da história, o que é crítico, já que permite que se reexamine o passado e se reinterprete o passado) e as ciências sociais que estavam emergindo na época (pense em Darwin e na teoria evolucionista, no marxismo e no relativismo). O sistema autoritário da Igreja Católica se posicionou contra tudo isso.


Retrocesso

Com o Concílio Vaticano I  e com a tentativa da Igreja Católica de integrar a modernidade na virada daquele século (o que é chamado de “modernismo” ou “modernismo católico”) que a Igreja Católica rejeitou, ela se posicionou fora do alcance do pensamento intelectual vigente. Na Europa, assim como nos Estados Unidos e na América Latina, onde a ciência e a filosofia progrediam, onde a história estava progredindo e a Igreja Católica se mantinha firme no seu dogmatismo, essencialmente não era permitido que teólogos pensassem. Não era permitido a eles se ajustarem às novas tendências da cultura intelectual. Em termos gerais, isso significa que a Igreja ficou culturalmente para trás. O crescimento da autoridade depende de “expertise” e conhecimento, e não apenas daquilo que você diz. Não é dependente de visões dogmáticas do mundo, mas de conhecimento. Então o Concílio Vaticano II  tentou mudar isso. Eu senti que, por volta das décadas de 1960 e 1970, a Igreja estava ganhando voz no mundo novamente, e que estava se transformando em uma organização que dialogava com o mundo – que aprendia com esse mundo e falava com esse mundo. Durante o papado de João Paulo II – medo. Com “medo” eu quero dizer: para onde isso está nos levando? O que aconteceu com o antigo sistema que se tinha na Polônia? O que aconteceu com o antigo catolicismo? Então nós retrocedemos ao período pré-Concílio Vaticano II. Um período que condenava o modernismo e é o mesmo que temos hoje: teólogos estão sendo condenados por ajustar a fé da Igreja de modo a promover o diálogo com a sociedade com credibilidade. Essa é a minha visão de como a Igreja perdeu sua habilidade – sua autoridade religiosa – de modo a dar conta de e dialogar com o mundo moderno.


IHU On-Line – Essa perda de autoridade tem ocorrido apenas na Igreja Católica ou em outras instituições também?

Roger Haight –
Nos Estados Unidos não existe uma única instituição que goze de autoridade. Nenhuma. Nem empresas, nem políticos, nem a igreja, nem a universidade, nem a família que tem sido desacreditada, vide o fato de que mais de 50% dos casamentos americanos terminam em divórcio e filhos de pais divorciados tendem a pensar que a família não deve ter autoridade sobre eles.


IHU On-Line – Você acha que essa erosão da autoridade é um problema da nossa época?

Roger Haight –
Eu dou aulas em um seminário de protestantismo liberal, onde a palavra “autoridade” não é vista com bons olhos. “Normatividade” ou “normas” não são vistas como palavras positivas. E eu acredito que isso pode ser verdade, quero dizer, em uma sociedade aberta, com comunicações via internet, não existe um comportamento motivador que vai convencer a todos. João Paulo II e Bento XVI estão certos em temer o relativismo, mas existe uma terceira alternativa entre o relativismo e o dogmatismo. Essas não são as duas únicas opções. Existem outras maneiras de se reclamar autoridade. Existem muitas profissões que gozam de “alguma” autoridade – não autoridade absoluta, mas alguma autoridade. Existem médicos que são confiáveis. Assim como professores, cientistas e pais que também merecem crédito. Então não é algo como: ou existe autoridade, ou não existe nenhuma autoridade. Mas, como regra geral, precisa-se encontrar autoridade digna de confiança e digna de ser valorizada.


IHU On-Line – Em entrevista à nossa revista , o senhor afirmou que “a Igreja institucional permanece escandalosamente inalterada”. O que o leva a essa constatação? Quais são as consequências dessa postura conservadora?

