Edição 338 | 11 Agosto 2010

Apesar da desindustrialização, economia brasileira cresce

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Patrícia Fachin

IHU On-Line – O que a atual política econômica demonstra sobre a estratégia do governo para a economia nacional?

Júlio Gomes de Almeida - Acho que não deve ser uma política do governo. Processos de fusão e incorporação, inclusive de empresas do exterior, são positivos por dar porte à empresa brasileira, que é muito pequena no contexto internacional. Isso é bom porque as companhias passam a ter um faturamento maior, podem destinar uma parcela disso a operações de risco, como, por exemplo, investimentos na área de inovação, onde somos carentes. Ou seja, é uma perspectiva favorável, embora não deva ser uma política absoluta. A política industrial brasileira deve apoiar mais as iniciativas de empresas de menor porte, as iniciativas regionais, os sistemas produtivos locais, além de incentivar inovação e exportação de manufaturados. Se vierem empresas vencedoras, que venham; isso é ótimo para o país. Quando comento esse assunto, lembro da cadeia da área de produção de aviões no Brasil. Muitas vezes as pessoas se equivocam, acham que a empresa líder desse setor é maravilhosa, espantosamente produtiva e inovadora. De fato é, mas ao lado dela tem de ter uma cadeia de produção eficiente, a qual conta com empresas de médio e pequeno porte. Isso significa que ao ter uma grande empresa “na cabeça”, é possível formar uma cadeia de produção, onde tenham lugar empresas de menor porte.

IHU On-Line - O senhor afirma ainda que não há oposição entre economia industrial e economia de commodities. Como conciliar o investimento nos dois pólos?

Júlio Gomes de Almeida - Temos de olhar a exportação de commodities brasileira como um bem. Isso permite que o Brasil garanta exportação, saldo comercial, uma situação cambial mais tranquila e, portanto, tenha condições de financiar o processo de industrialização. Alguns economistas acham que, em função da exportação de commodities, o Real se valoriza muito e, com isso, a indústria perde competitividade. Que o Real está tendo uma tendência de valorização muito forte, isso é um fato; mas que tenha relação tão direta com a exportação de commodities, tenho dúvidas. Esse é um processo que nasce de outros fatores. À medida que o Brasil se notabiliza por ter uma condição maior de enfrentar adversidades como ocorreu durante a crise, o Real tende a se valorizar.
É possível assegurar o crescimento da indústria e exportar commodities. O Brasil perde uma oportunidade tendo uma grande capacidade de exportação na área de produtos primários, de fazer desse limão, digamos assim, uma limonada. Não são as commodities que fazem mal ao Brasil e, sim, nossa incapacidade de transformar isso em instrumento para a industrialização.

IHU On-Line - Quais os pontos positivos e negativos da internacionalização das empresas brasileiras?

Júlio Gomes de Almeida - Vejo as empresas brasileiras atuando no mercado internacional como uma grande contribuição ao nosso desenvolvimento. Quando elas migram para o exterior, precisam adotar padrões internacionais de qualidade, de preço, de respeito às leis de emprego. Essas medidas acabam também transbordando no Brasil.
O lado negro desse processo se dá por que, junto às empresas, migram para o exterior a nossa capacitação tecnológica. De qualquer modo, não vejo por que isso vá gerar redução da nossa capacidade interna. O processo inverso, ou seja, da vinda de grupos internacionais para o Brasil, pode aumentar com um processo maior de desenvolvimento. Mas isso já ocorre há tempo e, nós, sempre soubemos fazer com que isso ocorra sem a queda da nossa soberania. Algumas empresas vieram para o Brasil há tantos anos que estão muito ligadas à nossa tradição, então, chamá-las de empresas internacionais é um modo de dizer.

IHU On-Line – O Brasil privatizou parte de seus serviços públicos nos últimos anos. O apoio a empresas nacionais pode ser visto como uma maneira de corrigir essas iniciativas e “correr atrás do tempo perdido”?

Júlio Gomes de Almeida - Acho que sim. Muitos países usaram seus processos de privatização para criarem grandes grupos nacionais em vários setores. O Brasil não fez isso; poderia ter feito. Fazendo uma crítica ao nosso processo, diria que ele poderia ter tido uma orientação menos arrecadatória. Havia uma necessidade de fazer caixa com esses processos - era uma necessidade de fato -, mas eles poderiam ter tido uma característica de formar grupos brasileiros fortes e, até, com capacidade, a partir de um processo de privatização no país e no exterior. Espanha fez isso e a partir das privatizações criou grupos que hoje estão no Brasil, disputando segmentos importantes da economia brasileira. O Brasil poderia ter feito o mesmo. Bobeou.

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