Edição 259 | 26 Mai 2008

Claudonir Fernandes Cipriano, o Táista

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Graziela Wolfart

“Eu sou um cara bom de coração. Não adianta nada. Sou sincero, nunca gostei de mentira, de iludir a pessoa. Se é aquilo, é aquilo, eu cumpro meu dever. Gosto de ajudar os outros.” Assim se autodefine o zelador montenegrino Claudonir Fernandes Cipriano, o Táista, como é chamado e conhecido na cidade. Na entrevista que concedeu à IHU On-Line no prédio onde trabalha, ele falou sobre sua vida, sua trajetória e sua visão de mundo, na qual a família tem importância fundamental. Confira:

Nascido em Montenegro em 21 de outubro de 1942, nosso perfil popular dessa semana tem hoje 65 anos. Claudonir Fernandes Cipriano, ou Táista, como todos o chamam, tem um irmão mais velho e duas irmãs mais novas. “A gente era entre sete irmãos. Três já morreram. O pai era ferroviário e faleceu aos 52 anos. Minha mãe fazia as coisas dentro de casa. Morreu com 77 anos, em cima de uma cama, do coração. Não é porque era minha mãe, mas era a coisa mais querida. Pena ter morrido”, lamenta.

Quando perguntado sobre os estudos, Táista conta que foram “mais ou menos”. E explica. “Eu era cabeça muito oca. Não adianta. Eu queria me dedicar sempre à música.” Ele conseguiu terminar a segunda série do ensino fundamental. Depois, só quis saber do violão. A paixão pela música começou dentro de casa. “Cresci vendo meu pai tocar e aprendi assim, observando ele e outras pessoas. Eu pratiquei violão e também aprendi a tocar guitarra. Aula eu nunca tive, sinceramente. Aprendi só olhando.” E, sobre seu palco, ele confessa: “Vou ser bem franco e sincero: eu tocava em boate”. Táista chegou a tocar em conjuntos musicais também, mas afirma não ter muitas lembranças. Tudo porque em 1996 ele sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC). “Desde que tive o derrame ando meio esquecido. Passei por isso porque eu fumava demais naquela época. Cigarro, né? Todo mundo me dizia que eu tinha que parar de fumar, mas eu não dava bola.” Ele lembra que um ano antes de sofrer o derrame, em 1995, vinha caminhando e lhe faltou o ar. Já era um anúncio do que viria no ano seguinte. “Teimoso fui eu. Depois disso, não fumei nunca mais”, garante.

A busca pelo pão de cada dia
Na época do AVC, Táista trabalhava nas Lojas Colombo, em Montenegro, onde era ajudante de entrega e montagem de móveis. À noite, nos finais de semana, era segurança nas festas dos clubes da cidade. Em sua carteira profissional, constam também passagens pela fábrica de bebidas Antártica, pela empresa do mercado de aves Frangosul (hoje Doux Frangosul) e pelos Supermercados Zimmermann. Faz 13 anos que Táista é o zelador do Edifício Fernanda, em Montenegro, um prédio onde moram cerca de 50 famílias. Amigo de todos os moradores, ele é sempre solícito, abre e fecha a porta, ajuda a segurar as sacolas, resolve pequenos problemas cotidianos e zela pela segurança do prédio. “Eu gosto do pessoal daqui e graças a Deus todo mundo também gosta de mim, são bons pra mim, não tem coisa melhor”, define.

Casamento e família
Táista conheceu Sonia, sua esposa, na época em que trabalhava em São Jerônimo, numa boate, tocando “na noite”. “Nos domingos eu jogava futebol. O irmão dela, meu cunhado, era treinador do nosso time. Foi ali que surgiu nosso romance. E ela é branca! No início, as pessoas eram contra o nosso romance, porque eu sou de cor e trabalhava em boate. Sabe como é, né? Eu disse pra ela: vamos embora pra Montenegro, eu caso contigo e não tem problema. E deu tudo certo, há mais de 30 anos.” O casal tem duas filhas. A Tatiana, mais velha, vai fazer 33 anos e trabalha em uma creche. É divorciada, mas deu a Taísta e Sonia uma neta chamada Luísa, que tem um ano e meio. “Nossa outra filha, Andréia, é deficiente, doente. Tem 26 anos. Ela é surda e muda, desde nascença. Tem dias que tá atacada, nervosa. Mas eu sempre peço pra Deus dar saúde pra mim e pra minha nêga véia, pra gente estar sempre junto dela, pra cuidar dela. É a missão nossa e não adianta nada”.

Fé e visão de mundo
Táista diz que acredita em Deus. Ele freqüenta a Igreja do Evangelho Quadrangular, onde toca violão nas celebrações todas as sextas-feiras e, às vezes, aos domingos também. Sobre política, ele afirma que não entende muito, que é leigo no assunto. “Sei que há muita mentira. Iludem o ser humano. Não sei não. Não acredito muito.” E, na hora de citar um momento ruim de sua vida, ele escolhe a perda da mãe. “Sofri muito. Foi muito triste. Agora, esses dias, eu tava na igreja, no dia das mães, quando falaram, eu até chorei, lembrei dela”. Taísta tem dificuldade de citar momentos felizes em sua vida. Mas, depois de uma longa pausa, pensando, cita o casamento e a melhora de vida depois dele, e também o nascimento das filhas.         

Na tentativa de se autodefinir ele dispara: “Eu sou um cara bom de coração. Não adianta nada. Sou sincero, nunca gostei de mentira, de iludir a pessoa. Se é aquilo, é aquilo, eu cumpro meu dever. Gosto de ajudar os outros”. Se pudesse mudar qualquer coisa no mundo, ele gostaria de não ver mais as cenas de roubo e assalto que aparecem na televisão, assim como “os rapazinhos que fumam cocaína e esses outros troços aí”. Ele também gostaria que tivesse mais emprego para as pessoas. O grande sonho de Táista é que Deus o abençoe e o ilumine para ter saúde e estar sempre junto com sua família, que, para ele, é muito importante.

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