Edição 395 | 04 Junho 2012

Rio+20 e as empresas: a mudança deve vir de fora

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Graziela Wolfart

Para Carlos Young, quando se fala em sustentabilidade ou em economia verde, o importante é pensar em “como” atuar e não em “o que” deve ser feito

Na visão do economista Carlos Eduardo Young, uma empresa “não tem o papel de ser ecologicamente correta, nem sustentável. O que uma empresa tem que ser é um local de produção de bens e serviços. Nesse sentido, a sustentabilidade dela vai ser em função das demandas das pessoas que compõem essa empresa ou que demandam dela”. Ele emitiu essa opinião na entrevista que concedeu por telefone à IHU On-Line, onde argumenta que “é muito ingênuo supor que o papel da empresa seja promover o desenvolvimento sustentável. O papel das empresas continuará sendo produzir e obter lucro. O que devemos é pressionar para que, nesse processo, haja uma incorporação de princípios de sustentabilidade”. E conclui que o grande tema a ser debatido na Rio+20 é a problemática de como gerar emprego e renda de forma socialmente inclusiva, respeitando o meio ambiente.

Carlos Eduardo Young participará do evento Rio+20 – Desafios e Perspectivas, promovido pelo IHU, ministrando a palestra “Rio+20 sob a perspectiva empresarial”, no próximo dia 6 de junho, quarta-feira, na Unisinos. Saiba mais em http://bit.ly/wh2tt8.

Carlos Eduardo Young é doutor em Economia pela Universidade de Londres e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ.

Confira a entrevista.


IHU On-Line – Quando se reflete sobre a Rio+20 sob a perspectiva empresarial, o que é importante destacar?

Carlos Young –
A Rio+20 é uma avaliação das implementações das políticas e das ações efetuadas nos últimos 20 anos a partir dos acordos assinados no Rio de Janeiro, em 1992, na Convenção do Clima, da diversidade biológica e de combate à desertificação. É importante saber o que as empresas fizeram nessas áreas, qual foi a atuação delas em relação ao clima, à questão da biodiversidade e serviços ecossistêmicos e ao combate à desertificação. Nesse aspecto, percebemos que há muita heterogeneidade, mas de forma geral, a ação foi muito menor do que a que seria necessária, principalmente nos temas da biodiversidade e do combate à desertificação. Na área do clima acabou havendo algum avanço em função do destaque do tema, da questão do Protocolo de Kyoto e das regulamentações específicas. Nas outras áreas, ainda há muito o que fazer.


IHU On-Line – Qual deve ser o papel das empresas na Rio+20?

Carlos Young –
É importante esclarecer que acontecerão duas conferências. Uma será a Rio+20 oficial, que diz respeito a um documento que trará a posição dos países, e está muito claro que será bastante esvaziado, pois não deverão ser discutidas metas quantitativas, apenas princípios. É uma questão de governo, de diplomacia, dando muito pouco espaço para empresas e sociedade civil. Mas poderemos ter uma atuação mais ativa das empresas e da sociedade civil nos chamados fóruns ou eventos paralelos, onde teremos uma enorme concentração de todas as pessoas envolvidas com o tema: cientistas, ativistas, inclusive o setor empresarial. Já há uma série de ações do setor empresarial que serão avaliadas. Efetivamente, será um momento para as empresas trocarem experiências, identificarem metodologias, procedimentos de atuação, e também para discutir, do ponto de vista empresarial, quais são as consequências da implementação dos princípios da economia verde. Nesse sentido, teremos um resultado interessante, porque essa intensa troca de informação entre as empresas, e entre elas e a sociedade, permitirá perceber que muitas experiências bem sucedidas serão replicadas.


IHU On-Line – Quais os avanços e entraves atuais em relação ao modelo de empresas sustentáveis? O que caracteriza uma empresa ecologicamente correta?