Roger Haight –
Todos estão familiarizados com a ideia de que a Igreja Católica é uma instituição que não muda. Essa é a sua reputação mundo afora e em Roma há bastante orgulho disso. É por isso que no século XIX as pessoas começaram a olhar para além das montanhas e a buscar nessa instituição chamada papado a estabilidade em um mundo de mudanças. Então, até hoje Roma se orgulha de ser uma instituição estável em um mundo que está mudando, e é por isso que as pessoas podem recorrer a ela para dar sentido a sua existência. A Igreja é a representante da palavra de Deus e da nossa relação com Deus como algo estável e não passível de sofrer mudanças. Mas me parece que vivemos em um mundo diferente daquele de meados do século XIX. Hoje, Darwin é aceito como uma visão de mundo, o registro paleontológico e a descoberta da origem do universo e do nosso planeta, da origem da vida; fez as pessoas perceberem que “mudança” não é uma exceção, mas a regra; que “mudança” é a natureza da realidade. No período clássico, a estabilidade e a permanência eram vistas como o mecanismo padrão. Então o mundo mudou literalmente. É como uma revolução copernicana. O homem não é mais o centro do mundo, a Terra não é mais o centro do universo – nós somos parte de um universo maior. É esse tipo de mudança, onde a sua imagem da realidade muda, e ser humano é ser parte de um projeto que está sempre avançando.


Paradigma errado

A humanidade é muito diferente hoje do que era no século XIX. E o ritmo da mudança, não só a mudança em si, está também mudando, cada vez mais e mais rápido. Basta ver a revolução na ciência da computação. Então, a Igreja está caminhando junto do paradigma errado, junto a uma visão errada. Ela ainda tem essa visão de que a posição estável é uma posição de não mudança, e que a mudança é uma coisa ruim que precisa ser explicada. Nós estamos em um mundo diferente hoje.
O mundo está mudando, e se você quiser dizer que a igreja cristã – ou a Igreja Católica – é a mesma de dois mil anos atrás, você vai ter que explicar muita coisa. O problema é explicar como poderia ser possível que as coisas todas permanecessem imutáveis. Como ela pode ser a mesma se a própria natureza da realidade é a mudança? E a mudança é algo positivo – vide a ideia darwiniana das espécies mudando, se adaptando à realidade. Então é por isso que é escandaloso: porque a igreja está tão fora de contato com a realidade que ela nem ao menos tem um paradigma básico, uma visão da realidade que esteja em contato com o que restante do mundo pensa.


IHU On-Line – Tomando em consideração essas afirmações sobre a Igreja e as mudanças no mundo, acredita que é necessário um novo Concílio?

Roger Haight –
Sim, por causa da situação em que nos encontramos. Muitas pessoas dizem que nós não precisamos de um terceiro Concílio, porque o segundo ainda não foi implementado. Mas o Concílio não é apenas um conjunto de documentos, e nós não queremos um novo conjunto de documentos. Essa não é a razão. Os concílios também são “eventos” públicos que marcam a história como pontos de referência, e por isso eu sou a favor de um novo Concílio. Contudo, ele não seria o tipo de Concílio que tivemos no passado, pois não acredito que seja possível, em termos logísticos, reunir todos os bispos do planeta em um só lugar, mas algum tipo de reunião mundial, na qual poderia haver uma discussão honesta sobre a situação da Igreja no mundo hoje. Então, se o terceiro mundo, o mundo “não europeu” ou não norte-americano puder ter uma voz verdadeira no futuro da Igreja, então eles deverão estar presentes como não estiveram em nenhum outro Concílio anterior.


IHU On-Line – O senhor percebe uma vontade de hegemonia no diálogo inter-religioso por parte da Igreja Católica ou há um real interesse em se abrir à alteridade religiosa?

Roger Haight –
Antes de continuar, devo dizer que quando digo “igreja” não estou me referindo apenas à Igreja Católica Apostólica Romana, mas a todo o povo de Deus, protestantes, ortodoxos, anglicanos. Tendo dito isso, se quando você se refere a “igreja” está se referindo à Igreja Católica, na sua mais alta hierarquia, como uma instituição que tem o papa como seu líder maior, então eu digo que não, que não há interesse em um verdadeiro diálogo, ou melhor, existe interesse no diálogo inter-religioso, mas por trás disso existe sempre a ideia de conversão. A Igreja de Roma não está aberta nem ao menos para os movimentos ecumênicos. No segundo Concílio essa ideia foi mencionada, mas nunca saiu do papel, nunca houve um movimento real por parte da Igreja Católica Apostólica Romana para fazer avançar o movimento ecumênico. A única ação que eles apontam foi um decreto no final da década de 1990 sobre justificação – mas quem está interessado nisso? “Foi uma doutrina, nós lutamos por ela no século XVI, mas ninguém mais se importa com isso...”, dizem. Então, muitas pessoas dirão que a Igreja está interessada porque fez o movimento simbólico, mas isso é apenas isso – um símbolo, nada mais do que um símbolo vazio.


