Edição 405 | 22 Outubro 2012

O Bóson de Higgs e a elegância invejável do Universo

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Márcia Junges

Partícula recentemente descoberta no CERN não resolve todas as incógnitas das teorias atuais, e inclusive cria novos problemas, observa Arthur Maciel. Talvez essa seja a ponta de “um grande iceberg de novos fenômenos físicos” que entusiasma os cientistas

Mesmo que em ciência o fim de um capítulo represente o início de outro, a comprovação da existência do Bóson de Higgs é mais uma “evidência de que o ‘nada’ é surpreendentemente rico em fenômenos críticos à nossa compreensão do Universo”. A constatação é do físico Arthur Maciel, na entrevista que concedeu à IHU On-Line por e-mail. Sob o prisma da física quântica, essa partícula é entendida como uma “consequência daquilo que chamamos uma ‘condensação do vácuo’”, que é uma das muitas “possibilidades de ocorrência em função destas propriedades físicas adquiridas pelo vácuo quântico”. De acordo com o cientista, “a propagação das demais partículas (tais como os elétrons) através deste vácuo condensado, faz com que elas adquiram uma espécie de inércia à qual associamos o conceito de massa. Daí dizer-se que o Bóson de Higgs é o responsável por gerar as massas das partículas”. Contudo, pondera, “trata-se de uma simplificação”. E acrescenta: “Se eventualmente as pesquisas que agora se revigoram em consequência da descoberta deste esperado Bóson de Higgs corroborarem a grande visão recentemente atingida sobre as leis da Natureza, saberemos que o Universo nos preparou um grande presente, nos revelou uma elegância invejável. Das simetrias majestosas exibidas pelas leis naturais, surge a possibilidade dos pequenos desvios, “travessuras” previstas pelas próprias leis, e a partir das quais surge a variedade assimétrica, surgem as formas estáveis da matéria, e os sistemas solares com seus planetas, e surge a química, e com ela a vida, e com esta a possibilidade de apreciação do céu noturno, das florestas e flores, das ondas marinhas e da música”.

Arthur Maciel é pesquisador em física de altas energias no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, no Rio de Janeiro, e membro de uma equipe no Fermilab que se dedicou à busca ao Bóson de Higgs nos últimos anos. A descoberta deu-se inequivocamente no CERN, observada de perto pelo Fermilab, já que as equipes têm diversos membros em comum. Maciel é graduado e mestre em Física pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio, doutor pela Universidade de Oxford e pós-doutor pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas – CBPF.

Confira a entrevista.


IHU On-Line – Em quais aspectos o Bóson de Higgs completa um capítulo fundamental nos nossos esforços para compreender os elementos básicos que compõem o Universo?

Arthur Maciel –
Imagine-se um detetive que tenta solucionar um caso muito importante, mas igualmente complexo, com diversas ramificações, interdependências de fatos, e consequências significativas para a sociedade e o conhecimento humano em geral. Este detetive trabalha por quase 50 anos, consegue reconstruir uma história convincente para o caso, tem todos seus personagens bem entendidos, enquadrados e localizados, mas... sua história gira em torno de um personagem central, necessário para que se dê sentido e lógica aos fatos, e este personagem é a evidência que falta para concluir a investigação. De certa forma este detetive representa a comunidade de físicos determinados a construir um modelo matemático capaz de descrever a estrutura elementar da natureza, capaz de organizar as propriedades das partículas que constituem a matéria e de descrever suas interações fundamentais. Desde julho último o tal detetive finalmente dispõe de evidências significativas de que o personagem que lhe faltava realmente existe e, ainda mais, que realmente teve o papel que lhe é atribuído na história. E que papel seria este? De acordo com o conhecimento teórico atual o Bóson de Higgs é uma peça central no mecanismo que nos permite explicar como as partículas elementares adquirem a propriedade a que chamamos de massa (intuitivamente associada a inércia, a peso). A partir das várias atribuições de massas temos a diferenciação, a diversidade dos elementos que observamos como componentes da matéria no Universo. E então, esta descoberta é um fim de capítulo? Aqui deixamos de lado nossa analogia investigativa para responder que sim e que não; porque em ciência qualquer fim de capítulo é também o início de outro.