Carlos Young –
Eu não usaria essa terminologia, porque uma empresa não tem o papel de ser ecologicamente correta, nem sustentável. O que uma empresa tem que ser é um local de produção de bens e serviços. Nesse sentido, a sustentabilidade dela vai ser em função das demandas das pessoas que compõem essa empresa ou que demandam dela.


IHU On-Line – Mas não deve ser papel também do empresário se preocupar com a questão ambiental?

Carlos Young –
Com certeza. Mas a questão é a seguinte: é muito ingênuo supor que o papel da empresa seja promover o desenvolvimento sustentável. O papel das empresas continuará sendo produzir e obter lucro. O que devemos é pressionar para que, nesse processo, haja uma incorporação de princípios de sustentabilidade, tanto por dentro empresa, que é a conscientização do empresário e dos trabalhadores – e há uma série de estudos mostrando que uma empresa que tem empregados motivados, que identificam na missão dessa instituição algo além do que simplesmente a geração do lucro, há um nível de produtividade mais alto – como pela relação da empresa com a sociedade, tanto de quem demanda os seus bens, quanto com a cadeia produtiva onde ela está inserida. E daí podemos discutir critérios de sustentabilidade para a aplicação da empresa. Parte desses critérios a empresa pode adotar voluntariamente, por questões de eficiência. Quando perceber a possibilidade de um ganho financeiro e de eficiência, ela própria irá adotar esses critérios. Mas a maior parte das modificações necessárias terá que ser induzida de fora da empresa, seja pelos consumidores ou pelo próprio Estado regulador.


IHU On-Line – Quais devem ser os grandes temas em debate na Rio+20?

Carlos Young –
É muito simples: como a atividade produtiva pode ser simultaneamente de conservação e de inclusão social, ou como ações que são voltadas para a conservação do nosso ambiente são também ações de inclusão social e de atividade econômica. Em outras palavras: como gerar emprego e renda de forma socialmente inclusiva, respeitando o meio ambiente. São esses os princípios fundamentais. Além disso, há também uma grande ênfase na questão da pobreza. Será uma conferência bem mais aberta do que as conferências específicas sobre a questão do clima.


IHU On-Line – Como a discussão sobre o novo Código Florestal deve aparecer nos debates da Conferência?

Carlos Young –
A Rio+20 é uma conferência mundial. E o tema do Código Florestal é extremamente brasileiro. Mas com certeza o tema surgirá, até porque ele fragiliza bastante a posição do governo brasileiro. Haverá muita crítica por parte dos ambientalistas brasileiros, o que vai enfraquecer a posição do Brasil no debate internacional. Mas como também tão pouco está se pretendendo uma meta objetiva, vai ficar muito “na conversa”. Não deverá ser um tema proeminente. O que acontece é que mostra simplesmente que os países em desenvolvimento também devem cumprir suas agendas e não esperar que apenas os países desenvolvidos o façam.


IHU On-Line – Quais os limites e desafios que se colocam em relação ao conceito de economia verde, tão propagado em relação à Rio+20?

Carlos Young –
É um conceito. E como tal, é uma forma de pensarmos. A grande premissa é essa: vamos reestruturar a nossa atividade econômica de maneira que incorpore esses elementos de sustentabilidade, com grande ênfase na inclusão social, gerando emprego e gerando renda. A mensagem deve ser a de que fazer essas coisas não diminui a atividade econômica, pelo contrário, aumenta. O fundamental é que a sustentabilidade e a economia verde não dizem respeito ao que fazer, mas ao como fazer, como produzir, como consumir. A palavra-chave é “como” e não “o que”.


Leia mais...

>> Carlos Eduardo Young já concedeu outras entrevistas à IHU On-Line. Confira:

• O novo Código Florestal contribui para o crescimento econômico? Entrevista publicada nas Notícias do Dia de 01-06-2011

• Crescimento econômico e clima. Um desafio. Entrevista publicada na IHU On-Line número 311, de 19-10-2009

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