Edição 242 | 05 Novembro 2007

Aulas ao ar livre mostram realidade do Sinos

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IHU Online

Leonardo Stahnke é um dos três biólogos do Instituto Martim Pescador, que leva alunos e a comunidade da região a um passeio pelo Rio dos Sinos. Stahnke acompanha, todos os dias, a progressão do Sinos e diz que, nesse um ano após a mortandade, houveram poucas mudanças. Segundo ele, o trecho inferior do Rio é muito utilizado para atividades como banho e pesca. E destaca que os metais contidos no Sinos, “ao serem ingeridos por qualquer organismo da cadeia alimentar”, seja através da água ou dos peixes, “ ficam armazenados” no corpo. Isso, segundo ele, gera muitas doenças “como é o caso da verminose, da escabiose (sarna) e da esquistossomose”. Confira essas e outras declarações na entrevista concedida por e-mail, à IHU On-Line:

IHU On-Line - Ao realizarem os passeios de barco no Rio dos Sinos, com as aulas ao ar livre, que pontos positivos e negativos o senhor percebeu nesse um ano após a mortandade?
Leonardo Stahnke –
Durante a navegação, as pessoas se mostram mais sensíveis e atentas aos impactos ambientais causados pela ação humana. Elas estão percebendo que ainda há vida no Rio, apesar da tragédia ocorrida em outubro de 2006. No ano passado, neste mesmo período, estávamos passando por uma estiagem, fator que também contribuiu para o incidente. Neste ano, o quadro está diferente devido às chuvas que ocorreram na região. O ponto negativo é que, de lá para cá, nada mudou. O esgoto continua sendo lançado no Rio dos Sinos. Claro, temos ações como a formação do Consórcio Público de Saneamento Básico da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos, mas o Rio ainda não sentiu os efeitos desta união.
 
IHU On-Line – O senhor tem dados da quantidade de esgoto que é depositado na bacia hidrográfica do Sinos?
Leonardo Stahnke –
É impossível calcular a quantidade de esgoto que chega ao Rio, visto que somente 5% dele é tratado em toda a bacia. Mas, se considerarmos o número de vezes que cada habitante dos 32 municípios, que compõe a bacia, utiliza a rede de esgoto por dia, pode-se perceber que é um volume considerável de resíduos depositados no rio. Além disso, nem todas as residências estão ligadas à rede de esgoto, tendo, ainda, algumas que fazem uso das fossas negras, que são buracos no solo. Isso é grave, pois acaba por poluir os lençóis freáticos.
 
IHU On-Line - No final do ano passado, muitos peixes morreram no Rio dos Sinos. Qual a avaliação sanitária dos peixes que estão no rio, atualmente? Eles podem ser consumidos?
Leonardo Stahnke –
Mesmo antes da mortandade, que ocorreu no dia 7 de outubro de 2006, os peixes do Sinos não poderiam ser consumidos, levando-se em conta a grande quantidade de metais pesados presentes no rio. Estes metais, ao serem ingeridos por qualquer organismo da cadeia alimentar, ficam armazenados em seus corpos, não sendo eliminados, juntamente, com as fezes. Além disso, passam de um organismo para outro, pela ingestão, num processo chamado de magnificação trófica. Por exemplo, se uma planta aquática, que absorve metais pesados, serve de alimento para um pequeno peixe, os metais pesados dela serão passados para este. Se este for consumido por um peixe maior, estes metais passarão para o corpo deste, se uma garça comê-lo, se acumulará na garça, e assim por diante. Assim, o risco da população ribeirinha consumir um peixe com estes metais é o mesmo de uma garça ou outro animal, podendo também ser contaminada.
 
IHU On-Line – Além da contaminação pela ingestão dos peixes, a poluição do Rio gera outros impactos para as comunidades vizinhas? Em que estado se encontram as populações ribeirinhas, atualmente?
Leonardo Stahnke –
Existem várias doenças causadas pela ingestão, contato ou vetores que se desenvolvem na água contaminada, como é o caso da verminose, da escabiose (sarna) e  da esquistossomose, respectivamente. No trecho inferior do Rio, visualizamos uma população que se utiliza deste para o lazer (banho) e a pesca, ficando com sua saúde comprometida. O aterramento dos banhados e a remoção da mata ciliar são práticas ainda comuns na região e que acabam prejudicando os ribeirinhos em períodos de cheia.

IHU On-Line - Que ações o Instituto Martim Pescador vem desenvolvendo para incentivar a conscientização ambiental na população do Vale do Sinos?
Leonardo Stahnke –
As navegações ecológicas, trilhas, plantios de espécies nativas na mata ciliar, atividades lúdicas nas escolas, exposições fotográficas e palestras em empresas são algumas ações atualmente realizadas.

IHU On-Line - Como o senhor tem percebido a participação de órgãos regularizadores do meio ambiente no local? São desenvolvidas pesquisas e ações de prevenção no Rio dos Sinos?
Leonardo Stahnke –
Os órgãos reguladores vêm acompanhando a depredação da qualidade do Rio há anos. A Fepam tem pontos de análise ao longo do rio, mas estes dados são pouco divulgados para a população. Além disso, há muitas pesquisas realizadas nas próprias universidades, mas com dados incompletos, muitas vezes, por falta de recursos para pesquisa, sem sistemáticas de acompanhamentos ou socialização dos resultados. Muitos destes pesquisadores preocupam-se em divulgar estes dados primeiro em revistas técnicas que, muitas vezes, levam muito tempo para serem publicadas e esquecem de informar o morador local, leigo, sobre a real situação do rio ou arroio.

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