IHU On-Line – Em que medida a comprovação da existência do Bóson de Higgs pode ser considerada um novo capítulo da Física?

Arthur Maciel –
É muito importante manter em mente que esta partícula recém-descoberta ainda não teve sua identidade claramente revelada. Todas as evidências encontradas até agora, tanto no CERN – Organisation européenne pour la recherche nucléaire como no Fermilab – Fermi National Accelerator Laboratory (dois laboratórios equipados com aceleradores de partículas), estão de acordo com as propriedades esperadas para o Bóson de Higgs. Mas ainda podem configurar uma pista falsa. Novamente uma analogia: “Terra à vista”. Trata-se de ilha ou de um continente? Um primeiro contato nunca apresenta um panorama completo. Faz-se necessária a aproximação, o estudo detalhado. No caso da partícula subatômica recém-descoberta, os pesquisadores já dispõem de uma lista substancial de experimentos, medidas, testes de várias de suas propriedades, que vão aos poucos compor um quadro mais completo sobre este bóson (as partículas elementares são classificáveis em dois grandes grupos, os bósons e os férmions). Neste exercício devemos estar preparados para eventuais surpresas, ou mesmo a verificação de que se trata de um impostor, de comportamento semelhante ao esperado para o Bóson de Higgs, mas não exatamente cumprindo o papel que dele se esperava. Mais perguntas: o Bóson ocorre sozinho na Natureza ou é apenas um membro, o primeiro a ser observado, de uma “família” de partículas com propriedades semelhantes? Serão vários anos de investigação.


IHU On-Line – Em que sentido o Bóson de Higgs “reivindica” que se reescreva a definição do “nada”?

Arthur Maciel –
Do ponto de vista da física quântica entendemos o Bóson de Higgs como uma consequência daquilo que chamamos uma “condensação do vácuo”. O conceito de vácuo em mecânica quântica é bem diverso àquele que nos é intuitivo e normalmente associado ao absolutamente vazio, ao nada. Em parte devido ao chamado princípio da incerteza, o vácuo quântico possui uma energia não nula e pode ser imaginado como um líquido em ebulição muito agitada e perene, onde as pequenas bolhas representam desvios instantâneos ao estado de relaxamento total que poderíamos associar com o vácuo clássico ou intuitivo. Estes desvios são possíveis desde que compatíveis com o princípio da incerteza, e sua coletividade gera uma energia associada ao vácuo, que portanto deixa de ser o vazio que imaginamos. O vácuo passa a ter propriedades físicas, e várias delas já foram observadas diretamente, como a capacidade de mudar carga de uma partícula em função de sua energia total. Tais observações são possíveis em experimentos com aceleradores de partículas.

Voltando ao Bóson de Higgs, a “condensação do vácuo” é uma das diversas possibilidades de ocorrência em função destas propriedades físicas adquiridas pelo vácuo quântico. Imagine-se agora um processo no qual toda a energia de agitação caótica advinda da ebulição mencionada acima se reorganize de forma distinta, uma espécie de transição de fase, assim como a água se reorganiza ao transitar (condensar) de vapor para líquido. Este vácuo agora mostra-se mais coerente e organizado, aparentemente mais calmo, e toda sua energia que antes mostrava-se caótica agora pode ser associada a algo como a pressão interna do líquido. Ao perturbar-se este líquido, o que acontece? A propagação de uma onda. Pois em nossa analogia esta onda é o Bóson de Higgs, a consequência direta de uma certa tensão armazenada no vácuo.

Continuando, a propagação das demais partículas (tais como os elétrons) através deste vácuo condensado faz com que elas adquiram uma espécie de inércia à qual associamos o conceito de massa. Daí dizer-se que o Bóson de Higgs é o responsável por gerar as massas das partículas. Trata-se de uma simplificação. De acordo com as teorias atuais, as partículas elementares adquirem suas massas a partir de uma interação com o vácuo em seu estado condensado. Essa condensação é, por sua vez, consequência do chamado “campo de Higgs” (uma entidade matemática) que atua como agente da transformação de fase. Transformado, o vácuo passa a conter as propagações (ondas) que associamos ao Bóson de Higgs recentemente descoberto. Dessa forma, o Bóson de Higgs representa mais uma evidência de que o “nada” é surpreendentemente rico em fenômenos críticos à nossa compreensão do Universo.