Interesse raso

Agora vamos falar da Igreja como povo de Deus – se eles estão interessados no diálogo inter-religioso. Depende. Em algumas culturas, sim; em outras, talvez. Nas Filipinas, onde trabalhei por bastante tempo, não existe um interesse genuíno pelo diálogo ecumênico porque essa é uma nação cristã, com apenas alguns poucos metodistas ou anglicanos residentes – um número irrelevante e que faz pouca diferença. Existe também uma parcela significativa da população, por volta de um quarto, que são muçulmanos, mas os cristãos não estão interessados em dialogar com eles, apenas em conviver. Não há interesse em criar um diálogo inter-religioso, mas em manter a paz. Manter a paz é importante para manter o canal de comunicação aberto, mas não há interesse genuíno em “aprender” algo com os muçulmanos.
Por outro lado, em outras culturas pluralistas, como a Europa, por exemplo, que está se tornando uma cultura cada vez mais diversificada, e os Estados Unidos, que também são bastante plurais, existe um grande interesse em outras religiões. Alguns dizem que esse é um interesse raso, que eles querem saber apenas das “tecnicalidades” dessas outras religiões. Por outro lado, existem muitos cristãos e judeus que são budistas sérios hoje. Em sociedades abertas e seculares, onde existe a separação entre a Igreja e o Estado, eu acredito que exista uma grande dose de vontade de promover o diálogo inter-religioso, mas não apenas para manter a paz, senão para aprender de maneira genuína com o “Outro” e, talvez, mudar a minha própria vida espiritual por causa da influência da alteridade.


IHU On-Line – Percebe algum avanço na relação da Igreja Católica com as mulheres?

Roger Haight –
Novamente eu terei que fazer uma distinção entre a igreja como a alta hierarquia, os bispos, etc., para então dizer que não, não houve nenhum avanço. Houve, inclusive, um endurecimento de posição. Tenho certeza de que vocês estão cientes dos ataques a Elizabeth Johnson , uma teóloga feminista muito conhecida que escreveu um livro seis ou sete anos atrás e que foi condenado no ano passado. Elizabeth foi condenada não por causa do conteúdo do livro, mas porque ela é uma feminista. Eles quiseram constrangê-la, obstruindo sua autoridade perante a comunidade católica. Então não há nenhum interesse. Algumas pessoas dizem que João Paulo II falava, infalivelmente, que as mulheres não podem desempenhar um papel de liderança na igreja. Por outro lado, e eu acredito que isso seja verdade nos Estados Unidos e, cada vez mais, também em outros lugares do mundo, em alguns círculos específicos, que existe interesse no feminismo e na igualdade entre os gêneros. Certamente, a maioria das pessoas que são católicas nos Estados Unidos são a favor da ordenação de mulheres. Não há dúvidas, estatisticamente falando.


IHU On-Line – Então existe uma diferença entre a alta hierarquia católica e a base da igreja nesse sentido. Dessa forma, você acredita que a maneira mais provável/fácil de promoção de mudança seria através de suas “bases”, ou poderíamos esperar algo do papado ou dos bispos?

