Edição 259 | 26 Mai 2008

A tecnologia do silício definiu e define ainda uma nova era do processo civilizatório

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Patricia Fachin

Embora apresente limitações, o silício continuará sendo utilizado na elaboração de produtos eletrônicos, assegura Israel Jacob Rabin Baumvol

Para Israel Jacob Rabin Baumvol, a tecnologia do silício para a construção de eletrônicos ainda está longe de ser substituída. “Passados vinte anos, o silício ainda responde por mais de 95% dos circuitos integrados fabricados”, garante.  Em entrevista à IHU On-Line por e-mail, o pesquisador descarta a possibilidade do material ser substituído por nanotubos, uma das grandes promessas das nanotecnologias. Entretanto, chama a atenção para outros materiais, como arbeto de silício, germânio, arseneto de gálio, que poderão ser aproveitados para fabricar “circuitos tridimensionais baseados em tecnologia do silício”.
Baumvol é graduado e doutor em Física, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com mestrado na mesma área pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, é docente da Universidade de Caxias do Sul. O pesquisador ministrará o minicurso “Limites da tecnologia do silício para computadores”, na quarta-feira, 28-05-2008, às 14h.

IHU On-Line - Como o senhor percebe o desenvolvimento do silício ao longo dos anos? De que maneira esse elemento químico tem contribuído para a produção de materiais eletrônicos?
Israel Jacob Rabin Baumvol
- Não houve quase nenhuma evolução até 1960, a não ser o reconhecimento do silício como um material semicondutor. Daí para frente, com algumas descobertas e desenvolvimentos cruciais, o silício mono-cristalino ultra puro, globalmente conhecido como electronic grade c-Si, passou ser o material semicondutor de base para a construção de circuitos eletrônicos integrados.
 
IHU On-Line - No passado, houve uma grande expectativa de que o arseneto de gálio (GaAs) viesse a substituir o silício na eletrônica. Assim, muitos grupos de estudos brasileiros passaram a se dedicar ao estudo de semicondutores dessa família. Essa posição deixou o Brasil mais atrasado em ciência e tecnologia de semicondutores à base de silício?
Israel Jacob Rabin Baumvol
- O arseneto de gálio é, efetivamente, um material semicondutor de grande potencial para aplicações em eletrônica. O fato de quase todo o esforço brasileiro ter sido dirigido para esse material durante quase duas décadas foi um equívoco, resultado do nosso contexto tecnológico e industrial pobres e mal informados, o qual nos levou a aderir facilmente a coisas que estavam muito em moda e por isso ofereciam uma ilusão de superação fácil e rápida de nosso atraso. Não foi assim. Passados vinte anos, o silício ainda responde por mais de 95% por cento dos circuitos integrados fabricados e o arseneto de gálio continua a ser uma grande expectativa.

IHU On-Line - Como o senhor percebe o desenvolvimento da tecnologia do silício no mundo? E no que se refere ao Brasil? Essa tecnologia está sendo desenvolvida com eficiência?
Israel Jacob Rabin Baumvol
- A tecnologia do silício definiu e define ainda uma nova era do processo civilizatório. A era do silício é o nome que será dado no futuro ao estágio atual do processo civilizatório, equivalente à era da pedra polida, do bronze, do aço, dos grandes descobrimentos, da revolução industrial e outros. Outros nomes alternativos à era do silício também aparecem freqüentemente, tais como civilização pós-industrial, pós-moderna, civilização tecnológica e outras. Mas, seguindo o hábito de designar o nome do estágio do processo civilizatório pelo material predominante, o que distingue realmente a era atual das anteriores é a tecnologia do silício. Quanto ao Brasil, a coisa mais branda que posso dizer é que até agora nos permitimos ignorar a era em que vivemos. Por quê? Com a palavra os nossos pensadores.

IHU On-Line - Muito já se falou sobre um possível fim da era do silício. Entretanto, hoje alguns especialistas discordam sobre o futuro da tecnologia do silício. Alguns o consideram um elemento altamente estratégico e outros dizem que passarmos da tecnologia do silício para a tecnologia os nanotubos de carbono. Como o senhor percebe essas posições? O silício ainda vai resistir?
Israel Jacob Rabin Baumvol
- Evidentemente, a tecnologia do silício não é a tecnologia final. Outras virão, como sempre vieram. Porém, estamos muito longe de nanotubos de carbono, ou qualquer outro material, que possa substituir o silício como material de base para a eletrônica. Por agora e por muitos anos ainda, continuaremos fabricando e desenvolvendo a eletrônica com base na tecnologia do silício.