IHU On-Line – Como pode ser devidamente compreendido o apelido “partícula de Deus”, dado ao Bóson? Qual é o seu verdadeiro significado?

Arthur Maciel –
Pode-se dizer que este apelido é fruto de um equívoco ou mesmo de uma piada. De um modo geral ele perturbou a comunidade científica por sua sugestão, certamente não intencional, de que o Bóson de Higgs (ou para tanto qualquer outra partícula fundamental) poderia representar uma conexão entre a ciência e a religião. Obviamente tal questão não pode ser reduzida a termos tão simples, e mesmo situa-se totalmente fora do escopo científico. Então por que o apelido? Um ex-diretor do Fermilab (laboratório nos EUA que abriga um acelerador de partículas, o Tevatron) chamado Leon Lederman, físico de renome, prêmio Nobel em 1998, muito simpático e também irreverente, escreveu um livro de divulgação científica sobre o então hipotético Bóson de Higgs. E deu ao livro o título de The goddamned particle, ou “a partícula maldita”. Por quê? Simplesmente devido a todos os esforços já dispendidos até então para descobrir sua existência, e sem sucessos. Uma espécie de desabafo piadístico pela frustração dos cientistas. Ora, seu editor dissuadiu-o de um título assim agressivo, e sugeriu The God particle, que eventualmente “colou”. Tornou-se uma figura de referência para o Bóson de Higgs, gerando assim, e infelizmente, tanta discussão vazia, tantas interpretações e significados inexistentes. Naturalmente havia uma razão para a sugestão do editor de Lederman, mas nada de cunho religioso. Apenas o fato de que, devido à condensação do vácuo provocada pelo campo de Higgs, as partículas adquirem suas massas, e com elas suas identidades, e com as diferentes identidades, a enorme variedade que se observa na natureza. Por exemplo, pode-se dizer que a possibilidade da formação de átomos estáveis é uma consequência indireta desta condensação atribuída ao campo de Higgs. Ora, átomos estáveis geram os elementos que geram as moléculas, a química, os aminoácidos, a vida. Apenas uma sequência de processos naturais em evolução, e que não contribuem especificamente para a questão religiosa. Esta continua sendo uma opção pessoal, uma decisão de cada indivíduo, como sempre o foi.


IHU On-Line – Poderia explicar em que consiste o Large Hadron Collider – LHC, quais são suas características e como ele funciona?

Arthur Maciel –
Estamos acostumados com o fato de que, por exemplo, para explorar o mundo da microbiologia precisamos de microscópios. Para os fenômenos moleculares precisamos dos chamados microscópios eletrônicos. E se quisermos explorar um mundo de dimensões ainda alguns bilhões de vezes menor do que o das dimensões atômicas? É exatamente para isso que existem os aceleradores de partículas. E o LHC é um deles; o mais moderno, e o mais potente até então construído. Está instalado em um anel circular subterrâneo, algo como um túnel de metrô a cerca de 100 metros de profundidade, com 27 km de circunferência. Este túnel abriga equipamentos extremamente sensíveis e sofisticados, destinados a produzir e armazenar feixes de prótons com altíssimas energias e velocidades muito próximas à da luz. São dois os feixes armazenados no acelerador, trafegando em direções opostas, como mão e contramão, e mantidos em órbita estável através de uma série de magnetos supercondutores. Em alguns pontos determinados, os feixes se cruzam produzindo colisões violentas entre os prótons. A enorme energia desprendida nestas colisões destrói completamente os dois prótons e rematerializa-se, segundo a equação de Einstein  (E=mc2) sob a forma de várias novas partículas. Estas por sua vez são analisadas por detectores de partículas dispostos ao redor do ponto de colisão. Dessa forma, seguindo as pistas deixadas pelas diversas partículas emergentes da colisão, pode-se reconstruir (por meio de computadores e programas sofisticados) os processos que ocorreram em cada colisão. Assim ganha-se acesso observacional, experimental, ao mundo subatômico, regido pelas leis da chamada mecânica quântica relativística. Resumindo, o LHC é um acelerador e colisor de prótons, e está situado na Europa, na região de fronteira entre a Suíça e a França, próximo à cidade de Genebra.


