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Márcia Junges
“O segredo do êxito de Hitler esteve no fato de ele ter sido subestimado. Isto vale tanto para os comunistas e os socialistas quanto para os conservadores, mas também para as potências estrangeiras. Ninguém podia imaginar que ele provinha do inferno”, aponta o historiador alemão Michael Stürmer na entrevista a seguir, concedida com exclusividade, por e-mail, à IHU On-Line. Em sua análise, Hitler se valeu do recurso à legalidade para galgar o poder em 1933, quando se tornou chanceler. Assim, ele conquistou a confiança e enganou a todos, afirma o estudioso. Além disso, “a Europa não tinha muita escolha e de fato houve silenciosa concordância e criminosa colaboração”, já que “os nazistas sabiam combinar magistralmente sedução e violência”. Questionado sobre os motivos da adesão dos jovens ao nazismo, ele enfatiza: “Juventude é embriaguez sem vinho. A capacidade de sedução é enorme. O desejo do parricídio também”.
Desde 1973, Stürmer é professor adjunto de estudos europeus e professor emérito de história medieval e moderna da Universidade Friedrich-Alexander, Erlangen-Nürnberg. Estudou História, Filosofia e Línguas na London School of Economics e Ciências Políticas na Universidade Livre de Berlim e na Universidade de Marburg. Foi conselheiro político do chanceler Helmut Kohl nos anos 1980. Desde 1989, é diretor de redação do jornal alemão Die Welt. Escreveu, entre outros, Bismarck und die preussisch-deutsche Politik, 1871-1890 (München: Deutscher Taschenbuch-Verlag, 1970), Die Reichsgründung: deutscher Nationalstaat und europäisches Gleichgewicht im Zeitalter Bismarcks (München: Deutscher Taschenbuch Verlag, 1984) e The German Empire, 1870-1918 (New York : Random House, 2000).
IHU On-Line – Numa entrevista ao jornal La Repubblica, em 25-01-2008, o senhor afirmou que o êxito de Hitler ocorreu porque ele foi subestimado por todos ou quase todos. Poderia esclarecer isto melhor?
Michael Stürmer - O segredo do êxito de Hitler esteve no fato de ele ter sido subestimado. Isto vale tanto para os comunistas e socialistas quanto para os conservadores, mas também para as potências estrangeiras. Ninguém podia imaginar que ele provinha do inferno.
IHU On-Line – Poderia explicar a tentativa de Hitler de um golpe em 1923 e sua ascensão a Chanceler, dez anos mais tarde? Qual é a diferença destas duas tentativas de chegar ao poder?
Michael Stürmer – O ano de 1923, como você diz, foi um golpe em tempos selvagens. Em 1933, como conseqüência do fracasso dez anos antes, houve o recurso à legalidade, para conquistar confiança e enganar a todos.
IHU On-Line – Até que ponto as sanções impostas pelo tratado de Versalhes, em 1933, contribuíram para criar condições políticas e sociais para a ascensão de Hitler ao poder?
Michael Stürmer - Nas mentalidades, como humilhação e constante argumento para revisão e vingança.
IHU On-Line – O que o leva a admitir que o poder de Hitler poderia ter sido evitado? Por que isso não ocorreu?
Michael Stürmer - Tudo pode ser evitado, ou, com mais precisão, nada é predeterminado. Caso contrário, onde ficaria o conceito de liberdade e responsabilidade?
IHU On-Line – Qual era a situação dos partidos de direita e esquerda no período entre as guerras? De que modo esta situação política contribuiu para o advento do nacional-socialismo?
Michael Stürmer - A República de Weimar foi uma civitas sitiada, desde o início, de ambos os lados: a guerra civil da esquerda, que no início foi forte, e a da direita, que no final venceu. Mas o nacional-socialismo é ambas as coisas: direita e esquerda – isto não se pode esquecer, caso se queira explicar o seu êxito.
IHU On-Line –Quais foram as influências intelectuais de Hitler? Até que ponto ele realmente entendeu os autores que ele afirma ter lido? Na mesma entrevista ao La Repubblica, o senhor considera que “o completo niilismo de sua vontade de poder não foi levado a sério”.
Michael Stürmer - Hitler foi leitor compulsivo e autodidata. Mas, sobretudo um possuído pelo poder. Somente uma edição crítica de seu Mein kampf poderá dar informação mais exata a essa pergunta.
IHU On-Line – Por que, quando Hitler massacrou os judeus, a Europa, enquanto calava, manteve uma política de concordância disfarçada?
Michael Stürmer - A Europa não tinha muita escolha e de fato houve silenciosa concordância e criminosa colaboração – junto a uma oposição e resistência muito séria. Por quê? Os nazistas sabiam combinar magistralmente sedução e violência.
IHU On-Line – Alguns autores afirmam que o fenômeno do nazismo não seria uma anomalia social ou uma patologia cultural, mas uma síntese do pensamento reacionário europeu. Qual é seu ponto de vista?
Michael Stürmer - Sobre isto, dou duas respostas. Quem se prepara para a guerra de ontem, vencerá a de amanhã. Mas a radical combinação de esquerda-direita, impulsionada pela crise social e de recursos, pode retornar e já é observável em alguns lugares. Os humanos aprendem pouco.
IHU On-Line – Na Alemanha e no mundo atual, ainda há lugar para tal tipo de ditador político? As pessoas que vivem em pleno século XXI ainda apoiariam tal política?
Michael Stürmer - Não. As tentações são sempre diferentes, sempre novas. O estado do bem-estar torna todos nós imaturos. A história é mais rica em suas variações do que em deixar-se influenciar por pura repetição. Hoje em dia, as tiranias chegam via Tecnologia de Informação, via estado do bem-estar, estado econômico etc. Como poderia você acreditar que o nível de moral ou de sabedoria seria hoje mais alto do que nos anos 1970, 1980?
IHU On-Line – Que razões explicam a maciça adesão da juventude à proposta de Hitler?
Michael Stürmer - Juventude é embriaguez sem vinho. A capacidade de sedução é enorme. O desejo do parricídio também.
IHU On-Line – O senhor nota uma diferença entre a história considerada oficial e a história oral sobre o nazismo na Alemanha?
Michael Stürmer - Isso são duas dimensões incomensuráveis: assim como História e histórias.
IHU On-Line – Após 75 anos desde a ascensão de Hitler ao poder, como os alemães lidam com o passado?
Michael Stürmer - Sempre falar disso, jamais pensar nisso.