Edição 199 | 09 Outubro 2006

As relações sexuais estão no cerne da produção da cultura

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IHU Online

O historiador Thomas Laqueur é professor na Universidade de Berkeley, Califórnia, e é especialista em História Social e da Medicina. Em 1992, publicou o livro Inventando o Sexo - Corpo e Gênero dos Gregos a Freud, lançado pela Relume-Dumará. Seu livro mais recente publicado no Brasil é Sexo Solitário - Uma História Sexual da Masturbação (Editora Zone Books, 2003). Sobre esse livro, confira uma resenha publicada na 173ª edição da revista IHU On-Line, de 27 de março de 2006.

Laqueur é formado em Filosofia pelo Swarthmore College, mestre pela Princeton University, e obteve seu Ph.D. na Princeton University. Ele aceitou conceder uma entrevista com exclusividade para a revista IHU On-Line sobre a sexualidade na sociedade contemporânea, marcada pelo individualismo e pela autonomia dos sujeitos sociais. Confira.

IHU On-Line - O senhor afirma que o sexo é “situacional” e só pode ser entendido no campo das relações entre gênero e poder. Pode explicar melhor essa afirmação?

Thomas Laqueur
- Por situacional, entendo que quase tudo de importante que queremos dizer sobre sexo e sexualidade, afora questões de produção e reprodução, tem a ver com o enraizamento cultural de homens e mulheres em relação entre si: se faz nascer ou desaparecer com a diferença sexual, se aumentam ou diminuem as barreiras entre os sexos e com um “sexo” que se comporte como um projeto cultural ou político. Não nego a existência da biologia. Eu apenas quero reivindicar que, no que se refere ao sexo e à sexualidade, sua existência é sentida em nossas vidas pela grande rede de significado que enreda o pensar sobre sexo.

IHU On-Line - O que podemos entender por “sexo solitário”?

Thomas Laqueur
- Eu chamei a masturbação de sexo solitário porque não estava muito interessado no ato físico de alcançar o orgasmo, mas em sua natureza psíquica. Então não lido com a assim chamada “masturbação mútua” ou masturbação e exibicionismo. Eu penso que sejam relacionadas ao meu tópico principal, mas que são atos sociais. Eu escrevo sobre a idéia de criar um mundo erótico em nossas próprias imaginações. Alguns argumentarão que todo sexo é solitário, mas isso é um assunto mais abrangente.

IHU On-Line - Qual a relação entre a masturbação e a sociedade caracterizada pela autonomia do sujeito?

Thomas Laqueur
- Meu ponto é que a masturbação vem a ser vista como moralmente suspeita quando a cultura mais geral começa a se preocupar com a autonomia do sujeito. É o lado negro do individualismo e assim como se torna assunto de escrutínio moral, também se torna um prazer culpado antes inexistente. Culpa – na afirmação da privacidade, da autonomia, do segredo – é então constitutivo da pessoa.

IHU On-Line - O que constitui a moralidade sexual contemporânea? Há uma moralidade sexual hoje em dia?

Thomas Laqueur
- Minha idéia é de que no Ocidente burguês – não em outra parte – as velhas questões sobre com quem e quando é certo ter sexo – antes do casamento, por exemplo – tornaram-se menos exigentes. As novas questões são mais éticas que morais: como o sexo figura em viver uma vida de virtude. Na verdade, eu não tenho idéia de o quão seriamente a juventude reflete nesse sentido.

IHU On-Line - Em que sentido a sexualidade representa a forma de relação entre o indivíduo e a sociedade, e entre o indivíduo e a natureza?

Thomas Laqueur
- Falando grosso modo, as relações sexuais estiveram e estão no cerne da produção da cultura. Pode-se começar com a famosa idéia de Lévi-Strauss de que o tabu do incesto define a intersecção entre natureza e cultura.

IHU On-Line - Qual é o papel da religião em uma sociedade de sujeitos autônomos e autoconstituídos?

Thomas Laqueur
- Eu também estaria interessado em saber. Nos Estados Unidos, hoje, a abstinência sexual antes do casamento tornou-se uma maneira para os jovens ligarem-se às visões religiosas conservadoras das suas famílias e para declararem-se à parte do que tomaram por ser a cultura popular hedonista e individualista da sociedade secular. Por sua vez, eu penso que os ensinamentos católicos sobre questões como aborto e controle de natalidade têm quase nenhum impacto nos Estados Unidos ou na Europa. Claramente essa questão seria respondida de maneira diferente para comunidades muçulmanas em diáspora ou em vários países do Oriente Médio, na Indonésia ou na Índia.

 

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