Edição 362 | 23 Mai 2011

Tolerância em nome da pacificação

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Anelise Zanoni

Jornalista e doutor em Ciências da Comunicação, Jacques Wainberg explica que boa vontade e esforço são necessários para que a diferença entre culturas não se transforme em munição para o ódio

A busca da pacificação e da tolerância a minorias como os refugiados exige esforço e boa vontade. Do contrário, de acordo com Jacques Wainberg, pós-doutor em ciências da comunicação, lançamos munição suficiente para a incitação ao ódio e à pregação genocida.

Com a capacidade de captar a atenção do público, “a mídia tem certo poder em estabelecer uma pauta pública de debates e de criar um clima de opinião pública sobre temas sociais”, reflete o especialista. A partir desse ponto de vista, fica claro que a imprensa tem em mãos a possibilidade de colaborar para a manutenção da paz – ou da guerra. Entretanto, o interesse por fatos violentos, que incitam o ódio, são mais propensos à audiência.

“A violência atrai mais a atenção do que a paz”, diz o jornalista, em entrevista por e-mail à IHU On-Line, justificando o porquê de preferirmos “prestar mais atenção nos bandidos do que nos pacificadores”.
Nessa perspectiva, um instrumento que ajudaria na tolerância humana por meio da mídia seria o jornalismo para a paz, “um propósito nobre que envolve a mudança de valores do jornalismo na forma como ele é praticado hoje em dia.”

Graduado em História pela PUCRS, Jacques Wainberg é bacharel em Jornalismo pela Universidade da Flórida, mestre em Jornalismo pela University of South Carolina, doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo - USP e pós-doutor pela Universidade do Texas. Atualmente é professor titular da PUCRS.

Confira a entrevista.


IHU On-Line - Muito se fala sobre a interculturalidade e mescla de identidades, o que nos faz pensar que o mundo está aberto para as diferenças. Entretanto, percebemos a intolerância. Você acredita que esse seja um movimento que colabora para a geração de conflitos?

Jacques Wainberg –
Não há a menor dúvida que as diferenças em geral, e as culturais em particular, são obstáculos a serem ultrapassados na busca da pacificação. Este não é um desafio fácil como se observa nos inúmeros fatos da história. Gostamos de nos cercar de pessoas que partilham valores comuns. Nossa cultura é nossa zona de conforto. Nela não precisamos nos explicar, pois o que fica subtendido ou implícito é perfeitamente compreendido pelos que partilham comigo de um lastro comum. O contrário também é verdadeiro. A diferença demanda boa vontade e esforço para que não se torne em munição para a incitação ao ódio e à pregação genocida.


IHU On-Line – Atualmente, com o número avançado de conflitos pelo mundo, como você avalia a cobertura da imprensa sobre a situação dos milhões de refugiados no mundo?

Jacques Wainberg –
Na Europa este é um tema presente. Lá os refugiados são visíveis e em grande número. Eles chegam às costas da Itália, da Espanha e de outros países tornando sua aclimatação ao novo ambiente um desafio que envolve toda a sociedade. A mídia cobre todo este drama intensamente.


IHU On-Line – No seu artigo “Nações em guerra, repórteres em luta”  você fala que, quando se está em guerra, a reportagem torna-se uma extensão do esforço militar de abater o inimigo. Sob essa perspectiva, como a mídia pode modular pensamentos e ideias sobre a produção massiva de refugiados no mundo?

Jacques Wainberg -
A mídia tem certo poder em estabelecer uma pauta pública de debates e de criar um clima de opinião pública sobre temas sociais. Isso também ocorre no tema dos refugiados. Na Inglaterra, por exemplo, o embate é feroz. A aversão à chegada de novos imigrantes e refugiados é crescente. A primeira-ministra alemã e o primeiro-ministro inglês declararam recentemente que o multiculturalismo fracassou. Na França este embate envolve agora a polícia que prende mulheres que andam nas ruas com burca. A mídia, ao dar destaque a estes assuntos, acirra o debate e os ânimos.


IHU On-Line – Você acredita que uma forma de modificar a atuação da mídia seria por meio do Jornalismo para Paz?

Jacques Wainberg -
O Jornalismo para a Paz equivale ao movimento iniciado com a Educação para a Paz. É um propósito nobre que envolve a mudança de valores do jornalismo na forma como ele é praticado hoje em dia. Não é impossível colocá-lo em prática, mas é difícil.


IHU On-Line - Como a mídia poderia usar o exemplo do Jornalismo para Paz a fim de tratar questões relacionadas a conflitos e refugiados?

Jacques Wainberg -
Estudos empíricos têm mostrado que ele tem sido praticado ocasionalmente. É um instrumento que ajuda a tolerância humana em relação aos temas polêmicos que usualmente dividem as pessoas.


IHU On-Line – Com a chamada Era do Terror percebemos a potencialidade comunicacional do ato terrorista. Você acredita que a morte de Osama bin Laden pode representar uma guinada no conteúdo da imprensa?

Jacques Wainberg -
Não acredito. A violência atrai mais a atenção do que a paz. Preferimos prestar mais atenção nos bandidos que nos pacificadores.



Leia mais...

Confira outra entrevista concedida por Jacques Wainberg e publicada no sítio do IHU:

* 11 de setembro: cinco anos. O terror transmitido ao vivo pela mídia. Entrevista publicada em 12-09-2006 nas Notícias do Dia

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