Edição 340 | 23 Agosto 2010

A industrialização da cultura religiosa

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Rafaela Barbosa

A mercantilização da religião já é um fenômeno legitimado na contemporaneidade, com características oligopolísticas, onde um grupo reduzido de igrejas lidera empreendimentos dentro e fora da área religiosa. Leia o artigo de Rafaela Barbosa.

A mercantilização da religião já é um fenômeno legitimado na contemporaneidade, com características oligopolísticas, onde um grupo reduzido de igrejas lidera empreendimentos dentro e fora da área religiosa. Neste artigo nos referimos ao meio evangélico. Nota-se que o universo pentecostal surgiu com o propósito de manter-se contrário às práticas da Igreja Católica, como, por exemplo, a veneração de santos e imagens e a confissão individual para a remissão dos pecados, preservando seus preceitos históricos. Com as mudanças socioeconômicas e culturais que o capitalismo desencadeou no mundo, ocorreram reordenamentos estruturais nas organizações religiosas. Parte destas passa a seguir as lógicas capitalistas como instinto de sobrevivência econômica, adotando posturas fundamentadas mais no consumismo que na doutrina, tendo a mídia um papel central em seus movimentos.

No início seria impossível imaginar a ida aos templos para realizar apostas divinas ou até mesmo a constituição de uma bancada evangélica junto ao poder legislativo. Há mais de três décadas houve uma expansão pentecostal, que partiu das promessas da sociedade de consumo, do acesso de crédito aos consumidores e das possibilidades de entretenimento criadas pela indústria cultural. Essa religião ou se mantinha fiel aos seus princípios doutrinários de origem, aumentando sua defasagem em relação à sociedade e aos interesses ideais e materiais dos seus adeptos, ou fazia concessões. 
Na sequência, algumas denominações evangélicas subdividiram-se para atender a essa fatia do mercado que estava em franca expansão. A linha doutrinária do culto de pentecostes teve seus desdobramentos até o surgimento do neopentecostalismo. Esta última incorporou procedimentos inovadores aos métodos protestantes, como a pregação de cultos por meio da mídia, a prática da Teologia da Prosperidade, dentre outros.
 No cenário brasileiro, a perspectiva midiática neopentecostal inicia em novembro de 1989, quando a Igreja Universal do Reino de Deus – IURD compra a Record. Na década seguinte, evidenciam-se os movimentos de alargamento empresarial desta igreja no setor de radiodifusão. Na atualidade, os números de veículos da rede, são discutíveis, visto que o Ministério das Comunicações credita números inferiores ao que eles anunciam possuir. Mesmo com tal divergência, sua programação na madrugada:

reúne hoje trinta emissoras no país (cinco próprias e 25 afiliadas) e 747 retransmissoras, segundo o Ministério das Comunicações. [Em contrapartida], a Record afirma ter 105 emissoras (entre próprias e afiliadas). Conta ainda com a Record News, a Rede Família e a Record Internacional .

Parte do crescimento da IURD na América Latina, e em alguns países da América do Norte e Europa, é creditado ao alcance nacional e transnacional que a Record vem conquistando ao longo dos anos. Os demais veículos liderados pela IURD constituem um complexo de empresas estruturadas nos moldes da indústria cultural, onde setores da indústria fonográfica, literária, radiofônica, televisiva, dentre outros, fortalecem o processo comunicativo institucionalizado, entre os colaboradores, adeptos e o mercado. De acordo com a tabela 1:

Tabela 1 – Meios de comunicação da IURD

Meios de comunicação da IURD

Impressos                                                       

Folha Universal – jornal com tiragem de 2,5 milhões de exemplares. Arca Universal – sítio de notícias dos serviços da IURD.
Revista Plenitude – Revista de variedade mensal com tiragem de 322 mil cópias. Rede Aleluia de Comunicação – Rede radiofônica que cobre o país.
Gráfica Universal – imprime livros da IURD, Larousse, Ediouro, dentre outras editoras. Rede Mulher – rede de televisão aberta, que no horário da madrugada exibe programas da Igreja Universal.
A visão da fé – revista mensal destinada aos auxiliares dos programas de rádio e TV com tiragem de 150 mil cópias. Unipress Internacional – Agência de notícias, imagens e vídeo.
Unipro Editora – publica livros de auto-ajuda e infantil. Studio Up Digital – estúdio de fotografia digital que produz projetos fotográficos em geral.
Correio do Povo (RS)* – jornal de circulação diária.  Line Records – Gravadora evangélica.
Revista Ester – impresso voltado ao público feminino com tiragem de 120 mil cópias. Bureau Universal Produções – agência de publicidade e bureau de impressão digital.

Eletrônicos/digitais

Arca Universal – sítio de notícias dos serviços da IURD.
Rede Aleluia de Comunicação – Rede radiofônica que cobre o país.
Rede Mulher – rede de televisão aberta, que no horário da madrugada exibe programas da Igreja Universal.
Unipress Internacional – Agência de notícias, imagens e vídeo.
Studio Up Digital – estúdio de fotografia digital que produz projetos fotográficos em geral.
Line Records – Gravadora evangélica.
Bureau Universal Produções – agência de publicidade e bureau de impressão digital.

Fonte: http://www.universalproducoes.com.br. Autora.
*O referido veículo faz parte do complexo de comunicação Caldas Júnior, em Porto Alegre, que abrange a TV e rádio Guaíba.

O poder midiático reforça o discurso de prosperidade, tanto para tentar ganhar adeptos, como comercializar suas produções espirituais. Cabe ressaltar que a TV serve como reforço das mensagens veiculadas pela IURD, em função de seu conteúdo de info-entretenimento popularesco, e opera prioritariamente como uma plataforma tecnológica a reforçar interesses e ideais societários. O uso dos meios de comunicação, de técnicas de marketing e propaganda, da legitimação da Teologia da Prosperidade e, sobremaneira, do trabalho dos dirigentes, que focam seus empenhos na proliferação da IURD pelo mundo, estes elementos somados asseguram o desenvolvimento da Igreja, podendo projetar economicamente os outros negócios do grupo empresarial do bispo Edir Macedo, como a Record.

Rafaela Barbosa é mestranda em Ciências da Comunicação na Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, pesquisadora vinculada ao Grupo de Pesquisa Comunicação, Economia Política e Sociedade – CEPOS. E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo..

 

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