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João Miguel
A segunda transformação encontra-se, ainda, em processo e vem se desenhando desde 2006, quando o governo de Moçambique anunciou a migração tecnológica na radiodifusão do país até 2015. Os observadores das políticas de comunicação do país já haviam percebido, desde o início, que não seria possível observar-se esse calendário. Recentemente, o conselho de ministros deliberou e decidiu adotar o padrão europeu de televisão digital (Digital Vídeo Broadcasting – DVB/T2) e também prorrogou o switch-off do sistema analógico para 2020, prazo intransponível de acordo com União Internacional das Telecomunicações – UIT, organização de que Moçambique é membro. Assim sendo, há muitos passos por dar. E trilhar esse caminho significa conjugar interesses, gerir conflitos e pensar no tipo de espaço público a ser configurado por essas novas plataformas.
Em relação a outros países da região da África Austral, Moçambique está muito atrasado e só há poucos dias o governo publicamente pronunciou-se sobre a temática. Quem tem ganhado visibilidade, de forma isolada, é o diretor-geral do Instituto Nacional das Comunicações de Moçambique – INCM, e em casos esporádicos os operadores de rádio e TV têm apresentado seus pontos de vista. A ausência de vários atores e diversos segmentos da sociedade moçambicana nas discussões é gritante, o que leva a crer que as decisões tenderão a ser tomadas a sabor de motivos econômicos e políticos. Contudo, isso não significa dizer que esses fatores sejam menos importantes.
Entretanto, há outros aspectos a serem considerados que vão além da simples dificuldade de obtenção de aparelhos e de conversores. Nestas vias, entende-se que o conceito de televisão deverá expandir-se e apresentar reflexos significativos em sua qualidade e, complementarmente, trazer lógicas não comerciais e novos conteúdos, inclusive alguns não tradicionais do sistema televisivo, com possibilidade de uso para tele-educação e telegoverno. Essa tem sido a compreensão dos pensadores do campo da Economia Política da Comunicação.
O processo da migração tecnológica no país veio agregar mais um problema no contexto das políticas de comunicação no rolo da problemática existente. Segundo o censo de 2007, menos da metade dos lares moçambicanos tem aparelho de TV, ou seja, a maior parte da população está excluída e não pode usufruir das possibilidades de informação, educação e entretenimento que podem ser proporcionadas por esta mídia. Na melhor das hipóteses, o único meio pelo qual se inserem no mundo é o rádio que funciona a pilha, já que a expansão elétrica encontra-se em processo.
Esses aspectos ilustram quão será um caminho de idas e vindas pleno de dificuldades, próprias de um país marcado por limitações de diversa ordem. Nessa ótica é fundamental que o governo moçambicano, ao pensar nas políticas de migração tecnológica, também invista em sistemas que permitam não apenas uma migração a baixo custo, mas que sejam estudados em função de sua capacidade de atuar socialmente em relação à educação e à distribuição de conteúdos inclusivos, como um espaço para a democratização da comunicação e para usos cidadãos, como educação à distância e acesso aos portais governamentais. Essa é a visão dos pesquisadores congregados no grupo Comunicação Economia Política e Sociedade – Cepos, atentos ao fenômeno da digitalização das mídias, em diversos contextos.