Edição 347 | 18 Outubro 2010

IHU Repórter

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Patrícia Fachin

Eloisa Helena Capovilla da Luz Ramos sempre sonhou ser professora. Apaixonada por História, ainda pequena, tinha facilidade para decorar fatos e datas, gostava de participar das atividades escolares e estava sempre atenta às notícias chegadas pelo rádio e jornais assinados pelo pai. Ao escolher a profissão, não hesitou: retomou o antigo sonho de criança. Depois de concluir o curso de Magistério, no Colégio Santa Teresinha, das Irmãs Escolares de Nossa Senhora, em Santo Antônio da Patrulha, ela iniciou a carreira docente e há mais de 20 anos leciona no curso de História da Unisinos. Em visita ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU, ela contou um pouco de sua trajetória. Confira.

Origens e família – Nasci em Riozinho, hoje município, mas que na época era distrito de Santo Antônio da Patrulha. Depois fomos morar em Taquara. Aí minha mãe, Anita Capovilla da Luz faleceu, aos 32 anos, por uma doença no fígado. Nós éramos entre cinco irmãos. Quando a mãe faleceu, a filha mais velha, Elaine, tinha sete anos de idade e a pequena, Eliana, tinha alguns meses. Meu pai, Bernardino Gonçalves da Luz, nos deixou com os parentes porque ele era caminhoneiro, viajava muito, e não tinha como ficar com os filhos. Então, cada um foi morar com um tio porque não tinha como ficarmos juntos. Cinco anos depois da morte da minha mãe, meu pai casou de novo, com uma moça de Santo Antônio da Patrulha, Teresinha Machado da Silveira Luz e nós fomos então morar com ele, mas apenas alguns de nós. Minha madrasta teve mais três filhos. Então nós somos um “familião”. Somos uma família alegre, barulhenta. Há cinco anos minha madrasta faleceu. E meu pai, este ano, festejou 90 anos de idade, ainda muito lúcido e bem de saúde. Quando todo o grupo se reúne, no Natal ou no aniversário do pai, somos mais de 50 pessoas, o que é uma festa permanente.

Sonho e decisão pela carreira – Desde pequena eu sempre quis ser professora. Era a minha meta. Nunca pensei fazer outra coisa na vida. No interior de Santo Antônio, estudei o ensino fundamental, no Grupo Escolar Professor Cândido de Barros. Eu gostava de participar da vida escolar, das festas da escola. Tinha bastante facilidade em decorar, então, a professora passava uma poesia pela manhã, e à noite eu já tinha decorado. O ensino médio eu concluí na cidade de Santo Antônio, no Colégio Santa Teresinha, das Irmãs Escolares de Nossa Senhora.

Depois, cursei o Normal, que hoje equivale ao Magistério, neste mesmo colégio. Como gostava de História, eu era uma das melhores alunas do colégio nessa disciplina e tinha muito orgulho disso. Decorava todos os fatos e datas e sabia um volume de informações. Meu pai sempre gostou de assinar jornais, lia o Diário de Notícias, a Folha da Tarde. Ele também assinava a revista O Cruzeiro, nos anos 1940 e 1950. Então, cresci nesse meio e descobri o Brasil nesse contexto. Mais tarde, o rádio me fascinou. Lembro de ouvir a renúncia do Jânio Quadros, em 1961; foi um momento impactante, ficamos duas semanas sem aulas. Ficávamos em casa ouvindo as notícias pelo rádio, inclusive os discursos do Brizola. Era o período da Legalidade. Meu pai era antibrizolista, mas eu ficava encantada com a expectativa de entender o que estava acontecendo no mundo. Também me lembro da notícia da morte de Getúlio Vargas, alguns anos antes (1954). As pessoas, no interior, reagiram violentamente a este fato. A família com quem eu morava era muito getulista e quando alguns vizinhos soltaram foguetes pela morte do presidente a reação foi com tiros para o alto. Esses impactos da história do Brasil me acompanham desde os anos 1950.

Universidade - Em 1968 entrei na Unisinos para cursar História. Mudei de Santo Antônio para Novo Hamburgo, que na época era a cidade com as melhores condições da região para o exercício do magistério. Fiz um concurso e fui lecionar numa escola do município, a Escola Municipal Senador Salgado Filho, onde trabalhei por quatro anos. O meu trabalho começou pari passu com a faculdade. Terminei a licenciatura curta em 1972, mas ainda faltava cursar algumas disciplinas da licenciatura plena. Neste mesmo ano, casei com Genito Ramos e fui morar em Porto Alegre. Comecei a lecionar numa escola para mulheres, o Centro Feminino de Ensino, onde trabalhava no Supletivo de primeiro e segundo graus.

