Edição 352 | 29 Novembro 2010

A memória, uma categoria central do cristianismo

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Márcia Junges | Tradução Ana Casarotti

IHU On-Line - Como aluno de Metz, quais são as maiores recordações que tem dele, dentro e fora do ambiente acadêmico?

José Antonio Zamora –


IHU On-Line - Qual é o seu contato atual com a Universidade Centro-Americana (UCA)? Tem viajado para El Salvador com frequência?

José Antonio Zamora -
A relação com a Universidade de Centro-Americana de El Salvador – UCA - provém de que o Instituto de Filosofia do Conselho Superior de Investigações Científicas – CSIC da Espanha tem mantido sempre uma boa convivência com a faculdade de filosofia da UCA. Muitos professores do CSIC lecionam como visitantes da UCA, como José María Mardones , Reyes Matte  e José María Gonzalez .
Certa vez o decano da faculdade de filosofia da UCA, Hector Samur, pediu-me para dar um curso de doutorado naquela instituição. Sou integrante da equipe de professores do doutorado da faculdade de Filosofia. Por outro lado, coordeno um fórum em Murcia, uma cidade do sul da Espanha, cujo nome é Fórum Ignacio de Ellacuría. Então, nossa relação é muito próxima.


IHU On-Line - Conheceu Ignacio Ellacuría  e Jon Sobrino ? Qual é a importância desses dois teólogos na contemporaneidade?

José Antonio Zamora -
Não cheguei a conhecer a Ignacio de Ellacuría. Mas conheci Jon Sobrino na UCA. Visitei-o e falei com ele. Quando pensamos em formar em Mursia um fórum de debates, de discussão, de difusão de pensamento crítico, convertemos intelectuais como Sobrino em nossos referenciais. Isso porque entendíamos que primeiro compartilhamos a opinião de que a realidade só é revelável na sua verdade, quando se olha a partir da perspectiva dos últimos, das vítimas. E o pensamento só pode ser verdadeiro quando se compromete com essa perspectiva e com a libertação das vítimas. Então, nesse sentido foi como os escolhemos estes intelectuais como nossos referenciais.


IHU On-Line - Em que aspectos o pensamento de Benjamin nos ajuda a compreender melhor os rumos da Teologia hoje?

José Antonio Zamora -
Penso que é preciso ter cuidado para que não ocorra uma teologização de pensadores que não são teólogos. Esse é um pequeno vício dos cristãos, ou do cristianismo. Sempre pretendemos batizar a todos. Benjamim é relevante para a teologia na medida em que ajuda a desentranhar o momento histórico que vivemos. Para uma teologia pós-idealista, pós-metafísica, que não elabora seu discurso sobre Deus desde fora da história, fora da sociedade e dos processos que se vivem na história e na sociedade, aqueles pensadores que nos ajudam a compreender essa história e essa sociedade são fundamentais. Nesse sentido, Benjamim teve intuições que têm a ver com as transformações do capitalismo a partir do final do século XIX, a percepção dos processos que conduziriam às grandes catástrofes do século XX, o final do socialismo, além de sua compreensão da estética, da produção cultural no capitalismo do século XX. Walter Benjamim não é só um pensador, mas, em certa medida, é uma testemunha que pagou com a sua própria vida. Ele é uma testemunha do perigo, e compreendeu que essa proximidade com o perigo tem um valor capital para desentranhá-lo. Benjamin é um pensador que segue atual.


IHU On-Line - Considerando o panorama cada vez mais secularizado do Ocidente, quais são os rumos da Teologia no século XXI?

José Antonio Zamora -
Não estou muito seguro sobre essa secularização. Está havendo, desde sempre, uma transmutação do sagrado e uma transmutação do religioso. O religioso está em permanente transformação. Provavelmente, hoje temos um panorama muito diversificado, desde os fundamentalismos até uma religiosidade mais ou menos adaptada às leis do mercado. Percebo, inclusive, uma religiosidade de bricolagem e a emergência de uma configuração religiosa de determinados fenômenos chamados seculares. Então, o perigo que pode correr a teologia é de se retrair num debate inacessível. A teologia quer fazer um discurso racional sobre Deus, não só para os crentes, mas para todos. Acredito que se a teologia pode ter futuro e sentido é no descobrimento de sua missão de ser uma reflexão voltada para o mundo, para as realidades do mundo. Aqui há muita potencialidade para que a teologia tenha uma função a partir de seus próprios recursos, com capacidade de crítica, dos processos culturais de ressacralização da economia, da política, além de uma capacidade para intervir criticamente nos processos sociais e culturais. Arrisco-me a afirmar que o futuro da teologia depende de que ela não se retraia e não evite o diálogo com o mundo.



Leia Mais...

>> José Antonio Zamora já concedeu outra entrevista à IHU On-Line.

* O império do instante e a memória. Publicada nas Notícias do Dia 01-11-2009

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