IHU On-Line – Como acontece o processo de colisão de partículas no LHC que comprovou a existência do Bóson?

Arthur Maciel –
Em um processo de colisão próton/próton o produto final não é exatamente previsível. Essa é uma característica fundamental dos processos quânticos. O que se pode prever a partir das teorias são as diversas probabilidades associadas a uma grande coleção de possibilidades para os processos intermediários e finais possíveis em cada colisão. Tem-se um grande espectro de reações possíveis, gerando seus estados finais característicos, cada um com sua probabilidade de ocorrência bem determinada. Em particular, a probabilidade de produção de um Bóson de Higgs como estado intermediário em uma destas colisões é baixíssima, trata-se de um processo extremamente raro na Natureza. Além disso, a observação do Bóson dar-se-á através da detecção de seus “filhotes”, as partículas nas quais ele decai, uma vez que é um estado altamente instável. Portanto, o que se faz é colecionar todos os registros de colisões nas quais foi possível detectar partículas com as propriedades esperadas aos “filhotes” (subprodutos do decaimento) do Bóson de Higgs. Do momento que o número de tais eventos selecionados torna-se estatisticamente significativo, pode-se declarar a certeza de sua existência.


IHU On-Line – Que outras descobertas importantes foram possíveis a partir desse acelerador de partículas?

Arthur Maciel –
O LHC entrou em funcionamento estável em 2010, e somente em 2011 atingiu o regime esperado para a análise de processos físicos raros, em particular a busca ao Bóson de Higgs. É um aparato recente, que veio para substituir o Tevatron nos Estados Unidos (este desligado em setembro de 2011), e cuja primeira e grande descoberta é exatamente a do Bóson de Higgs.


IHU On-Line – Que diferenças fundamentais existem entre aceleradores de partículas como o LHC e o Tevatron, do Fermilab, por exemplo?

Arthur Maciel –
Como em qualquer relação antecessor/sucessor, espera-se que o segundo contenha todas as lições aprendidas com o primeiro. O LHC é o herdeiro científico do Tevatron, que por sua vez é o herdeiro científico do LEP, e este dos demais aceleradores que o antecederam. Tecnicamente as diferenças entre o LHC e o Tevatron são muitas e devidas principalmente aos avanços tecnológicos conquistados nos últimos vinte anos. Além das energias e luminosidades consideravelmente maiores no LHC, talvez o que mais os distingue seja a natureza de seus feixes. As colisões no LHC são próton contra próton, duas partículas iniciais idênticas, enquanto que no Tevatron as colisões eram próton contra antipróton, ou seja, partícula e antipartícula. São dois tipos de colisão de naturezas bem distintas, mas servindo aos mesmos propósitos.


IHU On-Line – Há uma estimativa de outras descobertas que podem surgir a partir do LHC?

Arthur Maciel –
As expectativas são muitas, mas situam-se mormente no campo das especulações. A existência do Bóson de Higgs não resolve todos os problemas das teorias atuais, e mesmo cria alguns problemas de solução desconhecida. Surge a expectativa de que o Bóson de Higgs seja apenas a pequena ponta de um grande iceberg de novos fenômenos físicos. Se o for, vários destes fenômenos deverão ser acessíveis à observação no LHC. Esse fato promissor tem gerado uma excitação entre os físicos, e no mundo das ciências, como há tempos não se via. São grandes equipes internacionais que operam os aceleradores e seus detectores. Pode-se notar nestes grupos tanto a sensação de recompensa aos inúmeros esforços coletivos já dispendidos nesta enorme empreitada como o entusiasmo e intensidade nos preparativos para os próximos passos.


IHU On-Line – Como avalia a cooperação internacional estabelecida pelo CERN? Como funciona o intercâmbio de conhecimento com instituições de outros continentes?

