Edição 279 | 27 Outubro 2008

A recessão é inevitável

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Patricia Fachin

Na avaliação do economista Paulo Sandroni, independentemente das medidas adotadas para estabilizar a economia mundial, chegou o momento de repensar a fragilidade do sistema financeiro internacional e o americano, causador da crise

A cada semana, novas medidas são apresentadas para tentar conter a quebradeira sistêmica de bancos que estão à beira da falência. As decisões tomadas até então impediram que a situação instalada se agravasse, mas, considerando a dimensão da crise financeira internacional, “uma recessão é inevitável”, avalia Paulo Sandroni, economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Na entrevista concedida, por e-mail, à IHU On-Line, Sandroni afirma que a confiança no mercado só será retomada se houver uma forte regulação, e a tranqüilidade econômica, aponta, está prevista para 2011. Sobre o futuro das economistas capitalistas, ele é enfático: elas terão “um crescimento muito baixo”. O Brasil, por outro lado, “tem condições de superar certas dificuldades, pois acumula reservas e seu setor financeiro não está muito exposto aos riscos”, considera.

Mestre em Economia, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Sandroni é professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Entre suas obras, citamos Dicionário de administração e finanças (Rio de Janeiro: Best Seller, 1996), Dicionário de economia do século XXI (Rio de Janeiro: Record, 2006) e Traduzindo o economês. Para entender a economia brasileira na época da globalização (Rio de Janeiro: Best Seller, 2006).

IHU On-Line – Os pacotes de ajuda financeira lançados pelos EUA, União Européia e Inglaterra não conseguiram sanar a crise. Que medidas são prudentes, nesse momento, para conter a instabilidade financeira? O mercado conseguirá elevar novamente os níveis de confiança?

Paulo Sandroni - Creio que o importante agora é evitar a quebradeira dos bancos. Os pacotes europeus, inglês e norte-americano impediram que isso acontecesse. Mas uma recessão é inevitável. Depois de algum tempo, dois ou três anos, a confiança poderá retornar se medidas regulatórias duras forem tomadas.

IHU On-Line - Que custos essa crise vai causar aos Estados? Salvar instituições privadas que estão à beira da falência, com dinheiro público, ainda é pertinente?

Paulo Sandroni - É o custo de quem tem uma única saída. A alternativa de deixar os bancos falirem seria desastrosa.

IHU On-Line – Qual será o destino das economias capitalistas, nos próximos anos?

Paulo Sandroni - Ter um crescimento muito baixo, e tentar a recuperação com forte intervenção estatal com programas de estímulo ao investimento mantendo a demanda efetiva.

IHU On-Line – O senhor diz que o Brasil já está sendo atingido pela crise. Que implicações a economia brasileira vai sofrer a partir desse momento? O país tem condições de enfrentá-la?

Paulo Sandroni - O Brasil já foi atingido no setor de crédito, especialmente o comércio exterior e a agropecuária. Creio que o país tem condições de superar certas dificuldades, pois acumula reservas e seu setor financeiro não está muito exposto aos riscos, portanto deverá ser preservado. Mas, se a crise se aprofundar, creio que também teremos uma forte retração.

IHU On-Line – Com o decrescimento da economia chinesa, o senhor diz que a indústria brasileira será bastante prejudicada com a crise. Em que medida a desaceleração da economia brasileira pode gerar, novamente, uma desindustrialização no país?

Paulo Sandroni - Não creio que a indústria sofrerá um golpe tão forte. Mas é claro que, com a desaceleração da economia chinesa, nossas exportações, que estavam crescendo para aquele país, sofrerão uma retração, e todas as atividades atreladas a este setor também sofrerão forte desaceleração.

IHU On-Line – Os índices mostram que várias empresas estão cancelando investimentos no Brasil, e outras, além de darem férias coletivas, já demitiram muitos funcionários. Que conseqüências o senhor vislumbra para o emprego e a distribuição de renda no país, a partir desses indicativos?

Paulo Sandroni - Em momentos de forte retração da economia, o desemprego normalmente aumenta e a distribuição de renda sofre uma piora. Isto já aconteceu antes no Brasil, especialmente no início dos anos 80.

IHU On-Line – Nesse momento, é necessário repensar um projeto econômico e político para o país? Qual seria?

Paulo Sandroni - Na verdade, não creio que exista um projeto econômico e político para o Brasil. O que deve ser repensado é a situação de fragilidade do sistema financeiro internacional, especialmente o americano, que provocou a crise.

IHU On-Line – As teorias econômicas ainda são eficientes para explicar e compreender o atual momento de turbulência?

Paulo Sandroni - Creio que as teorias econômicas existentes são capazes para explicar e compreender a crise, especialmente o enfoque keynesiano,  e mais recentemente as contribuições de Hyman Minsky.  O que a teoria não tem condições é de prever o que irá acontecer com razoável precisão.

IHU On-Line – A instabilidade do mercado financeiro levará a economia mundial a uma recessão sem precedentes?

Paulo Sandroni - Não sei se sem precedentes, pois a de 1929 reduziu o PIB americano quase pela metade. Mas o que sabemos hoje é que ela será muito forte.

 

Baú da IHU On-Line

Sobre o tema da crise financeira internacional, confira mais entrevistas realizadas pela IHU On-Line, disponíveis para download no site do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, WWW.unisinos.br/ihu.

- A crise financeira internacional. O retorno de Keynes. IHU On-Line nº 276, de 06-10-2008.
- A financeirização do mundo e sua crise. Uma leitura a partir de Marx. IHU On-Line nº 278, de 20-10-2008.  
- “Ninguém sabe, na realidade, até onde a crise pode chegar”. Entrevista especial com André Biancareli, publicada nas Notícias do Dia, de 10-10-2008.
- Soluções para a crise financeira? Uma questão política e jurídica que esbarra nos limites do capitalismo. Entrevista especial com André Lourenço, publicada nas Notícias do Dia de 17-10-2008 
- Ainda que seja inevitável que a economia brasileira sofra com essa crise, ela tem boas condições para enfrentá-la. Entrevista especial com Simone de Deos, publicada nas Notícias do Dia de 18-10-2008
- "Para evitar novos danos no futuro, os mercados financeiros precisam ser regulamentados". Entrevista especial com Thaiza Regina Bahry, publicada nas Notícias do Dia de 23-10-2008.

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