Edição 395 | 04 Junho 2012

A indignação e o sistema capitalista em colapso

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Márcia Junges

HARVEY, David; ZIZEK, Slavoj. ALI, Tariq et ali. Occupy. Movimentos de protesto que tomaram as ruas (São Paulo: Boitempo, 2012) Pelo mundo afora manifestantes denunciam os conchavos dos ricos para “oprimir e explorar o povo”, destaca Henrique Soares Carneiro. Manifestações podem redundar em revoluções com o agravamento da crise e o “desespero social”

“Seja em Nova Iorque, em Madri, em Túnis ou no Cairo, há uma denúncia da aliança dos ricos com o poder para oprimir e explorar o povo”, afirma o historiador Henrique Soares Carneiro na entrevista que concedeu por e-mail à IHU On-Line. Em sua opinião, as manifestações podem se converter em revoluções à “medida em que o agravamento da crise aumente o desespero social e haja direções revolucionárias capazes de apontar nessa direção”. O sistema capitalista como um todo está à beira de um colapso em termos sociais, ambientais e “da sua própria capacidade de gerir sua reprodução ampliada na medida em que os mecanismos dessa reprodução estão entrando em colapso no sistema financeiro global”. A entrevista foi inspirada no artigo de Carneiro, escrito para a coletânea Occupy. Movimentos de protesto que tomaram as ruas (São Paulo: Boitempo, 2012).

Henrique Soares Carneiro é bacharel, mestre e doutor em História Social pela Universidade de São Paulo – USP, onde leciona. De sua vasta produção bibliográfica destacamos Amores e sonhos da flora. Afrodisíacos e alucinógenos na botânica e na farmácia (São Paulo: Xamã Editora, 2002), Comida e sociedade. Uma história da alimentação (Rio de Janeiro: Campus, 2003) e Bebida, abstinência e temperança na história antiga e moderna (São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2010).

Confira a entrevista.


IHU On-Line – Há um traço que une as mobilizações e protestos sociais no mundo afora em 2011?

Henrique Soares Carneiro –
Sim. O que une os protestos globais é, em primeiro lugar, uma recusa ao capitalismo, uma denúncia da ação perdulária, exploradora e predatória da ordem econômica global. Seja em Nova Iorque, em Madri, em Túnis ou no Cairo, há uma denúncia da aliança dos ricos com o poder para oprimir e explorar o povo. Em segundo lugar, há uma unidade objetiva da própria busca de alternativas revolucionárias, a própria palavra revolução retoma sua condição de utopia realizável pela simples vontade coletiva de agir junto. Em terceiro lugar, há o fato de os movimentos, mesmo sem ser totalmente espontâneos, serem organizados por forças políticas críticas ao sistema político e sindical oficial. Finalmente, os usos de meios de comunicação ágeis, por internet, celulares, etc. são veículos particularmente eficientes de articulação social dos conteúdos citados.


IHU On-Line – Esse período de contestação pode ser equiparado a outro na História? Qual?

Henrique Soares Carneiro –
Os períodos históricos possuem dinâmicas cíclicas, e as ondas de rebelião social assim como as de crises econômicas obedecem a oscilações e a difusões. O movimento atual tem evidentes referências na onda de rebeliões de 1968, que correspondem também ao início do esgotamento do modelo da ordem mundial de Yalta e Potsdam do segundo pós-guerra. Mas em cada país há dinâmicas próprias.


IHU On-Line – Qual a peculiaridade dos indignados? O que os diferencia de outras manifestações sociais que já ocorreram?

Henrique Soares Carneiro –
Os indignados não têm ainda uma definição clara do que são. Uma coisa é o que ocorre na Espanha, onde há tendências como DRY (Democracia Real Ya) e outra em distintos lugares. Têm semelhanças com outras irrupções de movimentos de juventude, mas características históricas próprias, ainda difíceis de analisar em poucas linhas sob risco de superficialidade.


IHU On-Line – Tomando em consideração essa conjuntura, o ano de 2011 foi bom para a esquerda? Por quê?

Henrique Soares Carneiro –
Sim, obviamente, se pensarmos em esquerda como o polo dos movimentos sociais de explorados e oprimidos anticapitalista. Porque aumentou a influência das organizações e das ideias da esquerda revolucionária com reflexos em vários países, a se destacar o Siryza na Grécia.


IHU On-Line – Em que medida essa indignação pode se converter em revolução?

Henrique Soares Carneiro –
Na medida em que o agravamento da crise aumente o desespero social e haja direções revolucionárias capazes de apontar nessa direção.


IHU On-Line – Salvar bancos e arrochar a população vêm se tornando uma constante no capitalismo. Pensando na crise de 2008, acredita que esse sistema está à beira de um colapso?

Henrique Soares Carneiro –
Sim, como colapso social e socioambiental e também como colapso da sua própria capacidade de gerir sua reprodução ampliada na medida em que os mecanismos dessa reprodução estão entrando em colapso no sistema financeiro global. Isso ameaça também a ordem do segundo pós-guerra do FMI, do Banco Mundial e do dólar.


IHU On-Line – Quais são os reflexos do Occupy no Brasil?

Henrique Soares Carneiro –
Os reflexos são ainda pequenos, mas tendendo a crescer, pois o país também está imerso na crise global.


IHU On-Line – Em que medida a segurança alimentar tem sido uma das formas de controle e disciplina da população? Como esse controle se relaciona com essas revoltas que ora presenciamos?

Henrique Soares Carneiro –
O aumento dos preços dos alimentos ajudou a desencadear as revoltas nos países da África do Norte e do mundo árabe.

 

Leia mais...

Confira a entrevista concedida por Vladimir Safatle à IHU On-Line 362 inspirada na coletânea Occupy. Movimentos de protesto que tomaram as ruas:

A política contemporânea tende a ir para os extremos. Revista IHU On-Line, número 392, de 14-05-2012

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