Edição 281 | 10 Novembro 2008

Frida Kahlo. Uma reconstrução a cada olhar

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Patricia Fachin

Fonte de inspiração para teólogas e teólogos, as pinturas de Frida Kahlo impulsionaram a obra Re-leituras de Frida Kahlo: Por uma estética da diversidade machucada (Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2008) organizada pela professora Edla Eggert. Em busca de novo olhar sobre as pinturas da artista, Edla diz que o livro “apresenta olhares curiosos de uma teologia que se faz pelas bordas que acumulam experiências de dor, marginalidades, e muitas possibilidades de fazer outras hermenêuticas criativas com o que temos de melhor na América Latina: artistas do cotidiano, nós mesmas!”.

Conhecida e considerada pelas feministas do mundo todo, Frida Kahlo ficou famosa por retratar nas telas a sua realidade. Em seus quadros, a pintora mexicana eternizou uma vida marcada por traições, acidentes e rejeições, rompendo preconceitos e expressando na arte os sentimentos mais reprimidos. Fonte de inspiração para teólogas e teólogos, as pinturas de Frida impulsionaram a obra Re-leituras de Frida Kahlo: Por uma estética da diversidade machucada, (Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2008) organizada pela professora Edla Eggert. Em busca de novo olhar sobre as pinturas da artista, Edla diz, na entrevista que concedeu à IHU On-Line por e-mail, que o livro “apresenta olhares curiosos de uma teologia que se faz pelas bordas que acumulam experiências de dor, marginalidades, e muitas possibilidades de fazer outras hermenêuticas criativas com o que temos de melhor na América Latina: artistas do cotidiano, nós mesmas!”. Ao engrossar a ação política por meio das artes plásticas, Frida fala sobre “sua experiência de dor num mundo micro, mas simultaneamente de todas as mulheres que vivem em dor, com dor”, aponta. Re-leituras de Frida Kahlo: Por uma estética da diversidade machucada será lançado na Feira do Livro na próxima quinta-feira, 13-10-2008.

Edla Eggert é graduada em Pedagogia, pela União das Escolas Unidas do Planalto Catarinense (Uniplac), mestre em Educação, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e doutora em Teologia, pela Escola Superior de Teologia (EST), de São Leopoldo, com a tese Educa-teologiza-ção: fragmentos de um discurso teológico (mulheres em busca de visibilidade através da narrativa transcriada). Edla já participou de alguns eventos proporcionados pelo IHU. Em março de 2007, a pesquisadora apresentou uma releitura sobre a vida de Frida Kahlo, intitulada A arte como expressão da dor e da indignação. A solidariedade de Frida Kahlo com as outras mulheres, no IHU Idéias. Em parceria com outros pesquisadores, organizou a obra A graça do mundo transforma Deus (Porto Alegre: Editora Universitária Metodista, 2006), e é autora de Educação popular e teologia das margens (São Leopoldo: Sinodal, 2003).

Ela publicou, igualmente, os Cadernos IHU Idéias números 02 e 13, intitulados, respectivamente, O feminismo ou os feminismos: Uma leitura das produções teóricas e Pomeranas parceiras no caminho da roça: um jeito de fazer Igreja, Teologia e Educação Popular.  

IHU On-Line – Que novos olhares sobre Frida Kahlo são apresentados no seu livro, Re-leituras de Frida Kahlo: Por uma estética da diversidade machucada?

Edla Eggert – São olhares curiosos de uma teologia que se faz pelas bordas. As bordas que acumulam experiências de dor, de marginalidades, e muitas possibilidades de fazer outras hermenêuticas criativas com o que temos de melhor na América Latina: artistas do cotidiano, nós mesmas!

IHU On-Line – Já conhecemos sua dedicação e admiração pelas pinturas da artista. Que outros elementos a motivaram organizar essa obra?