IHU On-Line - A tecnologia do silício tem enfrentado um impasse relacionado com a lei de Moore, devido ao número de transistores em microprocessadores que dobram a cada dois anos, multiplicando a capacidade de processamento. Há um limite para essa progressão que é incapaz de ser atendido pela tecnologia eletrônica do silício? Qual é a alternativa para superar essa limitação?
Israel Jacob Rabin Baumvol
- Existem limitações físicas para a tecnologia do silício, tal como ela é usada hoje na fabricação de circuitos integrados em ultra-alta escala, continuar cumprindo as previsões da lei de Moore.  Nesse momento, a indústria está vivendo, dolorosamente, as conseqüências econômico-financeiras das dificuldades de superação destes limites. Mas há, por outro lado, um esforço industrial enorme de superação. No ano passado, a empresa Intel anunciou publicamente que passaria a utilizar industrialmente um material alternativo ao dióxido de silício como isolante de porta na tecnologia do silício, rompendo com quarenta anos de tecnologia bem-sucedida e promovendo o progresso de uma indústria que não conseguia mais avançar. Neste ano de 2008, a empresa IBM patenteou um processo de interconexão no interior dos circuitos integrados utilizando luz, o que constitui outra ruptura dos quarenta anos de sucesso da tecnologia maravilhosamente simples e bem-sucedida metal/óxido/semicondutor (MOS) baseada em silício policristalino/óxido de silício/silício. Portanto, e como sempre, apesar das limitações, a era do silício parece estar ainda bastante bem de saúde, longe do seu fim. Mas uma tecnologia de ruptura pode surgir a qualquer momento. Por que não? A duração das etapas do processo civilizatório, aliás, sempre encurtaram ao longo do tempo.  É bem razoável admitir que a era do silício seja a mais curta de todas, pelo menos até agora. Então, talvez esteja havendo por agora uma flutuação, afastando a evolução da indústria da lei de Moore, mas tal lei pode voltar a ser obedecida mais adiante.

IHU On-Line - Terá o homem capacidade de criar uma máquina muito mais rápida que o cérebro humano? O que isso significa para a humanidade? O que essa mudança significa para a tecnologia?
Israel Jacob Rabin Baumvol
- Qual é a velocidade de processamento do cérebro humano? Qual é a relação entre velocidade de processamento e as funções de nosso cérebro? Quem disse que, se tivermos um processador eletrônico mais rápido do que o processador humano, isso vai levar tal processador a realizar as funções do cérebro e, sobretudo, as funções do homem, tais como desejo, tristeza, criatividade, inspiração, obstinação e muitas outras. Tantas questões para o futuro. Pena que fiquemos velhos.

IHU On-Line - Existem limites da tecnologia do silício para a construção de computadores?
Israel Jacob Rabin Baumvol
- Existem limites para tudo, inclusive a tecnologia do silício para a construção de computadores. Porém, até hoje a tecnologia do silício sempre estendeu os limites e, tanto quanto eu consigo ver, continuará estendendo até que apareça uma tecnologia de ruptura. Qual? Nanotubos, arseneto de gálio, orgânicos, bactéria magnética. A resposta a essa pergunta vale muito, muito !
 
IHU On-Line – Quais são os riscos que envolvem a manipulação do silício?
Israel Jacob Rabin Baumvol
- Falência, concordata, fusões, aquisições, contaminação ambiental, consumo de energia, contaminação com gases tóxicos, explosões, incêndios. Enfim, o mesmo que as outras indústrias, todas subordinadas à dialética risco-oportunidade.
 
IHU On-Line - Além do silício, que outros elementos são fundamentais para criar eletrônicos mais potentes?
Israel Jacob Rabin Baumvol
- Por agora, precisamos ficar muito atentos ao carbeto de silício, ao germânio, ao arseneto de gálio, ao silício tensionado e alguns outros. Mas precisamos ficar atentos também às possibilidades de fabricar circuitos tridimensionais baseados em tecnologia do silício, uma ruptura com a tecnologia planar que sempre foi usada. De onde virá o avanço?

IHU On-Line - No que se refere aos estudos e aplicações das nanotecnologias, áreas como engenharia, física, biologia, medicina e ciência básica precisam atuar de maneira mais integral e interdisciplinar? Quais os desafios nesse campo?
Israel Jacob Rabin Baumvol
- Os desafios variam com a geografia. No Japão, na Coréia, na Alemanha, na Inglaterra e nos Estados Unidos, entre outros países que estão liderando, o desafio é atingir o mercado com produtos que retornem os enormes investimentos de todo tipo que foram feitos recentemente, humanos, financeiros, políticos, tecnológicos e no próprio desenvolvimento do mercado. No Brasil, México, Hungria, Austrália e outros países, que estão tentando acompanhar os líderes, o desafio é aumentar muito todos esses investimentos. A interdisciplinaridade decorre do desenvolvimento, fruto da vontade política e da sua principal conseqüência, o investimento.

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