Roger Haight –
É por isso que eu acho que seria uma boa ideia ter um novo Concílio, para que houvesse uma discussão livre onde as pessoas da América Latina pudessem conversar com asiáticos, australianos, europeus. Em outras palavras, pode haver intercâmbios, e intercâmbios rompem medos, pois mostram que as coisas podem ser feitas de maneiras diferentes. Dentre os resultados interessantes do Vaticano II estão menos àqueles relacionados aos documentos oficiais, e mais ao diálogo que aconteceu e que mudou as cabeças das pessoas. Quando o Concílio começou, eles tinham todos esses documentos preparados para ele – a mesma coisa de sempre – mas gradualmente os bispos começaram a dizer: nos não precisamos fazer isso de novo, podemos ter novas ideias, é possível haver diálogo entre bispos e teólogos e, na verdade, aconteceram grandes debates entre bispos e teólogos durante os cinco anos do Concílio Vaticano II. Houve uma grande troca de ideias entre eles – e confiança, porque todos estavam tentando fazer o que era melhor para a Igreja.

Contudo, agora existe uma grande desconfiança entre os bispos e a alta hierarquia. Então a pergunta é: a mudança vem de cima, ou de baixo? Da onde veio a mudança no Vaticano II? Veio de baixo ou veio de cima? Na verdade, veio um pouco dos dois. Houve movimentos teológicos, ecumênicos, litúrgicos, houve estudos de escrituras “de baixo” – e havia grandes teólogos e também pessoas comuns pensando sobre os temas discutidos. Também havia João XXIII e Papa Paulo VI, então eu não posso atribuir responsabilidade às bases ou à alta hierarquia pelas mudanças – até porque sem o estímulo das bases não haverá movimento nas camadas superiores. Então, acredito que existe essa dinâmica entre as camadas de bases e aquelas mais superiores da igreja no que diz respeito à possibilidade de mudança.


IHU On-Line – O universo é um sistema aberto. Em que medida essa concepção deixa de lado a tradicional causalidade linear aristotélica e abre espaço para a complexidade e formas de causalidade diferentes?

Roger Haight –
Eu sou um seguidor de Thomas Kuhn  nesse sentido. Kuhn se baseou no sistema aristotélico, mas o modificou, porque esse tinha um deus e então era preciso dar conta da causalidade dele. Ele foi um pouco além do “aquele que move, mas não é movido” aristotélico e pensou em dois tipos de causalidade: uma causalidade de força motriz (primary force / primary causality) e a segunda é a causalidade secundária. Então, todo o Universo é regido pela causalidade secundária, e atrás dessa causalidade secundária está Deus, o Criador, sustentando todo o sistema existente. Assim, Deus não está intervindo, mas segurando/sustentando. Deus não intervém, mas segura/sustenta a estrutura que tem vida própria, sujeita a leis e eventos aleatórios que criam movimento. Então a questão é: há duas formas de causalidade, e é preciso não confundir Deus com a causalidade secundária. Deus não age no sistema como causa finita porque Deus é infinito. Deus age no Universo como causa infinita para controlar o todo do sistema, e o sistema como um todo, no ser e no mover do Universo.


IHU On-Line – A ideia de Deus estar “dentro” da história e não intervir nela tem raízes panteístas? Por quê?

Roger Haight –
Eu fico tentado a usar a palavra “panenteísmo”, mas eu temo que no mundo de fala inglesa “panenteísmo” seja uma palavra “ruim”. Ela está relacionada com uma escola particular de teologia e filosofia que cunhou o termo e, por isso, tem um entendimento diferente de Deus como um ser atomístico. Mas se você toma o termo simplesmente como uma palavra, então eu chamaria esse sistema de panenteísta, mas não panteísta. Não é difícil de entender. Se você consegue entender os dois tipos de dualidade verá que tudo está em Deus, e Deus esta em tudo. Então Deus esta lá, presente, agindo e sustentando a realidade. Tudo está em Deus e Deus está em tudo, mas a criação não é Deus. Eu não sou Deus. O mundo não é Deus. O mundo é precisamente o que Deus fez que não é Ele, e que está fora e é autônomo em relação à realidade divina. Deus está dentro da realidade e a sustenta. Então, é tanto imanência, quanto transcendência: é a transcendência mais o poder de estar dentro do mundo, sustentando-o. Na verdade, tudo o que tem a ver com a vida espiritual é assim: imanente e transcendente. Isso é o que os místicos sabem há bastante tempo.


Leia mais...

Confira outra entrevista concedida por Roger Haight à IHU On-Line:

* “A Igreja institucional permanece escandalosamente inalterada”. Edição 403, de 24-09-2012

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