Edla Eggert - Em especial, foi uma pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Educação da Unisinos (PPGEDU) que estava em andamento, intitulada Mulheres tramando contra a violência, financiada pela universidade e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS). Nessa pesquisa, eu trabalhei com as formadoras das Promotoras Legais Populares, no Centro Ecumênico de Capacitação e Assessoria (CECA), e juntas estávamos confeccionando um pano de parede buscando representar a violência doméstica. Nos trabalhos de análise desse material produzido pelo grupo, me deparei com o quadro “Unos cuantos piquetitos”, de 1935, em que Frida retrata uma notícia de jornal de uma mulher morta pelo seu companheiro. Era o ano de 2006, e esse quadro começou a me incomodar e, ao mesmo tempo, conversava com André Musskopf  e com Nancy Cardoso  sobre os 100 anos de nascimento de Frida. Assim nasceu o projeto de convidar teólogas e teólogos latinos para pensar mais sobre a obra dela.  

IHU On-Line – Qual a relevância de reavaliar as pinturas da artista mexicana, 100 anos após a sua morte? De que maneira as obras de Frida continuam atuais para compreender não só a arte, mas também os sentimentos do ser humano?

Edla Eggert - A obra de Frida sempre foi considerada pelas feministas no mundo todo. Aos poucos, outros olhares foram considerando sua obra. Lembrando que o feminismo é a ação política de mulheres e de alguns homens para que sejam extintas as desigualdades de gênero, Frida engrossa essa ação política por meio das artes plásticas. Ela vem dizer sobre sua experiência de dor num mundo micro, mas simultaneamente de todas as mulheres que vivem em dor, com dor. Eu não diria reavaliar, mas dialogar com a obra dela é que nos moveu.

IHU On-Line – Como o livro nos convida a rever alguns conceitos sociais, políticos, feministas e religiosos?

Edla Eggert - Como? Desinstalando. Desinstalando do cômodo lugar que é fazer uma teologia desde sempre, para uma teologia do ainda não. Não pensada como lésbica, não pensada como dor em carne e osso de mulher, não pensada em pura paixão da carne, não pensada por meio da beleza das cores, dos cabelos cortados, da roupa que lembra o autóctone, da comida que tem gosto e cheiro de lugares inusitados, de céu e inferno simultaneamente.

IHU On-Line – Em que sentido Frida Kahlo nos ajuda a compreender a importância da mulher na sociedade?

Edla Eggert - No sentido de expor experiência, correr o risco de riscar e por meio do risco fazer o desenho, desenhando, fazer sua arte/vida. Autorizar-se. As mulheres estão a caminho de se autorizarem a serem o que desejarem.

IHU On-Line – Que relações são possíveis traçar entre a imagem de Frida Kahlo e a teologia feminista?

Edla Eggert - As relações possíveis são a ousadia de buscar por meio da narrativa (auto)biográfica um caminho de histórias de vida. No caso de Frida, seus auto-retratos colocaram em evidência temas relacionados com muitas facetas da vida das mulheres: amores, abortos, violências, o corpo em dor, comidas, lutas políticas, animais, vestidos, família, líderes políticos e religiosos, todos numa micro-política estética dançando em torno dela. Os quadros, quase todos num tamanho pequeno, parecem crescer em tamanho devido às temáticas retratadas. Também a teologia feminista realizada em pequenos grupos, desenvolvendo argumentos às vezes às margens, às vezes quase subsumida, tece outras possibilidades. Não a única, nem a melhor nem a pior simplesmente uma outra, de uma outra margem.

IHU On-Line – Qual é obra de Frida Kahlo, na sua opinião, que melhor representa a imagem da artista?

Edla Eggert - Frida é sempre uma reconstrução a cada olhar. É desintegração como diz ela mesma e o texto de Marcela Althaus-Reid.  Frida é Frida e eu me calo!

Leia mais...

>> Na edição especial realizada pela IHU On-Line sobre Frida Kahlo (Frida Kahlo 1907-2007. Um olhar de teólogas e teólogos. Edição número 227, de 09-07-2007), confira entrevistas com alguns participantes da obra organizada pela professora Edla Eggert. Acesse e faça download da edição completa em www.unisinos.br/ihu.
 
* A subjetividade e a realidade da mulher a partir da obra de Frida Kahlo. Entrevista especial com Vanessa Macedo, publicada nas Notícias do Dia 20-08-2008;

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