Edição 373 | 12 Setembro 2011

Filosofia da Libertação e direitos humanos no pensamento de Ellacuría

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Márcia Junges | Tradução: Benno Dischinger



IHU On-Line - Ellacuría considerava que a realidade é que deve constituir o objeto fundamental da reflexão filosófica. A partir disso, qual é a importância do seu legado filosófico hoje, em tempos em que a injustiça social parece ter piorado?

José Mora Galiana - A importância do legado humanista (frente ao utilitarismo neoliberal ou tecnológico); do legado filosófico sobre o que, o porquê e o para que das atuações humanas; do legado político sobre a necessidade da ética na transformação social; e do legado teológico, como aposta da salvação e libertação histórica a partir das maiorias populares e a partir dos pobres de espírito, tem uma grande atualidade frente às tendências do pensamento único que querem consagrar e legitimar a concentração do capital, o poder e os bens em poucas mãos, excluindo a imensa maior parte da Humanidade, que deve passar a ser sujeito ativo de sua própria história.

IHU On-Line - E em termos eclesiais e sociológicos, que lições deixou ele a partir de sua trajetória?

José Mora Galiana - A lição que se extrai é a necessidade de apostar pelo paradigma da Comunidade Humana, sem exclusões. Pois é o conjunto, é a comunidade, e não poucos privilegiados, o que gera a plenitude e a maior riqueza de todas as nossas potencialidades. Trata-se, a longo prazo, mas também a curto e médio prazo, de ir revertendo a história, a partir das necessidades básicas e de realização da imensa maior parte dos seres humanos (praticamente os 80% da Humanidade).

IHU On-Line - Quais são as influências de Zubiri e Rahner em suas concepções teológicas?

José Mora Galiana - A principal influência de Rahner  é o sentido da historicidade que Ellacuría aplica aos conceitos teológicos (por exemplo, a “salvação” e o próprio conceito de “Deus”) e aos conceitos filosóficos, jusnaturalistas ou jurídicos (tais como a Justiça, a Verdade, o Bem Comum, a propriedade... ou a vida digna e a dignidade humana). Ellacuría partirá sempre da análise da realidade: da violação da vida, da não-propriedade de muitíssimos, do Mal Comum, da mentira e do encobrimento da verdade, e da injustiça estrutural para propor o princípio da esperança da transformação, o mais objetivamente possível, tendo em conta os condicionantes naturais, biológicos, psicológicos, pessoais, sociais e institucionais, econômicos, culturais, militares e políticos. E é aí onde a Filosofia tem uma função pedagógica e libertadora de transformação pessoal e comunitária.
A Influência principal de Zubiri está no modo de abordar a realidade, complexa e dinâmica, para ir à essência da realidade por meio da inteligência que necessariamente tem que pensar e optar por ser impressionada pela realidade histórica. Sua influência também está presente na maneira de entender a pessoa e a comunidade, em relação com a natureza, em relação com a própria realização (“personeidade”) e em relação com a abertura para o que nos transcende, a partir da re-ligação filosófica, que é metafísica.

IHU On-Line - Qual é o seu sentimento ao ministrar três atividades acadêmicas num espaço chamado Sala Ignácio Ellacuría e Companheiros, na Unisinos? O que essa simbologia evoca de suas recordações?

José Mora Galiana - Meu sentimento é de agradecimento. Muito concretamente, é obrigatória a referência à pessoa que tramitou minha presença aqui, o Prof. Dr. Castor Bartolomé Ruiz . Eu me considero discípulo de Ignacio Ellacuría e para mim é uma honra ser convidado ao XII Corredor das Ideias e à Universidade Unisinos para expor a Filosofia da Libertação de Ignacio Ellacuría e sua defesa dos Direitos Humanos, a partir da Universidade e a partir da Filosofia Política, porém desde a impressão da realidade mais necessitada.

IHU On-Line - Gostaria de acrescentar algum aspecto não questionado?

José Mora Galiana - Ignacio Ellacuría escrevia seus cursos e redigiu os cadernos de seu livro sobre a Filosofia da realidade histórica a máquina. Ele foi assassinado em 16-11-1989, com o conjunto de sua comunidade , no ano da queda do muro de Berlim. Salvaram-se Rodolfo Cardenal e Jon Sobrino. Hoje, contudo, ainda não se reverteram os dividendos da paz em saúde, educação, ciência e bem-estar social. Ainda segue vigente o paleolítico da economia da guerra e a tecnologia militar e paramilitar. Já é hora que, por meio da internet, por meio do pensamento crítico ativo, nos unamos todas as Universidades do Mundo para reverter a história, para humanizar mais e mais o sentido da vida, da convivência e da construção da cidade.

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