Edição 337 | 09 Agosto 2010

Uma visão mais conjunta da ação social jesuíta

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Graziela Wolfart

Equipe do Cepat, de Curitiba, identifica que a emergência do movimento operário é central para entender a nova impostação da ação dos jesuítas, pois coloca uma nova preocupação e abre um novo campo de ação

Para os membros da equipe do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – Cepat, de Curitiba-PR, Cesar Sanson, André Langer e Darli de Fátima Sampaio, não há uma compreensão unívoca do trabalho social dos jesuítas. “De modo geral, o assistencialismo ainda está fortemente arraigado na mentalidade de muitos jesuítas. Nesse sentido, a ‘Instrução’ de Janssens, que remonta a 1949, ainda não está assimilada, mesmo com tudo o que significa a importância da relação entre a promoção da fé e da justiça na missão dos jesuítas, assumida na década de 1970. Ainda como dimensão social, há uma infinidade de iniciativas sociais desenvolvidas pelas obras dos jesuítas, muitas delas feitas já num horizonte mais de promoção social. Há também os centros sociais, agora reunidos em rede, que também ainda estão em busca de uma visão mais conjunta tanto teórica como praticamente”. Essas e outras declarações foram dadas na entrevista que segue, concedida por e-mail à IHU On-Line

O Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT – com sede em Curitiba, é parceiro estratégico do IHU. Uma das ações conjuntas é a elaboração de uma análise da conjuntura, em fina sintonia com a missão e as linhas estratégicas do IHU. A análise de conjuntura é uma síntese do que a página do IHU – www.ihu.unisinos.br publica diariamente, durante os sete dias da semana, nas Notícias do Dia e na Entrevista do dia.

Cesar Sanson é doutor em Sociologia. É autor dos Cadernos IHU Ideias número 60, intitulado A emergência da nova subjetividade operária: a sociabilidade invertida; e do número 94, intitulado Movimento sindical: desafios e perspectivas para os próximos anos. Também é autor dos Cadernos IHU número 32 intitulado Trabalho e subjetividade: da sociedade industrial à sociedade pós-industrial. André Langer é doutor em Ciências Sociais e autor dos Cadernos IHU número 5, intitulado Pelo Êxodo da Sociedade Salarial. A Evolução do Conceito de Trabalho em André Gorz. Darli Sampaio é mestre em Sociologia e já concedeu entrevistas à IHU On-Line. Todas as publicações e entrevistas anteriores estão disponíveis no sítio www.ihu.unisinos.br

Confira a entrevista.

IHU On-Line - Qual a influência do movimento operário para a criação dos CIAS?

Cesar Sanson, André Langer e Darli Sampaio - Os Centros de Investigação e Ação Social entram no horizonte de preocupação dos jesuítas em nível mundial no final de década de 1930 – a Congregação Geral de 1938 recomenda os trabalhos apostólico-sociais e a criação de centros de ação social –, mas com mais força nos anos 1950, com o generalato do Pe. João Batista Janssens. Até esse momento, havia, já, entre os jesuítas da Europa, experiências de Centros sociais. O impulso fundamental vem, pois, no pós-Guerra, quando a chamada Questão Social começa a ter um peso crescente na Companhia de Jesus. Fundamental, nesse sentido, é um documento de Janssens chamado “Instrução sobre o Apostolado Social”, de 1949, sumamente importante para alavancar o Apostolado Social em toda a Companhia. Nele, seu autor convoca os jesuítas para enfrentarem com afinco a nova realidade que se apresentava. A emergência do movimento operário é central para entender a nova impostação da ação dos jesuítas, pois coloca uma nova preocupação e abre um novo campo de ação. O Pe. Janssens convocava para uma ação junto aos operários, e não mais direcionada preferencialmente aos influentes da sociedade. Além dessa guinada, contribui para entender a novidade da proposta de Janssens o seu entendimento da ação social. Na sua “Instrução”, Janssens faz referência ao trabalho valoroso de “assistência social” que muitos jesuítas realizavam. Mas, no seu horizonte, a ação social deveria ocupar-se fundamentalmente da emancipação social. Mas, isso, diz Janssens, requer uma “mentalidade social”, que precisa ser criada em cada jesuíta. Essa mudança na compreensão da ação social é crucial, pois, na visão de Janssens, a situação deplorável em que os operários se encontravam era resultante de uma certa visão estrutural da sociedade que ele tinha, e não deviam ser atribuídas a uma ordem natural das coisas. Ou seja, para Janssens os ricos são ricos às custas dos pobres. Trata-se, segundo ele, de atingir as causas da situação em que os trabalhadores se encontravam, de ir à raiz das injustiças sociais. A questão do assistencialismo, aliás, ainda não está inteiramente superada na ação de muitos jesuítas. Nesse horizonte, os CIAS surgem como espaços voltados para a promoção do operariado. Insiste-se em que esses Centros Sociais, que eram chamados a “ensinar aos outros a doutrina teórica e prática” e “difundir a doutrina social da Igreja” através dos meios disponíveis na época e adaptados “às necessidades de cada região”.

IHU On-Line - Como entender o interesse dos jesuítas em viver no mundo operário? Havia ali um espírito de luta contra o comunismo?

Cesar Sanson, André Langer e Darli Sampaio - Através do critério inaciano da maioria, os trabalhadores urbanos são, por Janssens, incorporados à missão dos jesuítas. Para ele, há uma linha que liga os pobres, tidos como amigos dos jesuítas, segundo Santo Inácio, e os operários, no tempo na revolução industrial. Janssens recomenda aos jesuítas o modo de viver sóbrio dos operários como modelo de austeridade de vida. Mais, Janssens incentiva jesuítas a experimentarem o trabalho duro dos operários, indo eles próprios se empregarem em fábricas ou minas. Cria-se se assim um clima propício e favorável à inserção nos meios populares. A insistência de Janssens induziu jesuítas a viver de maneira mais simples e frugal em casas situadas em bairros pobres, experiência que se difundiu entre jesuítas do Sul do Brasil, por exemplo, e, mais esporadicamente, houve mesmo casos de jesuítas que trabalharam temporariamente em fábricas. Quanto à segunda questão, está claro que houve uma forte preocupação da Igreja e, particularmente, da Companhia de Jesus, com o “perigo” que representava o comunismo ateu, mas também o capitalismo. Mas, o foco estava voltado mais prioritariamente para a ameaça representada pelo primeiro. Para fazer frente a isso, a Companhia recomenda os trabalhos apostólicos sociais na linha do que pregavam as Encíclicas sociais de Leão XIII (Rerum Novarum) e Pio XI (Quadragesimo Anno). Entretanto, esse vício de origem deixa de ter importância com o passar do tempo, sobretudo no pós-Concílio Vaticano II, que marca uma inflexão na concepção de sociedade e de Igreja que a Igreja tem.

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