Em 1977, retornei para a universidade para concluir as disciplinas da licenciatura plena. Neste caminho, agreguei mais um sonho: estudar a história do Rio Grande do Sul. Então, terminei a graduação e fiz Especialização em História do Rio Grande do Sul na UFRGS, a qual conclui em 1980. Ao mesmo tempo, eu trabalhava em escolas de ensino fundamental e no Supletivo.
Em 1985, abriu o curso de mestrado em História na UFRGS, fiz minha inscrição e fui aluna da primeira turma. Quando estava na metade do mestrado, abriu o concurso para ser professor na Unisinos. A professora Beatriz Franzen me telefonou sugerindo que eu participasse da seleção. Esse foi um presente de Natal lindo. Tirei o primeiro lugar na seleção; isso me deixou muito feliz. Afinal, este sonho de trabalhar na Unisinos eu não ousara ter.

Ingresso na Unisinos – Em março de 1987, comecei a lecionar na universidade na disciplina de História do Pensamento Humano. Em setembro deste mesmo ano, “herdei” duas turmas da professora Helga Piccolo, que assumia com dedicação exclusiva na UFRGS. Ela lecionou na Unisinos por 23 anos e, eu, agora, tenho o tempo de universidade que ela já teve. Isso me deixa muito orgulhosa. Sou professora das disciplinas de História do Rio Grande do Sul e não as divido com ninguém. Brinco com meus colegas que quando me aposentar, aos 70, deixarei a disciplina para um deles, como a Helga fez comigo. A estas duas professoras, a Beatriz Franzen e a Helga Piccolo devo muito do que sou. Elas foram sempre “um modelo a ser seguido”.

Trajetória docente na universidade – Quando eu era aluna, em 1969, um acontecimento importante foi que a Unisinos passou a ser universidade; antes disso, ela era Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Na minha trajetória como professora, tive um primeiro impacto com a perda da coordenadora do curso de História, a professora Ildegarta Beber, que faleceu repentinamente. Nesta ocasião, as professoras Miriam Fialkow e Beatriz Franzen pediram que eu assumisse a coordenação da graduação em História. Fui eleita coordenadora e permaneci no cargo por dois mandatos.
Em 1995, fiz seleção e entrei na primeira turma de doutorado em História da UFRGS. No ano seguinte, fui trabalhar na FURG, em Rio Grande, como professora substituta, sem deixar a Unisinos.Fiquei 6 meses. Em 1998, fui eleita coordenadora executiva do Curso de História tendo o professor José Baldissera como vice-coordenador. Eu aprendi muito com ele; formamos uma dupla incrível ao longo de cinco anos. Neste período também conclui o doutorado e comecei a lecionar na pós-graduação.

Nessa trajetória, de 10 anos orientei sete teses e cinco dissertações de mestrado. Trabalhos de conclusão de curso creio que orientei mais de 100 neste 23 anos de Unisinos – entre bons, médios e ruins.
Além de pesquisar e continuar estudando sobre o a História do Rio Grande do Sul, hoje minha paixão paralela é o estudo dos museus. Isso se reflete na tentativa – que não deu certo – de criar um curso de museologia na Unisinos, quando ainda não existia nenhum no estado. Como esse projeto não aconteceu, passei a pesquisar os museus como espaços de história, sempre focada na área da imigração, considerando que eles são importantes para a construção da memória e da identidade dos imigrantes.

Hoje, também divido, com a professora Heloisa Reichel, a coordenação do curso de especialização em História do Rio Grande do Sul.

Família – Tenho duas filhas. A mais velha, Cecília, nasceu em 1974 e a Julia, em 1980. Elas são queridas e muito companheiras. A mais velha é ligada à área de negócios, da dinâmica do empreendedorismo, na área da gastronomia. Está organizando um restaurante. A Julia cursou Publicidade e Propaganda e depois, Jornalismo. Trabalhou em empresas, algum tempo e agora está cursando o mestrado em Comunicação na Unisinos.

Lazer – Gosto de sair, andar pela cidade. Nas férias, fico 10, 15 dias na praia. Gosto de levar bastante gente comigo, adoro essa efervescência de pessoas. Sou caseira; quando vamos ficando mais velhas, dispomos menos do tempo, pois a família exige mais. Não cobro visitas e também não visito com frequência. Gosto de ir às livrarias de Porto Alegre como a Cultura, a FNAC, no MARGS, em cafés, olhar livros, visitar museus. Amo viajar. Meu elemento é o ar, como dizem. Sou uma aquariana e me reconheço como tal. Tenho duas palavras chaves: liberdade e liberdade! Temos de ter liberdade na vida para descobrir coisas novas.

Religião – Sou católica, sem discussão. Mas, não sou uma seguidora de toda a doutrina. Vou à missa de vez em quando, mas não ponho em dúvida a minha fé. Sou crítica diante de algumas posições da Igreja.

IHU – O IHU é a ponta do iceberg, ou seja, quando se quer fazer um evento avançado, o IHU está pronto para o desafio. Vejo que o Instituto é a ponta de um todo porque ele não se coloca separado da Unisinos, embora, tenha vida própria. Resumindo: o IHU é jesuítico com tudo que implica ser jesuíta: é ao mesmo tempo tão avançado e tão conservador também. É isso!

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