Edição 269 | 18 Agosto 2008

O banheiro do Papa

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Gilmar Hermes

Publicamos um artigo sobre o filme O banheiro do Papa, escrito pelo jornalista e Prof. Dr. Gilmar Hermes, das Ciências da Comunicação da Unisinos, a pedido da IHU On-Line. Gilmar é mestre em Artes Visuais pela UFRGS e doutor em Comunicação pela Unisinos.

O filme comentado nessa edição foi visto por algum/a colega do IHU e está em exibição nos cinemas de Porto Alegre, como Cine Guion, no Shopping Nova Olaria.

O banheiro do papa

Ficha Técnica:
Título original: El baño del Papa
Gênero: Drama
Tempo de duração: 97 minutos
Ano de lançamento (Brasil / Uruguai / França): 2007
Direção: César Charlone e Enrique Fernández
Elenco: César Trancoso (Beto), Virginia Mendez (Carmen), Virginia Ruiz (Sílvia), Mario Silva (Valvulina), Henry de Leon (Nacente), Jose Arce (Tica), Nelson Lence (Meleyo), Rosario dos Santos (Teresa), Alex Silva (Gordo Luna), Baltasar Burgos (Capitão Alvarez), Carlos Lerena (Soldado)
Sinopse: 1998, cidade de Melo, na fronteira entre o Brasil e o Uruguai. O local está agitado, devido à visita em breve do Papa. Milhares de pessoas virão à cidade, o que anima a população local, que vê o evento como uma oportunidade para vender comida, bebida, bandeirinhas de papel, souvenires, medalhas comemorativas e os mais diversos badulaques. Beto (César Trancoso), um contrabandista, decide criar o banheiro do Papa, onde as pessoas poderão se aliviar durante o evento. Mas para torná-lo realidade ele terá que realizar longas e arriscadas viagens até a fronteira, além de enfrentar sua esposa Carmen (Virginia Mendez) e o descontentamento de Silvia (Virginia Ruiz), sua filha, que sonha em ser radialista.

O banheiro do Papa
Por Gilmar Hermes

Publicamos, a seguir, um artigo sobre o filme O banheiro do Papa, escrito pelo jornalista e Prof. Dr. Gilmar Hermes, das Ciências da Comunicação da Unisinos, a pedido da IHU On-Line. Gilmar é mestre em Artes Visuais pela UFRGS e doutor em Comunicação pela Unisinos.

Uma paisagem pampeira com um tom azulado, o cotidiano de gente simples e o sonho de uma vida melhor são alguns dos ingredientes do filme O banheiro do Papa. Os personagens moram na cidade de Melo, fronteira entre o Uruguai e o Brasil. Vivenciam a expectativa da vinda do Papa João Paulo II  à cidade, como se, de uma hora para a outra, o município pudesse comercializar, com o mundo, tudo que pudesse estar relacionado ao sagrado e às necessidades ou anseios de uma multidão. A narrativa do filme evoca questões como a fé religiosa, as estruturas de poder e a construção social da realidade, que tem como um dos elementos fundamentais os meios de comunicação.

A história penetra no cotidiano de uma família simples, à beira da exclusão, mas que sobrevive graças aos laços comunitários que a sustentam. Sentimos na pele todas as angústias de Beto, o protagonista, um homem que vive do contrabando de mercadorias. Entramos dentro da sua casa, experimentamos sua força e suas fragilidades, nos alegramos ou nos debatemos com as reações de sua mulher e de sua filha. Com uma estética realista, mas não sensacionalista, o filme realmente tem um sabor de verdade, com atores capazes de incorporar a pele de gente simples.

As fronteiras entre a lei e o crime, aliadas às estruturas do poder, mostram-se porosas ou, até mesmo sem limites. As regras colocam-se como algo que pressupõe a sua desobediência, dependendo das negociações com as instâncias de autoridades, sejam os que detêm a decisão sobre a lei (o fiscal da fronteira) ou o dinheiro (os pequenos comerciantes).

O repórter de TV – que aparece sobretudo como um profissional em ação na telinha - pode ser uma caricatura de um papel social, mas, de qualquer maneira, as cenas em que aparece colocam em questão as mediações feitas pelos meios de comunicação e como elas interferem no suceder dos fatos. Toda a comunidade é projetada na representação que a TV faz dela e passa a vivenciar isso como uma realidade concreta. Todos acreditam que a cidade será invadida por uma multidão de consumidores. Beto decide construir um banheiro, com vaso sanitário, algo que sua própria família ainda não dispõe, para atender ao público, o que ironicamente chama de “serviço higiênico”.

A filha sonha em ser radialista, formação que necessitaria de um esforço conjunto de toda a família. Ela se depara, porém, com o próprio pai carregando um vaso sanitário sobre as costas, na televisão, em meio à multidão, desesperado por tudo que teve de enfrentar nesse caminho. De repente, a mídia ganha um novo sentido, sendo um espelho que mostra o drama doméstico monumentalizado, como se fosse uma infiltração em meio a todo o sonho que a emissora não desiste de projetar.

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