Arthur Maciel –
Originalmente destinado a colaborações científicas de âmbito europeu, o CERN hoje congrega equipes de instituições oriundas de todos os continentes, que se agrupam não em função de questões políticas ou geográficas, mas tão somente em torno de seus interesses científicos. Interesses comuns geram times multi-institucionais que se organizam de forma a dividir os esforços e despesas necessários para o desenvolvimento de seus projetos. Tais projetos normalmente dependem de equipamentos que, por sua sofisticação, tamanho e consequentemente custos, jamais serão construídos em mais do que um lugar. O CERN é um exemplo de laboratório multiusuário abrigando um grande acelerador de partículas, com quatro grandes detectores em seus quatro pontos de colisão. Em torno do acelerador e de seus detectores organizam-se as diversas equipes que trabalharão em duas frentes; a primeira, de construção e finalmente operação de partes do aparato experimental, e a segunda, de uso do aparato para seus fins científicos. Assim, a coletividade que forma cada uma destas colaborações, com suas contribuições institucionais de recursos materiais e humanos, viabiliza o projeto maior que seria inacessível a um número reduzido de instituições científicas, ou ao orçamento de apenas um ou poucos países.


Produção gratuita

Tal fato gera em paralelo um experimento social de caráter único, curioso e singularmente bem sucedido, fazendo por exemplo do CERN uma babel de línguas, modos, costumes e culturas que, independentemente do quadro político internacional vigente, converge em torno de seus objetivos comuns. Tal simbiose gera, além da troca intensa de informações técnicas e científicas, diversas parcerias em ensino e pesquisa, condições de apoio mútuo de acordo com as habilidades específicas, camaradagem e amizades sem vínculos geográficos. Em tal laboratório (outro exemplo é o Fermilab, nos Estados Unidos) toda produção intelectual e tecnológica deve ser distribuída gratuitamente, pois advém de pesquisas financiadas pelos diversos governos dos países participantes. Não há projetos secretos, não há desenvolvimento de armas, apenas pesquisa inteiramente aberta, com benefícios imediatamente aproveitados, notavelmente no campo da medicina. Um exemplo significativo de produto público (gratuito) saído do CERN, e que se originou da necessidade de comunicação volumosa e rápida entre os grupos de pesquisa, é o protocolo e linguagem que deram origem ao “World Wide Web”, a internet.


IHU On-Line – Gostaria de acrescentar algum aspecto não questionado?

Arthur Maciel –
Ao longo das últimas três ou quatro décadas tivemos o privilégio de observar algo de extraordinário na evolução do conhecimento humano sobre o mundo que o cerca. As ciências do infinitamente grande (a astronomia, a astrofísica, a cosmologia) e do infinitamente pequeno (a física das partículas elementares) pouco a pouco se aproximaram, entrelaçaram as mãos, descobriram vários aspectos comuns e complementares, geraram uma espécie de simbiose a partir da qual soluções de problemas em um extremo são às vezes fornecidas pelo extremo oposto, algo à primeira vista surpreendente, mas em segunda análise, lógico, revelador e enriquecedor.

Desse encontro, nascido de uma certa maturidade atingida em ambos os lados, resultou um avanço significativo na tentativa de explicação do que é o Universo, de onde vem, como evolui, para onde vai; uma das questões mais antigas e ambiciosas, e sempre presente na alma humana. E como um adorno elegante, um complemento precioso a este panorama que vem se formando, revela-se o fato de que as leis fundamentais que aparentemente regem nosso Universo exibem uma simplicidade e beleza (estética, matemática) surpreendente, baseada no conceito de simetrias, algo que diretamente toca a sensibilidade humana.
Se eventualmente as pesquisas que agora se revigoram em consequência da descoberta deste esperado Bóson de Higgs corroborarem a grande visão recentemente atingida sobre as leis da Natureza, saberemos que o Universo nos preparou um grande presente, nos revelou uma elegância invejável. Das simetrias majestosas exibidas pelas leis naturais, surge a possibilidade dos pequenos desvios, “travessuras” previstas pelas próprias leis, e a partir das quais surge a variedade assimétrica, surgem as formas estáveis da matéria, e os sistemas solares com seus planetas, e surge a química, e com ela a vida, e com esta a possibilidade de apreciação do céu noturno, das florestas e flores, das ondas marinhas e da música.

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